Tuesday 18 June 2013

ASCENSÃO E QUEDA DO REI DOS CORRETORES

 
CASO PEDRO CALDEIRA
 
Escândalos da democracia: "Se Deus quiser, hei-de voltar à bolsa"
 
por Rosa Ramos, Publicado em 06 de Agosto de 2009   
Pedro Caldeira recebia dinheiro de particulares e prometia juros elevados

Havia dois Pedro Caldeira. Um era presidente e accionista maioritário da sociedade corretora com o seu nome. Afável, que transparecia uma imagem de seriedade e competência. Tanto que a sociedade estava de boa saúde financeira. O outro Pedro Caldeira passeava-se por Cascais, pedia dinheiro aos amigos e prometia, em troca, juros elevados. Era um homem com uma capacidade inigualável de vendedor. Durante quatro anos, recebeu depósitos de particulares - entre os quais Lili Caneças e Carlos Cruz - que remunerava a taxas de 4 e 5%. Nos últimos tempos, chegou a pagar 9 e 10%. As propostas de remuneração eram tão aliciantes que muitos hipotecaram a própria casa para pagar ao corretor. 

O desespero de Caldeira atingiu o seu clímax quando o BCP, o seu banco particular, lhe cortou o crédito e recusou qualquer ajuda, porque as suas contas já tinham atingido, várias vezes, saldos negativos elevados. Estávamos em 1992. Por esses dias, Pedro Caldeira dava a sua última entrevista antes de o escândalo financeiro rebentar, em que se definia como "optimista, religioso, ciumento e zeloso da família". 

Em 1988, foi suspenso da actividade de corretor pelo então ministro das Finanças Miguel Cadilhe, por alegadas irregularidades. Quando voltou ao trabalho, no início de 1989, foi ao Santuário de Fátima agradecer. Mas de pouco valeu.

Às 11h30 da manhã de 23 de Julho de 1992, Pedro Caldeira telefona a Nandin de Carvalho, presidente da Assembleia Geral da sua corretora e seu advogado particular. Estava "preocupadíssimo", porque deveria ter liquidado, no dia anterior, uma dívida de 203 mil contos (cerca de um milhão de euros) ao Fundo de Tesouraria Atlântica. O sonho tinha-se transformado em pesadelo e era preciso arranjar uma solução. Depois de conversarem, Caldeira disse que estava cansado, precisava de ir para casa. Às seis da tarde do dia seguinte, Nandin de Carvalho fica a saber que Pedro Caldeira estava desaparecido e o facto é comunicado à Polícia Judiciária. O corretor não conseguiu aguentar a pressão dos credores e fugiu. Tinha 2,5 milhões de contos (12,5 milhões de euros) em dívida e recebera várias ameaças de morte. Foi o fim de uma história de milhões, amizades, ilegalidades e ganância. 

A fuga A última vez que Caldeira tinha sido visto em público foi num concerto dos Genesis, pouco tempo antes, no Estádio de Alvalade. Quando o seu funcionário José Maria Ribeiro, na altura com 26 anos, mas já um dealer prestigiado da praça lisboeta, chegou à sociedade corretora, depois da sua lua-de-mel, nem queria acreditar. Estava sem emprego (o escritório da sociedade foi encerrado) e as economias que tinha reunido para pagar um MBA nos Estados Unidos tinham desaparecido. Pedro Caldeira e a mulher, espanhola, tinham há muito marcado o início das suas férias no Algarve precisamente para esse dia, 24 de Julho. Seguiriam depois para Marbella. As malas estavam feitas, mas os planos mudaram de repente. 

Enquanto o escândalo explodia em Lisboa, Caldeira, acompanhado da mulher e dos filhos, viajou para o aeroporto de Barajas, em Madrid, num BMW conduzido pelo seu motorista pessoal. Daí, embarcou para os Estados Unidos. Acabou por ser detido pelo FBI em Abril de 1993, no Hotel Marriot, em Atlanta.

Em Abril de 2005 foi absolvido de todas as acusações. O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou uma primeira decisão de 2000 e ilibou-o de 17 crimes de abuso de confiança e 65 de burla agravada, além do uso indevido de 2,5 milhões de contos. O corretor só foi condenado ao pagamento de pedidos cíveis. 

À saída da leitura da sentença, Pedro Caldeira disse apenas aos jornalistas: "Se Deus quiser, hei-de regressar à bolsa." Actualmente, está a escrever um livro para novos investidores.
 

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