I ONLINE - 31-07-2010
Não era preciso ouvir Sócrates, escreve Cândida Almeida no despacho final.
Cândida Almeida diz que a eventual inquirição do primeiro-ministro, José Sócrates, não alteraria o resultado final da investigação ao caso Freeport.
Cândida Almeida diz que a eventual inquirição do primeiro-ministro, José Sócrates, não alteraria o resultado final da investigação ao caso Freeport.
José Maria Martins, advogado de quatro dos cinco assistentes do processo Freeport, vai a partir da próxima semana "analisar em pormenor o processo": "Seguramente iremos requerer a instrução e fazer uma acusação diferente", afirmou ontem ao i.
"Pela análise que fiz, parece-me que a acusação terá de ser diferente. Podemos acusar qualquer uma das pessoas desde que entendamos que há matéria de facto e direito para isso", diz o advogado, que tem nas mãos uma bomba política.
Apesar de o processo ter terminado sem que José Sócrates tenha sequer sido ouvido pela investigação - sob a alegação de "falta de tempo" -, facto é que o calvário Freeport pode não ter acabado com o despacho do Ministério Público. Agora entram em campo os assistentes do processo, que têm o poder de "deduzir acusação independente da do Ministério Público", conforme o art. 69.o do Código Processual Penal.
A "acusação independente" que o advogado dos assistentes se prepara para fazer irá depois à análise do juiz de instrução que decide se procede ou não à constituição de arguidos.
Depois do despacho incendiário dos procuradores Vítor Magalhães e Paes Faria - que declararam não ter ouvido Sócrates por "falta de tempo" - Cândida Almeida, a directora do DCIAP, veio argumentar que a audição ao primeiro-ministro não alteraria o resultado final da investigação. No despacho final do processo, divulgado ontem à tarde pela Lusa, a directora do DCIAP reconhece o "interesse na inquirição" do primeiro-ministro, mas considera que das "respostas eventualmente obtidas não resultariam alterações de fundo aos juízos indiciários, próprios desta fase, que subjazem ao despacho de arquivamento e de acusação deduzidos".
No entanto, Cândida Almeida admite a reabertura do processo se chegarem os resultados de diligências ainda sem resposta e se estes determinarem mudanças na acusação. Segundo o despacho da directora-geral do DCIAP, "foi levada a cabo uma cuidada e profunda análise da prova produzida e de diligências encetadas ainda sem resposta, por dependerem da cooperação internacional em matéria penal. Uma vez recebidas e caso determinem a alteração da decisão ora tomada, reabrir-se-ão os autos". De manhã, em declarações à Lusa, o procurador- -geral da República tinha afastado qualquer hipótese de imediata reabertura do processo: "Neste momento não se vê interesse em reabrir a investigação." Na resposta à Lusa, o PGR voltou a insistir que a data para conclusão do processo - 25 de Julho - tinha sido proposta por Cândida Almeida e "aceite pelo vice-procurador-geral da República a 4 de Junho". Pinto Monteiro repete que os procuradores Vítor Magalhães e Paes Faria "não requereram a prorrogação porque não quiseram"."Os investigadores dispuseram quase de seis anos para ouvir o primeiro-ministro e os procuradores titulares um ano e nove meses. Se não o ouviram, é porque entenderam não ser necessário", resume Pinto Monteiro, que anunciou a abertura de um inquérito "para o integral esclarecimento de todas as questões de índole processual ou deontológica" que o processo possa sugerir e ainda apurar "eventuais anomalias registadas na concretização de actos processuais".
Entre os elementos que os procuradores pediram e ficaram sem resposta, estão cartas rogatórias dirigidas às justiças das ilhas Caimão e ilha de Man, com o objectivo de obter informações sobre a identidade de titulares e procuradores de contas bancárias, "bem como dos extractos bancários". São estas diligências que ficaram por concluir que podem trazer pistas para a eventual reabertura do processo por parte do Ministério Público, na opinião da directora do DCIAP.
Nas perguntas que os procuradores do Ministério Público entendiam dever fazer a Sócrates, estavam informações recolhidas nos depoimentos do tio do primeiro-ministro, Júlio Carvalho Monteiro, e do primo, Hugo Monteiro. O tio admitiu à justiça - conforme escrevem os procuradores no despacho - que recebeu "um contacto de Charles Smith a referir que um gabinete de advogados pedia quatro milhões e, na sequência, telefonou ao sobrinho que se disponibilizou para receber imediatamente Charles Smith no seu ministério".
O primo Hugo Monteiro admitiu aos investigadores que "o encontro do pai Júlio com o primo Sócrates teve influência no licenciamento" e informou que ele próprio se deslocou a casa de José Sócrates "e lhe disse que ia invocar o seu nome, a que [Sócrates] terá acedido". Além das outras 25 perguntas, Paes Faria e Vítor Magalhães queriam ter "explicações" de Sócrates para os testemunhos do tio e do primo no processo. Mas, como disse ontem, a directora do DCIAP não considerou que a audição ao primeiro- -ministro fosse relevante.
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