Sunday, 17 October 2010

RECURSO AO TRIBUNAL DE JÚRI MAIS FREQUENTE

Decisão

Tribunal de júri cada vez mais estratégia da defesa

Leonor Cipriano

Os advogados recorrem ao povo para conseguirem penas menos severas, enquanto o Ministério Público pede a participação da opinião pública para agravar a sentença

Quando surpreendeu a mulher com um amante, Afonso (nome fictício) pegou numa faca e disferiu 24 facadas no rival. Se fosse condenado por um tribunal comum, incorria numa pena de oito a 16 anos de cadeia. Mas o tribunal de júri, composto por quatro cidadãos e três juízes de direito, considerou que cometera um homicídio privilegiado. E condenou-o a três anos de prisão.

Este foi o primeiro tribunal com jurados solicitado pelo advogado Rodrigo Santiago, em Coimbra - o penalista que agora pediu o mesmo tipo de julgamento para o industrial, administrador da SAD da União de Leiria, acusado de homicídio qualificado do assaltante que trabalhara no seu armazém. António Bastos atingiu-o já ele estava algemado por dois militares da GNR. Ainda feriu um dos guardas.

Recorrer ao cidadão comum para julgar um crime grave é cada vez mais uma questão de estratégia. Para a defesa, chegar à razão do povo pode atenuar a sentença. "Em casos de homicídios passionais pode ser benéfico", refere Rodrigo Santiago ao DN, porque os jurados consideram que há uma atenuação da culpa.

Mas o julgamento por jurados não é apenas pedido pela defesa. Segundo o Código Penal, pode um assistente ou o Ministério Público MP) formalizarem o pedido. Foi o que aconteceu no caso de Wellington Nazaré, o brasileiro que há dois anos assaltou o BES de Campolide. O MP pediu que o suspeito - filmado por câmaras de televisão a apontar uma arma à cabeça do gerente - fosse julgado por júri.

Para o advogado do brasileiro, João Martins Leitão, o MP procurava uma pena mais severa, numa altura "de grande sentimento de insegurança. "A chave é considerar-se que o júri tem uma natureza de repulsa sobre o crime. Por isso consegue-se o maior grau de pena possível", explica.

Wellington foi condenado a onze anos de cadeia pelos jurados. O recurso para o Tribunal da Relação baixou-lhe a pena para oito anos e meio. O Supremo confirmou. "No tribunal de júri a pena foi mais severa", refere.

Para Rodrigo Santiago, o MP também procura este tipo de julgamentos "quando tem pouca prova". Uma opinião partilhada por Pragal Colaço, advogado de dois dos inspectores da PJ acusados de torturar Leonor Cipriano, mãe de Joana - a menina desaparecida do Algarve.

Pragal Colaço pediu que os polícias fossem julgados pelo público. "Eles prestam serviço público, teria que ser a comunidade a julgar. E como houve muito ruído à volta deste caso no sistema judicial, foi mais justo." Também Leonor Cipriano e o irmão foram condenados num tribunal de júri. O corpo de Joana, a principal prova do crime, nunca foi encontrado.

Estratégia é também uma das justificações que Carlos Melo Alves, defensor de Jorge Chaves - a ser julgado em Lisboa pelo homicídio à bomba do dono do bar O Avião. Apesar de já ter conseguido a absolvição de um traficante /consumidor de droga num tribunal de júri, Melo Alves não entende o porquê de jurados no caso do avião. "É um caso complexo, com provas mais técnicas. Mas compreendo que uma bomba deixe a comunidade mais sensibilizada."

DIÁRIO DE NOTÍCIAS 17-10-2010

por SÓNIA SIMÕES

http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1688176

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