Cândida Almeida não deu grande atenção ao processo até Julho de 2008
PJ não parou investigação do Freeport desde 2005 e só foi acompanhada pelo Ministério Público do Montijo
04.08.2010 - 12:31 Por José António Cerejo PÚBLICO
O inquérito do caso Freeport "estava completamente parado" quando o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) tomou conta dele, no Verão de 2008. Foi isso que o procurador-geral da República, Pinto Monteiro, disse ao PÚBLICO, em Janeiro de 2009, e é isso que, até agora, tem sido dado como certo. Mas não é: o processo nunca esteve na gaveta. Certo é que a directora do DCIAP, Cândida Almeida, nunca lhe deu particular atenção até Julho de 2008, a não ser no início.
Formalmente iniciada em Fevereiro de 2005, a investigação suscitou o interesse da directora do DCIAP logo a 11 desse mês, no dia em que foi noticiada a realização das primeiras buscas. Através de ofício dirigido ao representante do Ministério Público (MP) no Tribunal do Montijo, o procurador Joaquim Aires, a cargo de quem estava o inquérito, quis saber se a sua abertura tinha sido comunicada ao DCIAP, tal como determinam as instruções da Procuradoria-Geral da República para certos casos. Em resposta, foi-lhe dito que, até aí, os factos se circunscreviam a uma comarca, pelo que o DCIAP não fora informado. E é nessa altura que o processo, então já com dois volumes e cinco apensos, chega pela primeira vez às mãos de Cândida Almeida.
Devolvido ao MP do Montijo e à Polícia Judiciária (PJ) de Setúbal em 21 de Fevereiro, o inquérito seguiu o seu caminho com a realização de numerosas diligências, voltando a directora do DCIAP a pedir o processo, para consulta, em 26 de Julho. Nove dias depois, os autos foram novamente devolvidos. Em resultado dessas duas consultas efectuadas nos primeiros cinco meses de vida do caso, Cândida Almeida não proferiu qualquer despacho nem forneceu qualquer orientação, pelo menos escrita.
Ainda em 2005, a 16 de Novembro, Cândida Almeida pediu pela terceira vez o processo, nessa altura já com cinco volumes e 83 apensos, devolvendo-o pouco depois, com um ofício onde afirma que foi verificada "a inexistência de relatórios analíticos", nomeadamente em relação aos apensos. "Desta forma torna-se inviável para já proceder à avaliação dos autos tendo em vista aquilatar da natureza transdistrital dos mesmos, pelo que solicito que logo que disponibilizados pela PJ nos sejam enviados para análise." O facto de a investigação abranger várias comarcas e distritos é uma das circunstâncias, para lá da complexidade e da natureza dos crimes em causa, que determinam a sua avocação pelo DCIAP.
Logo no início de Janeiro de 2006, a inspectora Carla Gomes - que integrava a equipa de investigação dirigida pela coordenadora Maria Alice Fernandes e composta por ela e mais dois inspectores, além de uma especialista auxiliar - informou o MP do Montijo de que os relatórios não tinham sido feitos porque ainda estava em curso a análise de documentação bancária e a tradução de muitos documentos. No final desse ano, durante o qual as diligências sofreram algum abrandamento, embora não se possa falar em paragem, a directora do DCIAP insistiu, num ofício de 14 de Novembro, no envio dos relatórios intercalares e pediu informação sobre a evolução do inquérito. Para esclarecer estas questões, a procuradora em funções no Montijo, Helena Gonçalves, reuniu-se com Cândida Almeida a 22 de Dezembro, mas nos autos não há referência a qualquer orientação que tenha sido aí dada.
Nos 18 meses seguintes, até Junho de 2008, não há sinal algum de que a directora do DCIAP tenha tido contacto com o inquérito, mas percebe-se que ele prosseguiu normalmente. A equipa da PJ continuou a trabalhar, apesar de, ao longo de 2007, a inspectora Carla Gomes ter estado 43 dias de baixa, por doença, e o MP do Montijo manteve o seu acompanhamento, ainda que limitado ao despacho das diligências para as quais a lei exige a sua intervenção, mas sem assumir de facto a direcção da investigação. A sua intervenção foi, aliás, fortemente condicionada pela ausência de especialização dos seus titulares na área da criminalidade económica, pela sua dispersão no trabalho do tribunal local e pelo facto de, entre 2005 e 2008, terem passado pelo Montijo pelo menos três procuradores.
PJ não parou investigação do Freeport desde 2005 e só foi acompanhada pelo Ministério Público do Montijo
04.08.2010 - 12:31 Por José António Cerejo PÚBLICO
O inquérito do caso Freeport "estava completamente parado" quando o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) tomou conta dele, no Verão de 2008. Foi isso que o procurador-geral da República, Pinto Monteiro, disse ao PÚBLICO, em Janeiro de 2009, e é isso que, até agora, tem sido dado como certo. Mas não é: o processo nunca esteve na gaveta. Certo é que a directora do DCIAP, Cândida Almeida, nunca lhe deu particular atenção até Julho de 2008, a não ser no início.
Formalmente iniciada em Fevereiro de 2005, a investigação suscitou o interesse da directora do DCIAP logo a 11 desse mês, no dia em que foi noticiada a realização das primeiras buscas. Através de ofício dirigido ao representante do Ministério Público (MP) no Tribunal do Montijo, o procurador Joaquim Aires, a cargo de quem estava o inquérito, quis saber se a sua abertura tinha sido comunicada ao DCIAP, tal como determinam as instruções da Procuradoria-Geral da República para certos casos. Em resposta, foi-lhe dito que, até aí, os factos se circunscreviam a uma comarca, pelo que o DCIAP não fora informado. E é nessa altura que o processo, então já com dois volumes e cinco apensos, chega pela primeira vez às mãos de Cândida Almeida.
Devolvido ao MP do Montijo e à Polícia Judiciária (PJ) de Setúbal em 21 de Fevereiro, o inquérito seguiu o seu caminho com a realização de numerosas diligências, voltando a directora do DCIAP a pedir o processo, para consulta, em 26 de Julho. Nove dias depois, os autos foram novamente devolvidos. Em resultado dessas duas consultas efectuadas nos primeiros cinco meses de vida do caso, Cândida Almeida não proferiu qualquer despacho nem forneceu qualquer orientação, pelo menos escrita.
Ainda em 2005, a 16 de Novembro, Cândida Almeida pediu pela terceira vez o processo, nessa altura já com cinco volumes e 83 apensos, devolvendo-o pouco depois, com um ofício onde afirma que foi verificada "a inexistência de relatórios analíticos", nomeadamente em relação aos apensos. "Desta forma torna-se inviável para já proceder à avaliação dos autos tendo em vista aquilatar da natureza transdistrital dos mesmos, pelo que solicito que logo que disponibilizados pela PJ nos sejam enviados para análise." O facto de a investigação abranger várias comarcas e distritos é uma das circunstâncias, para lá da complexidade e da natureza dos crimes em causa, que determinam a sua avocação pelo DCIAP.
Logo no início de Janeiro de 2006, a inspectora Carla Gomes - que integrava a equipa de investigação dirigida pela coordenadora Maria Alice Fernandes e composta por ela e mais dois inspectores, além de uma especialista auxiliar - informou o MP do Montijo de que os relatórios não tinham sido feitos porque ainda estava em curso a análise de documentação bancária e a tradução de muitos documentos. No final desse ano, durante o qual as diligências sofreram algum abrandamento, embora não se possa falar em paragem, a directora do DCIAP insistiu, num ofício de 14 de Novembro, no envio dos relatórios intercalares e pediu informação sobre a evolução do inquérito. Para esclarecer estas questões, a procuradora em funções no Montijo, Helena Gonçalves, reuniu-se com Cândida Almeida a 22 de Dezembro, mas nos autos não há referência a qualquer orientação que tenha sido aí dada.
Nos 18 meses seguintes, até Junho de 2008, não há sinal algum de que a directora do DCIAP tenha tido contacto com o inquérito, mas percebe-se que ele prosseguiu normalmente. A equipa da PJ continuou a trabalhar, apesar de, ao longo de 2007, a inspectora Carla Gomes ter estado 43 dias de baixa, por doença, e o MP do Montijo manteve o seu acompanhamento, ainda que limitado ao despacho das diligências para as quais a lei exige a sua intervenção, mas sem assumir de facto a direcção da investigação. A sua intervenção foi, aliás, fortemente condicionada pela ausência de especialização dos seus titulares na área da criminalidade económica, pela sua dispersão no trabalho do tribunal local e pelo facto de, entre 2005 e 2008, terem passado pelo Montijo pelo menos três procuradores.