Saturday 28 August 2010

CLIENTES DA BANCA ADIAM AMORTIZAÇÃO DOS EMPRÉSTIMOS

Crédito à habitação

Em Julho, o valor da amortização começou a cair e a tranche dos juros a aumentar

As pessoas continuam a ir ao banco para comprar casa. Os clientes dos bancos estão a revelar sinais de menor capacidade para amortizar o empréstimo da casa mas, ao mesmo tempo, estão a canalizar mais dinheiro para pagarem os juros da dívida. O aperto crescente no rendimento disponível e o novo ciclo de subida de taxas, que já é visível, são as principais razões que explicam o fenómeno que está a fazer com que as prestações totais subam, ainda que o capital amortizado a cada mês seja cada vez menor.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística, que apresenta dados até Julho último, cada cliente deve em média 60 621 euros ao banco. Todos os meses as pessoas têm de pagar uma prestação que ronda agora os 263 euros: esta parcela inclui a amortização - o dinheiro que o cliente abate ao empréstimo para reduzir os juros e a dependência face ao banco - e os juros - que remuneram o banco pelo dinheiro que emprestou. Este valor (263 euros) é relativamente baixo, pois tem em conta todos os créditos concedidos e os mais antigos têm uma prestação mais baixa pois beneficiaram de mais amortizações ao longo da sua vigência. Se às operações para compra de casa se juntarem os créditos para compra de terrenos ou construção de casas, a prestação média fica em 251 euros, mas também esta já está a subir à conta dos juros.

As prestações totais médias estão a ser puxadas pela importância crescente dos juros, que mais do que compensa a menor capacidade de amortização das famílias. Isto significa por um lado que o efeito da subida das taxas de juro já está a ser passado para os clientes. Por outro, começa a ser notório um aperto cada vez maior no rendimento disponível das famílias, reflexo de um mercado de trabalho com desemprego alto e de medidas de austeridade do governo para combater o défice.

João Cantiga Esteves, professor do ISEG e consultor financeiro, lembra que "a situação do mercado de crédito é hoje muito peculiar". "Apesar das taxas de juro extremamente baixas do BCE, a verdade é que os bancos continuam a não conseguir financiar-se no mercado interbancário como no passado."

"O crédito é de facto um mercado muito mais difícil hoje", observa. "O dinheiro que conseguem está a servir para reestruturar os balanços e só depois para financiar a economia." Por isso, o professor confirma que "já estamos num processo de subida dos juros sem haver subidas por parte do BCE, isto é, os spreads, que no fundo são os prémios de risco, estão a subir e muito". O economista junta ainda que o ambiente de estagnação, o desemprego alto e o endividamento acumulado ao longo de décadas "ajudam bastante à compressão do rendimento disponível, não havendo por isso grande margem para poupar", fazendo "aumentar ainda mais a exposição das pessoas a esta subida dos juros no crédito".

Filipe Garcia, economista da consultora IMF, frisou que a subida dos juros já está acontecer, embora acredite que seja moderada. Ainda assim, o ambiente mais restritivo no crédito, combinado com as medidas de austeridade - subida do IVA, aumento da taxa de retenção na fonte em sede de IRS, mais inflação e salários estabilizados -, "acabam por retirar poder de compra às famílias e ter um impacto maior".

No segmento da compra de habitação, cada devedor conseguiu amortizar 170,9 euros. O valor remanescente (92 euros) diz respeito a juros. Em Julho, o valor da amortização começou a cair e os juros começaram a aumentar. Nos novos contratos a quebra no valor amortizado é ainda maior e a sensibilidade face aos juros também. Nos empréstimos contratados nos últimos 12 meses, a prestação média total está a subir há dois meses (ficou em 294 euros em Julho), sendo que o capital amortizado desceu para 140 euros. A parcela relativa a juros aumentou para 154 euros, o valor mais alto desde Novembro de 2009.

Os bancos estão aproveitar a maior procura na habitação e o facto de continuarem a beneficiar do regime de financiamento vantajoso concedido pelo BCE para reforçarem ganhos. As taxas de juro efectivas dos novos créditos (TAEG) estão a subir desde o início do ano, segundo o Banco de Portugal. A tendência é continuar.

I ONLINE

por Luís Reis Ribeiro, Publicado em 28 de Agosto de 2010

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