HARDMUSICA 31-07-2010
António Coelho
Alina Vaz mora em Lisboa, vai muito às estreias e gosta de fado. Já apresentou espectáculos de fados como o evocativo dos 150 anos da morte de Maria Severa. Na comédia teve êxitos como "A gravata" ainda no Monumental, e talvez a última peça com Ribeirinho, mas continuou interessada "noutro tipo de teatro". É inesquecível o "Auto da Índia" no Ibérico ou "Orquídeas à luz da lua", ou a extraordinária "velha" que desempenhou em "Divinas palavras". No cinema participou em "As púpilas do senhor reitor", entre outros filmes, designadamente a provocante "Maluquinha de Arroios" com Artur Semedo, sob a direcção de Henrique Campos.
Hardmusica: A Alina está a completar 50 anos carreira, estreou-se profissionalmente com “Os comediantes”, no Nacional ao que recordação compartilharia connosco desta vida?
ALINA VAZ: Diz bem, desta vida, que poucas pessoas compreendem: As recordações são dos actores maravilhosos com quem trabalhei: Ribeirinho, Assis Pacheco, Amélia Rey-Colaço, Laura Alves, Raul Solnado, António Silva, Fernando Gusmão, Paulo Renato, a brasileira Eva Tudor com quem fiz três peças (e que ainda hoje aparece na telenovela da SIC) e muitos mais que, sem darem por isso me ensinaram muito, e na maioria foram grandes amigos.
H: Recentemente, fez (e muito bem) um teatro muito intimista, as “Love Letters”, o que a fez mudar e aceitar este convite para fazer comédia?
ALINA VAZ: As “Love Letters” foram um marco na minha vida, deram-me a certeza, do que sei, mesmo em registos diferentes, porque ao fazer tanta comédia, apesar de não ser cómica, deixaram de pensar em mim como actriz capaz de fazer outras coisas, só que eu em 1968 larguei o Vasco Morgado (a quem devo muito) e fui para o TEP [Teatro Experimental do Porto] com metade do ordenado que tinha com o Vasco, pois queria fazer outro tipo de teatro, no entanto devo dizer que fazer comédia não é nada fácil; e o Lawrence Olivier diz nas suas memórias que quem nunca fez comédia nunca será um actor completo, ao fazer as “Love Letters” eu sabia que era capaz, os ensaios com o Alberto Villar e o Celso [Cleto] foram um prazer enorme, pura magia e uma sensação de fazer bem, sensação essa que só dá aos actores que procuram continuamente o limite. Se o atingimos não sei, mas trabalhámos para isso.
Estive dois anos parada, o que na minha idade pode ser fatal em termos físicos e mentais, quando me convidaram para esta peça fiquei admirada, depois li o papel e achei que podia fazer, a peça é bem construída teatralmente, porque é o que nós chamamos uma peça de situações, são situações essas, que têm graça, cabe aos actores depois fazerem o melhor que podem, mesmo não sendo cómicos, mas a razão principal de ter aceitado este convite foi para me testar a mim própria o que fiz toda a vida.
H: Não será uma mulher de nostalgias, mas guarda bons momentos das contracenas com Raul Solnado e Laura Alves, por exemplo?...
ALINA VAZ: Bom quando estou sozinha a escrever ou ler ou a tratar das minhas gatas, penso muitas vezes; afinal o que fiz da minha vida? Chego sempre à conclusão de que a vida nos acontece simplesmente, e às vezes quase sem darmos por isso. Sou uma mulher de nostalgias como todo o ser humano e algumas bem difíceis, mas também sei que tenho de continuar e por isso falo pouco nesses assuntos, são tão meus tão íntimos, que acho não dever partilhar com quase ninguém, no entanto estou agora a partilhar consigo. Não sei, mas ainda lhe digo que também tive momentos muito belos na minha vida e na profissão, esses recordo muitas vezes quando estou só. Pode não acreditar, mas tenho um sentido de humor muito grande.
Sim guardo grandes recordações e boas desses dois maravilhosos actores. A Laura tinha uma técnica espantosa, e fazia do publico o que queria, quanto ao Raul dou-me com ele, e às vezes ainda lhe peço opiniões, é preciso não esquecer que foi vedetíssima, que teve o atrevimento de fazer os monólogos da guerra, e que fez um teatro com o dinheiro dele, de vez em quando jantamos e espantosamente apesar de termos feito três peças juntos nunca falamos de teatro.
H: “As Calcinhas Amarela”, segundo a companhia vai continuar depois do Verão, vai até à Madeira. Para um actriz habituada a alta comédia, que trabalhou com o Carlos Avillez, Xose Blanco Gil, Maria Helena Matos, Henriques Santana, e outros encenadores, o que no seu entender tem contribuído para o êxito deste peça, com mais de 30 anos?
ALINA VAZ: Em teatro nunca sabemos porque se tem êxito popular, às vezes até o nome da peça influencia, mas já disse que esta peça é bem construída pois de dez em dez minutos acontece uma coisa diferente o que é uma surpresa para o publico, julgo que é uma das razões do êxito. O nome do Tozé Martinho também, e o facto de há anos ele ir para a província sempre com comédias, tudo junto faz acontecer o êxito.
H: Há um projecto seu de enorme valia e pouco “badalado” como se diz hoje, as Viagens ao Interior do Teatro, considera-o fundamental na formação de públicos?
ALINA VAZ: As Viagens ao Interior do Teatro, são tão populares que já todos nos copiaram o nome, o que demonstra uma certa falta de ética, mas não vale a pena lutar contra os inúmeros grupos que o copiam.
Fazemos este ano 22 anos sempre com um espectáculo apenas por semana, o elenco está junto há anos, e sentimos que gostamos do que estamos a fazer. Abordamos o trabalho que se faz antes de levantar o pano e explicamos que é um trabalho que tem de se fazer como noutra profissão qualquer.
Os alunos vão ao palco e durante a primeira parte podem perguntar o que querem, é tudo simples e directo, falamos com eles e julgo que o êxito vem daí. É a jóia da nossa coroa, minha e do Alberto Villar, sim considero este projecto fundamental, porque damos respostas e talvez ajudemos os alunos a perceberem melhor que têm mesmo de trabalhar para fazerem o que querem mais tarde na vida.
H: Este ano a Sociedade Portuguesa de Autores distinguiu-a com a Medalha de Honra. O que representou para si?
ALINA VAZ: Uma enorme surpresa, enorme, julgo que me foi atribuída pelo grande trabalho que fiz durante anos para a RDP na adaptação de textos de autores portugueses, às vezes pensava, um dia vão-nos dar uma medalha pelo enorme trabalho feito com os alunos das escolas, afinal foi ao divulgar autores portugueses na rádio que acabei por ter uma medalha, não esperava, mas senti surpresa da parte de muitos colegas… passe a vaidade tenho mais algumas que nunca divulguei.
H: Tem andado ausente das televisões, a que se deve? Comenta-se a sua
rebeldia em não fazer “castings”, confirma?
ALINA VAZ: Sim sou rebelde a fazer “castings”, não por me considerar melhor, não, mas porque são feitos sem qualquer respeito pelos actores que têm uma carreira, mas mesmo sem grande carreira, actores já com uma certa idade são metidos no molhe, dizem-me que na América também é assim… será … Mas são feitos em condições, não com um menino de câmara na mão a dizer cheio de pressa, vá lá diga isto, está feito, boa tarde, o meu feitio apesar de ser reconhecido como bom, em certas ocasiões fica mau não pactua, e pura e simplesmente não faço, isto é uma profissão difícil temos que ter respeito por nós próprios e fazer com que os outros tenham também respeito por nós e por esta profissão tão bela. Quanto à televisão fiz muita mas agora não me chamam não sei porquê, talvez por não pedir e não telefonar, não sei.
ALINA VAZ: Diz bem, desta vida, que poucas pessoas compreendem: As recordações são dos actores maravilhosos com quem trabalhei: Ribeirinho, Assis Pacheco, Amélia Rey-Colaço, Laura Alves, Raul Solnado, António Silva, Fernando Gusmão, Paulo Renato, a brasileira Eva Tudor com quem fiz três peças (e que ainda hoje aparece na telenovela da SIC) e muitos mais que, sem darem por isso me ensinaram muito, e na maioria foram grandes amigos.
H: Recentemente, fez (e muito bem) um teatro muito intimista, as “Love Letters”, o que a fez mudar e aceitar este convite para fazer comédia?
ALINA VAZ: As “Love Letters” foram um marco na minha vida, deram-me a certeza, do que sei, mesmo em registos diferentes, porque ao fazer tanta comédia, apesar de não ser cómica, deixaram de pensar em mim como actriz capaz de fazer outras coisas, só que eu em 1968 larguei o Vasco Morgado (a quem devo muito) e fui para o TEP [Teatro Experimental do Porto] com metade do ordenado que tinha com o Vasco, pois queria fazer outro tipo de teatro, no entanto devo dizer que fazer comédia não é nada fácil; e o Lawrence Olivier diz nas suas memórias que quem nunca fez comédia nunca será um actor completo, ao fazer as “Love Letters” eu sabia que era capaz, os ensaios com o Alberto Villar e o Celso [Cleto] foram um prazer enorme, pura magia e uma sensação de fazer bem, sensação essa que só dá aos actores que procuram continuamente o limite. Se o atingimos não sei, mas trabalhámos para isso.
Estive dois anos parada, o que na minha idade pode ser fatal em termos físicos e mentais, quando me convidaram para esta peça fiquei admirada, depois li o papel e achei que podia fazer, a peça é bem construída teatralmente, porque é o que nós chamamos uma peça de situações, são situações essas, que têm graça, cabe aos actores depois fazerem o melhor que podem, mesmo não sendo cómicos, mas a razão principal de ter aceitado este convite foi para me testar a mim própria o que fiz toda a vida.
H: Não será uma mulher de nostalgias, mas guarda bons momentos das contracenas com Raul Solnado e Laura Alves, por exemplo?...
ALINA VAZ: Bom quando estou sozinha a escrever ou ler ou a tratar das minhas gatas, penso muitas vezes; afinal o que fiz da minha vida? Chego sempre à conclusão de que a vida nos acontece simplesmente, e às vezes quase sem darmos por isso. Sou uma mulher de nostalgias como todo o ser humano e algumas bem difíceis, mas também sei que tenho de continuar e por isso falo pouco nesses assuntos, são tão meus tão íntimos, que acho não dever partilhar com quase ninguém, no entanto estou agora a partilhar consigo. Não sei, mas ainda lhe digo que também tive momentos muito belos na minha vida e na profissão, esses recordo muitas vezes quando estou só. Pode não acreditar, mas tenho um sentido de humor muito grande.
Sim guardo grandes recordações e boas desses dois maravilhosos actores. A Laura tinha uma técnica espantosa, e fazia do publico o que queria, quanto ao Raul dou-me com ele, e às vezes ainda lhe peço opiniões, é preciso não esquecer que foi vedetíssima, que teve o atrevimento de fazer os monólogos da guerra, e que fez um teatro com o dinheiro dele, de vez em quando jantamos e espantosamente apesar de termos feito três peças juntos nunca falamos de teatro.
H: “As Calcinhas Amarela”, segundo a companhia vai continuar depois do Verão, vai até à Madeira. Para um actriz habituada a alta comédia, que trabalhou com o Carlos Avillez, Xose Blanco Gil, Maria Helena Matos, Henriques Santana, e outros encenadores, o que no seu entender tem contribuído para o êxito deste peça, com mais de 30 anos?
ALINA VAZ: Em teatro nunca sabemos porque se tem êxito popular, às vezes até o nome da peça influencia, mas já disse que esta peça é bem construída pois de dez em dez minutos acontece uma coisa diferente o que é uma surpresa para o publico, julgo que é uma das razões do êxito. O nome do Tozé Martinho também, e o facto de há anos ele ir para a província sempre com comédias, tudo junto faz acontecer o êxito.
H: Há um projecto seu de enorme valia e pouco “badalado” como se diz hoje, as Viagens ao Interior do Teatro, considera-o fundamental na formação de públicos?
ALINA VAZ: As Viagens ao Interior do Teatro, são tão populares que já todos nos copiaram o nome, o que demonstra uma certa falta de ética, mas não vale a pena lutar contra os inúmeros grupos que o copiam.
Fazemos este ano 22 anos sempre com um espectáculo apenas por semana, o elenco está junto há anos, e sentimos que gostamos do que estamos a fazer. Abordamos o trabalho que se faz antes de levantar o pano e explicamos que é um trabalho que tem de se fazer como noutra profissão qualquer.
Os alunos vão ao palco e durante a primeira parte podem perguntar o que querem, é tudo simples e directo, falamos com eles e julgo que o êxito vem daí. É a jóia da nossa coroa, minha e do Alberto Villar, sim considero este projecto fundamental, porque damos respostas e talvez ajudemos os alunos a perceberem melhor que têm mesmo de trabalhar para fazerem o que querem mais tarde na vida.
H: Este ano a Sociedade Portuguesa de Autores distinguiu-a com a Medalha de Honra. O que representou para si?
ALINA VAZ: Uma enorme surpresa, enorme, julgo que me foi atribuída pelo grande trabalho que fiz durante anos para a RDP na adaptação de textos de autores portugueses, às vezes pensava, um dia vão-nos dar uma medalha pelo enorme trabalho feito com os alunos das escolas, afinal foi ao divulgar autores portugueses na rádio que acabei por ter uma medalha, não esperava, mas senti surpresa da parte de muitos colegas… passe a vaidade tenho mais algumas que nunca divulguei.
H: Tem andado ausente das televisões, a que se deve? Comenta-se a sua
rebeldia em não fazer “castings”, confirma?
ALINA VAZ: Sim sou rebelde a fazer “castings”, não por me considerar melhor, não, mas porque são feitos sem qualquer respeito pelos actores que têm uma carreira, mas mesmo sem grande carreira, actores já com uma certa idade são metidos no molhe, dizem-me que na América também é assim… será … Mas são feitos em condições, não com um menino de câmara na mão a dizer cheio de pressa, vá lá diga isto, está feito, boa tarde, o meu feitio apesar de ser reconhecido como bom, em certas ocasiões fica mau não pactua, e pura e simplesmente não faço, isto é uma profissão difícil temos que ter respeito por nós próprios e fazer com que os outros tenham também respeito por nós e por esta profissão tão bela. Quanto à televisão fiz muita mas agora não me chamam não sei porquê, talvez por não pedir e não telefonar, não sei.