Duarte Guerra Pinto era economista e tornou-se padre
Tinham carreiras perfeitas e, de um dia para o outro, resolveram tornar-se padres
Eles tinham tudo. Carreiras de sucesso, um futuro promissor. Um dia, quiseram mudar. A culpa não foi de nenhum desgosto de amor nem do desejo de conseguir um emprego para a vida. Garantem que foi, unicamente, "a vontade de Deus". Um professor de Físico-Química e um economista deixaram tudo e fizeram-se padres. Uma experiência religiosa - num mosteiro na Galiza e numa caminhada a Santiago de Compostela - mudou- -lhes a vida.
Carlos Silva licenciou-se em Química Aplicada em 1996. Depois de terminar o curso, aos 23 anos, facilmente conseguiu colocação. Deu aulas durante quatro anos, em quatro escolas da Grande Lisboa. Gostava de ensinar e nunca teve dificuldade "em ficar colocado perto de casa". Era um professor feliz. "Feliz e um pouco resmungão com um certo facilitismo do sistema de ensino", assente nas palavras de ordem '"passar, passar, passar", recorda. Por esses dias, sentia que tinha tudo - "paz na família", emprego e sonhos "com uma vida independente, talvez no Alentejo, dividida entre o ensino e a proximidade com a natureza". Só lhe faltava a namorada que, não sabe explicar porquê, nunca chegou. "Acho que nunca me envolvi emocionalmente", diz.
Até que um dia, no Verão de 1999, já com 27 anos, foi passar três dias a um mosteiro galego. Uma viagem "descontraída" que acabaria por lhe trocar as voltas. "Vi 30 homens que estavam entregues a Deus e cuja ocupação era rezar. Deram-me coragem para aceitar o desafio." A vontade depressa se transformou em decisão. E não era nova: lembra-se de um dia, em criança, dizer que queria ser padre. Um ano depois, já estava no Seminário de Caparide. "Foram sete anos de descoberta diária do discreto olhar de Deus", conta. Em Dezembro de 2006, quando o bispo lhe perguntou - "Prometes-me a mim e aos meus sucessores reverência e obediência?" - na celebração da ordenação de diácono, não teve dúvidas e rompeu com o passado. Mas tudo parecia difícil: "Ter de contar a decisão a tanta gente, ter de deixar o ensino, ter de voltar a estudar, apesar de ter gostado tanto do curso de Química." E a terrível dúvida: "E se depois o caminho não for por aqui?" As dúvidas estavam lá, porém: "Quis ver o que Deus queria de mim." Hoje, passa os dias recolhido no Seminário de Penafirme, no concelho de Torres Vedras. É prefeito, uma espécie de formador dos jovens seminaristas. E não tem dúvidas: "A mudança drástica assusta mais a quem não a faz." Perguntamos-lhe o que é ser padre. "Ser padre [pausa], ser padre é ser feliz."
Da Banca para o Seminário Duarte Guerra Pinto foi economista. Licenciou-se em Economia na Universidade Lusíada em 1996. Estagiou numa corretora independente do mercado de capitais. Foi aceite e ficou durante dois anos e meio. Depois tornou-se analista financeiro, lançou um novo projecto de gestão de activos para clientes particulares e saltou para a banca de investimento do Banco Espírito Santo. Acabou por não conseguir entrar no quadro da empresa - foi aí que considerou o seminário como opção de vida e trocou o fato e a gravata pelo sacerdócio. Mas hoje, quase dez anos depois, recusa dizer que escolheu ser padre. "Não tomei a decisão de ser padre, mas de ir para o seminário", esclarece. A decisão "foi um processo e não propriamente um momento".
Tinha 27 anos quando fez uma caminhada a Santiago de Compostela com um grupo de amigos. O que experimentou - "a vida de Deus e do Seu amor através de Maria no meu meu coração empedernido e calculista" - já o tinha sentido antes, em 1998, quando participou numa peregrinação a pé entre Estoril e Fátima. "Descobri-me a mim mesmo, aos outros e ao mundo."
A resposta final teve-a no México, quando um padre, no final de uma missão de evangelização que durou um mês, lhe disse que deveria seguir o sacerdócio. O que se seguiu, recorda, foi "um ano de discernimento intensivo". Para trás, deixou tudo - sobretudo as namoradas. Confessa que até começou a namorar "muito cedo". O primeiro namoro foi o que durou mais tempo, da 1.a à 4.a classe.
Hoje, é padre há dois anos, em Benfica. "De que sinto mais falta? De encontrar uma regra e disciplina. Ainda estou à procura." O chamamento só chegou aos 30 anos. "Ainda fui a tempo", garante.
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Religião
por Rosa Ramos, Publicado em 27 de Outubro de 2009
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