Monday, 26 July 2010

LOVE PARADE: VERSÕES CONTRADITÓRIAS


Love Parade

"Vi mortos no túnel. Outros estavam vivos, desmaiados no chão. Outros choravam"

PÚBLICO

26.07.2010 - 08:49 Por João Manuel Rocha

Testemunhas e autoridades têm versões diferentes sobre a tragédia na Love Parade e é grande a divergência sobre número de participantes. O festival pode nunca mais acontecer.

Havia imensas barreiras, e as passagens para todos os lados eram muito estreitas.

Versões contraditórias tornam difícil perceber exactamente como tudo se passou. Sabe-se, sim, que 19 pessoas entre os 20 e os 40 anos morreram espezinhadas e 342 ficaram feridas com maior ou menor gravidade, aparentemente devido ao pânico que tomou conta de parte da multidão que, sábado à tarde, se concentrava na Love Parade de Duisburgo. "Vi mortos, outros vivos mas inconscientes", disse à AFP um dos milhares de jovens que ontem de manhã errava ainda pela estação de caminho-de-ferro daquela cidade do Oeste da Alemanha.

As autoridades locais remeteram ontem explicações sobre as circunstâncias do desastre para os resultados de um inquérito. Mas contrariaram testemunhos, segundo os quais terá sido provocado por uma debandada no interior do túnel de 200 metros de comprimento por 30 de largura, o único acesso ao recinto da antiga estação de comboios de mercadorias onde decorria o festival gratuito de música tecno, um dos maiores da Europa, a que terão acorrido mais de um milhão de pessoas.

O chefe adjunto da polícia de Duisburgo, Detlef von Schmeling, disse que 16 pessoas morreram à entrada do túnel, mas nenhuma perdeu a vida no seu interior. A maior parte das vítimas, disse, foram encontradas junto a duas escadas metálicas situadas perto da entrada do túnel, onde existem duas ladeiras, às quais era, em princípio, vedado o acesso. As autoridades têm referido desde sábado comportamentos individuais como a subida de cercas e postes como tendo estado na origem da tragédia.

O responsável policial recusou qualificar o comportamento da multidão como um "movimento maciço de pânico". Mas um polícia citado anonimamente pela edição online da revista alemã Der Spiegel qualificou a situação como "um inferno", com pessoas aterrorizadas a empurrarem e a baterem em tudo à volta para evitarem ser esmagadas. "O ambiente tornou-se agressivo, não podíamos controlá-los", disse.

A versão de Von Schmeling não coincide com a de uma testemunha ouvida pela AFP: "Vi mortos no túnel. Outros estavam vivos, mas desmaiados no chão. Outros choravam", contou a neozelandesa Anneke Kuypers, de 18 anos, estudante na Bélgica. "Como tenho formação em socorrismo, tentei ajudar um bocadinho. As pessoas estavam desidratadas, algumas tinham bebido de mais ou tomado drogas... No fim, fui dançar porque queria descomprimir. Mas perdi o rasto aos meus amigos."

"Eu estava no túnel por volta das 17h00. Havia imensas barreiras, e as passagens para todos os lados eram muito estreitas", contou outra testemunha, Alexis, 28 anos, de Wuppertal, uma localidade próxima de Duisburgo. "Havia filas de gente a desfalecer por causa do calor. Era uma loucura. Os polícias estavam nas escadas e empurravam as pessoas para as fazer sair. Alguns tentavam quebrar as barreiras. Foi terrível, um caos."

Patrick Günter, um jovem de 22 anos, não poupa críticas à organização. "Depressa deixou de haver o que quer fosse para beber sem ser álcool. E ainda que o espaço já estivesse cheio, continuavam a deixar entrar pessoas", referiu também à agência.

A festa continuou

As autoridades de Duisburgo justificaram não terem interrompido bruscamente a festa para evitar o pânico, mas houve quem se tivesse chocado com o facto de tudo ter continuado, como se nada tivesse acontecido. "Foi uma loucura. A festa continuou", indignou-se Lubbert, 31 anos, de Hanôver. "Toda a gente continuou a dançar e alguns podiam ter amigos mortos. E no final os organizadores disseram mesmo: "Muito obrigado por este belo dia.""

HÁ "NECESSIDADE URGENTE" DE PRIVATIZAR A TAP

Ministro das Obras Públicas em resposta ao Bloco Esquerda

Há “necessidade urgente” de privatizar a TAP, defende Governo

PÚBLICO

26.07.2010 - 12:03 Por Ana Tavares

O ministro das Obras Públicas, António Mendonça, diz que é preciso recapitalizar a transportadora aérea antes que surja uma nova crise.

“A recapitalização do grupo TAP é uma necessidade urgente e sem ela a empresa encontra-se numa situação fragilizada”, revela o gabinete de António Mendonça, numa carta enviada a 20 de Julho em resposta às questões colocadas pelo Bloco de Esquerda a propósito da privatização da transportadora portuguesa, divulgada hoje pelo jornal i.

Segundo o ministro, a venda da empresa a privados não se prende com o défice, mas sim com a necessidade de a empresa poder prevenir a entrada numa nova crise, “seja na procura, como em 2009, ou no preço do petróleo, como em 2008”, cita o i.

O Ministério das Obras Públicas considera ainda que se a empresa voltar a “ser arrastada para uma situação de ruptura financeira” não conseguirá, “por si só, solver compromissos”.

“A melhoria dos resultados operacionais” da empresa transportadora é, segundo o ministro, “ainda insuficiente”, pelo que “deverão ser consideradas todas as alternativas”.

Em 2009, altura em que foram conhecidos os 285 milhões de euros de prejuízos da TAP, o Governo decidiu constituir uma comissão para a reestruturação financeira da empresa, contudo, e até ao momento, as recomendações do Comité de Reestruturação ainda não serviram para tomar qualquer decisão.

Impacto no défice

Na carta enviada pelo Governo, pode ainda ler-se que “não há ainda uma decisão final sobre o modelo a adoptar sobre a questão da privatização da TAP”, pelo que ainda “não é conhecido o impacto esperado do ponto de vista da evolução do défice”.

Quanto à garantia dos postos de trabalho envolvidos nesta acção, o ministro revela que “garantirá os direitos dos trabalhadores”, e que apesar da privatização, “há condições para a empresa continuar a oferecer excelentes oportunidades de trabalho”.

VICTORIA E DANIEL: A CONVENÇÃO ANTENUPCIAL

Victoria e Daniel da Suécia: Detalhes do acordo matrimonial

Todos os bens da Coroa ficam protegidos em caso de divórcio.

Enquanto Victoria e Daniel da Suécia desfrutam da lua-de-mel no Pacífico, a Casa Real sueca está a tratar de todos os detalhes decorrentes do casamento, como é o caso do contrato pré-nupcial, que já figura no registo de Solna, cidade onde se encontra a residência do casal, o Palácio de Haga.

Mais uma vez manteve-se a tradição da realeza, segundo a qual não existe união sem acordo matrimonial prévio. Estes pactos costumam contemplar a separação total de bens, onde cada um fica com o que tem e o que é ganho depois do enlace, ou seja, palácios e fortunas não se repartem. Também os bens da coroa sueca e os pertences privados da princesa Victoria ficam protegidos em caso de divórcio.

De acordo com o contrato, de acesso público, tudo o que a princesa Victoria e o príncipe Daniel possuem e tudo o que possam possuir através de heranças, presentes ou ingressos privados será propriedade de cada um. Isso supõe que o novo príncipe não tem direito a herdar nada do património do reino ou da família real.

Daniel Westling, que até à data do casamento dirigia os ginásios Master Training e Balance, no centro de Estocolmo, renunciou oficialmente a gerência de ambos, ficando a receber receitas dos mesmos.
CARAS 26-07-2010

QUAL CRISE DO EURO?



20 Julho2010 11:49

Hans Werner Sinn

JORNAL DE NEGÓCIOS





Apesar dos enormes pacotes de resgate, os "spreads" das taxas de juro na Europa continuam inalterados. Os mercados ainda não encontraram o seu equilíbrio e os governos do extremo sudoeste do continente observam com nervosismo o desenrolar dos acontecimentos. O que está a acontecer?

Os pacotes de resgate foram reunidos no fim-de-semana de 8 e 9 de Maio em Bruxelas. Além dos 80 mil milhões de euros já programados para a Grécia, os países da União Europeia chegaram a acordo para criar uma linha de crédito de 500 mil milhões de euros para outros países em dificuldades. O Fundo Monetário Internacional entregou mais 280 mil milhões de euros.

A força motriz de tudo isto foi o presidente francês Nicolas Sarkozy, que se juntou aos líderes dos países do sul da Europa. Os bancos franceses, que estavam excessivamente expostos às obrigações dos governos da Europa do sul, estiveram entre os principais beneficiários deste pacote de resgate.

Dado que as medidas de resgate, além do pacote de ajuda previamente negociado para a Grécia, não estavam na agenda da reunião de Bruxelas, a chanceler alemã, Angela Merkel pensou que podia viajar tranquilamente para Moscovo para assistir às celebrações do fim da II Guerra Mundial - ao contrário de Sarkozy que declinou o convite do primeiro-ministro russo, Vladimir Putin. Pior, o líder da delegação alemã à reunião da União Europeia ficou doente e teve que ser levado para ao hospital assim que chegou a Bruxelas. Isto deixou a delegação alemã sem direcção.

Sarkozy aproveitou a oportunidade e surpreendeu a Alemanha ao proclamar uma crise sistémica do euro. O presidente francês pediu enormes quantidades de dinheiro e, segundo informou o primeiro-ministro espanhol, José Luís Zapatero, ameaçou retirar a França do euro e quebrar a aliança franco-alemã se a Alemanha decidisse não disponibilizar o dinheiro. Depois de apenas dois dias de negociações, a cláusula de não resgate do Tratado de Maastricht, condição imposta pela Alemanha para abdicar do marco alemão, estava morta. O "Clube Med", como os alemães chamam aos países do sul da Europa, tinham-se apoderado da Europa.

Até o Banco Central Europeu participou, através da compra de obrigações de países excessivamente endividados, usando uma lacuna no Tratado de Maastricht e ignorando os representantes alemães do banco. O edifício europeu foi violentamente sacudido. O presidente alemão demitiu-se pouco depois das decisões - e alguns dizem que foi por causa delas. A elite política da Alemanha está furiosa e diversas vozes sérias pedem que a Zona Euro se divida em duas categorias: Norte e Sul e que a França faça parte da última.

Eu não partilho dessa opinião. O euro protegeu a Europa contra os riscos cambiais e é um passo útil no sentido de uma maior integração europeia. Além disso, a estabilidade oferecida pelo eixo franco-alemão é indespensável para a Europa.

As tensões criadas pela imprudência de Sarkozy ameaçaram a estabilidade política da Europa e aumentaram a incerteza dos mercados em comparação com o que teria acontecido se tivesse sido implementado um programa de resgate mais prudente e coordenado. Os programas acordados não chegam para dar segurança aos credores e a Alemanha não estará, de certeza, disposta a ceder de novo a Sarzozy em futuras negociações para prolongar as medidas de resgate - pelo menos, como estão formuladas actualmente - além dos três anos inicialmente estipulados.

Os argumentos usados para justificar o golpe são duvidosos. De forma a ultrapassar a cláusula de não resgate, Sarkozy e outros líderes europeus dramatizaram a deterioração das obrigações dos governos do sul da Europa e o correspondente aumento dos "spreads" das taxas de juro.

Ao proclamar formalmente uma crise sistémica do euro - quando na realidade existiam apenas reacções nervosas do mercado devido às obrigações de alguns países europeus - puderam invocar o artigo 122 do Tratado da União, cujo objectivo é ajudar os países membros em casos de desastres naturais fora do controlo.

A proclamação de uma crise sistémica deitou mais lenha na fogueira. Os investidores acreditaram na palavra dos líderes europeus, porque, normalmente, os políticos subestimam e não exageram uma crise.

A média dos spreads das taxas de juro dos países protegidos pelo novo pacote de resgate face à Alemanha era 1,08 pontos percentuais a 7 de Maio, quando se afirmou que o mundo vinha abaixo. Depois parecia que os pacotes de resgate estavam a pressionar os spreads para valores muito mais baixos mas o optimismo dos líderes desvaneceu-se à medida que cada vez mais participantes do mercado compreenderam a interpretação que os líderes europeus tinham feito da crise. Na semana que terminou a 18 de Junho, o spread médio tinha subido para 1,1 pontos.

Obviamente, o mercado está agora tão nervoso como estava antes do fim-de-semana de Maio. Mas daí a dizer que isto é o fim do euro vai um longo caminho. Em 1995, pouco tempo antes do euro ser anunciado, o spread da taxa de juro correspondente era 2,6 pontos percentuais, mais do dobro do nível actual. O euro não estava em perigo quando os líderes europeus decidiram salvá-lo e não está em perigo agora. Os mercados estão apenas a mover-se no sentido de um novo equilíbrio com spreads mais elevados, que reflectem um maior risco de incumprimento de alguns países europeus - um pouco como no período pré-euro mas de forma muito menos extrema.

Isto não tem nada de mal. O ajustamento do mercado vai terminar quando foram alcançados os spreads apropriados. Qualquer tentativa política de parar este processo de forma antecipada vai fracassar. Não há razões para entrar em pânico e há muitas razões para manter a calma e esperar que surja um novo equilíbrio.

Os spreads entre activos seguros e de risco são naturais em mercados de crédito funcionais. Estes assinalam os riscos potenciais e exercem uma disciplina de dívida sobre quem pede emprestado. Isto é exactamente o que a Europa precisa. O Pacto de Estabilidade e Crescimento, criado para castigar os países que violem o limite de 3% do défice orçamental, foi uma farsa: nunca nenhum país foi punido por ter quebrado este limite. Felizmente, os mercados de capital, finalmente, impuseram-se para impor aos governos a duras e necessárias limitações orçamentais.

A disciplina vai diminuir as gigantescas importações de capital pelos países da periferia da Europa e acabar com o sobreaquecimento provocado pela convergência de taxas de juro que o euro provocou. Estes países vão atravessar um período de depressão que irá reduzir as suas taxas de inflação (e talvez aproximá-los da deflação), melhorar a sua competitividade e reduzir os défices das contas correntes.

Pelo contrário, a Alemanha, que sofreu uma deflação relativa e uma longa depressão com o euro, terá um boom inflaccionário que reduzirá a sua competitividade e o excedente da conta corrente. A ministra das Finanças francesa, Christine Lagarde, que muitas vezes se queixou dos desequilíbrios comerciais na Europa, deverá aplaudir estas reacções do mercado, que foram involuntariamente fortalecidas pelo seu presidente.


Hans-Werner Sinn é professor de Economia e Finanças Públicas na Universidade de Munique e presidente do Instituto Ifo.
© Project Syndicate, 2010.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

AJUDA AO DESENVOLVIMENTO EM CINCO PASSOS FÁCEIS

JORNAL DE NEGÓCIOS
20 Julho2010

Jeffrey D. Sachs

Cada país, rico ou pobre, deve garantir o acesso universal aos cuidados primários de saúde, o que inclui condições seguras de nascimento, nutrição, vacinas, controlo da malária e serviços clínicos.

Cada ano, quase nove milhões de crianças morrem em condições que podiam ter sido evitadas ou tratadas e quase 400 mil mulheres morrem devido a complicações durante a gravidez.

Quase todas estas mortes ocorrem nos países mais pobres do mundo. Evitá-las reduziria não só o sofrimento, mas fomentaria, também, a prosperidade económica em sociedade empobrecidas e instáveis.

A maior barreira para alcançar este objectivo é que os países mais pobres não podem financiar cuidados primários de saúde universais, apesar do custo por pessoa ser muito baixo. Graças às vacinas, às medicinas modernas, aos novos métodos de diagnóstico, aos telemóveis e a outras novas tecnologias, os cuidados de saúde primários são, actualmente, muito eficazes e muito baratos, custando cerca de 54 dólares por pessoa por ano nos países pobres.

No entanto, devido aos seus baixos rendimentos, os orçamentos nacionais dos países mais pobres só podem financiar cerca de 14 dólares por pessoa. A ajuda financeira externa é necessária para ajudar a financiar cerca de 40 dólares por pessoa. Dado que cerca de mil milhões de pessoas carecem de cuidados primários de saúde, são necessários 40 mil milhões de dólares por ano. Actualmente, os doadores estrangeiros - incluindo Estados Unidos, União Europeia e Japão - contribuem com um terço deste valor, cerca de 14 mil milhões de dólares por ano.

O "gap" financeiro é de 26 mil milhões de dólares. Com esse dinheiro, a vida de muitos milhões de mães e de crianças poderia ser salva todos os anos.

Para os países ricos não é muito dinheiro mas, ainda assim, não o conseguiram reunir. A falta mais óbvia é no Fundo Global de Luta contra a Sida, a Tuberculose e a Malária, uma iniciativa global para ajudar os países mais pobres a combater estas doenças mortais. O Fundo Global precisa desesperadamente de dinheiro. Apesar disso, a administração Obama e outros governos não estão a dar resposta a esta necessidade financeira.

Os países ricos poderiam facilmente reunir este dinheiro. Primeiro, os Estados Unidos podiam terminar a cara e falhada guerra no Afeganistão, que está a custar cerca de 100 mil milhões de dólares por ano. Se os Estados Unidos dessem uma pequena percentagem desse valor para ajudar o desenvolvimento do Afeganistão, haveria muito mais probabilidades de alcançar a paz e a estabilidade nesse país assolado pela guerra.

Por exemplo, os Estados Unidos podiam doar 25 mil milhões de dólares anuais para ajuda ao desenvolvimento e outros 25 mil milhões de dólares para a saúde global e, ainda assim, poupariam 50 mil milhões de dólares anuais para reduzir o défice orçamental. O Afeganistão, e os Estados Unidos, estariam mais seguros, o mundo ficaria mais saudável e a economia norte-americana seria, enormemente, beneficiada.

Uma segunda hipótese seria aplicar impostos aos grandes bancos internacionais, que estão a ganhar lucros excessivos com as suas transacções especulativas. Mesmo depois de Wall Street quase ter deixado a economia mundial em ruínas, o governo norte-americano tratou-os com indulgência e protegeu-os, permitindo que voltassem a registar elevados lucros - talvez 50 mil milhões de dólares - no ano passado.

Os banqueiros voltaram a pagar a si próprios elevados bónus - mais de 20 mil milhões em 2009. Este dinheiro deveria ter ido para as pessoas dos países mais pobres e não para os banqueiros - que certamente não o ganharam.

É tempo de aplicar um imposto internacional sobre os lucros dos bancos - talvez através da implementação de um imposto sobre as transacções financeiras internacionais - que poderia arrecadar dezenas de milhões de dólares todos os anos. Os países em desenvolvimento devem fazer pressão para que este imposto seja criado e não devem aceitar desculpas débeis dos Estados Unidos e outros países para proteger os seus bancos.

Uma terceira hipótese seria obter maiores contribuições dos homens mais ricos do mundo. Vários deles, incluindo Bill Gates, George Soros, Warren Buffett e Jeffrey Skoll já são mega-filantropos, doando elevados montantes para o bem mundial. Ainda assim, outros milionários têm ainda de fazer doações semelhantes.

De acordo com a mais recente lista da "Forbes", existem 1.011 multimilionários no mundo, com uma riqueza líquida conjunta de 3,5 biliões de dólares. Isto significa que se cada multimilionário contribuísse com 0,7% da sua riqueza líquida, o montante total seria 25 mil milhões de dólares por ano. Imaginem, mil pessoas podiam garantir cuidados primários de saúde para mil milhões de pessoas.

Uma quarta possibilidade seria olhar para empresas como a Exxon-Mobil, que ganha milhões de dólares em África todos os anos, mas, que de acordo com um dos relatórios da empresa, gastou apenas cinco milhões por ano em programas de controlo da malária em África durante 2000 e 2007. A Exxon-Mobil pode e deve financiar uma parte muito maior dos serviços de saúde primária tão urgentes em África, seja através de direitos pagos pela empresa ou de doações filantrópicas.

Em quinto lugar, os novos doadores, tal como o Brasil, a China, a Índia e a Coreia do Sul, têm a visão, o dinamismo económico e o interesse diplomático para expandir os seus apoios nos países mais pobres, bem como nas zonas mais pobres dos seus próprios países. Se os Estados Unidos e a Europa são demasiado negligentes para cumprirem as suas responsabilidades, as economias emergentes podem e vão realizar parte delas. Felizmente, estes novos doadores estão a tornar-se parceiros de confiança em África.

O mundo rico diz que há falta de dinheiro para fazer mais. Mas o que falta é imaginação e não recursos. Os Estados Unidos deviam deixar de desperdiçar dinheiro em gastos militares e destiná-lo ao financiamento do sistema de saúde. O mundo deveria implementar um imposto global sobre o sector bancário. Os multimilionários deviam aumentar o seu nível de filantropia. As empresas petrolíferas deviam pagar mais. Os novos doadores, como a China, podem preencher o "gap" financeiro deixado pelos países doadores tradicionais.

O dinheiro existe. As necessidades são urgentes. É um desafio à moralidade e à capacidade de visão.

Jeffrey D. Sachs é professor de Economia e director do Instituto da Terra na Universidade de Columbia.

© Project Syndicate, 2010.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

BANCOS EUROPEUS, CRISE EUROPEIA

Bancos europeus, crise europeia

20 Julho2010 11:57

Daniel Gros

JORNAL DE NEGÓCIOS

Daniel Gros é director do Centro para Estudos Políticos Europeus.




A Europa continua a ser o epicentro do Acto II da crise financeira global, que se transformou agora numa crise de divida soberana dentro da Zona Euro. Como é que isto pode ter acontecido se, pelo menos no papel, todos os problemas tinham, aparentemente, sido resolvidos durante a cimeira extraordinária da União Europeia em Maio, que criou um Instrumento de Estabilidade Financeira Europeu (EFSF, sigla em inglês) e assegurou um financiamento total próximo de um bilião de dólares?

As promessas feitas em Maio tornaram-se, entretanto, mais concretas. No Luxemburgo foi estabelecido um “veículo para um propósito específico” que já conta com milhões de euros em garantias dos Estados-membros.

Se todos os recursos prometidos (750 mil milhões de euros, incluindo um financiamento do Fundo Monetário Internacional) fossem utilizados, a União Europeia poderia financiar por completo todos os países com problemas (Portugal, Espanha e Irlanda) durante vários anos. Além disso, o Banco Central Europeu mostrou disponibilidade para comprar obrigações do governo (e privados) se considerar que o funcionamento do mercado está a ser afectado.

No entanto, esta artilharia financeira não impressionou os mercados. Os “spreads” das obrigações públicas espanholas continuam a subir, e estão agora mais elevados do que antes do anúncio do EFSF. E existem sinais ameaçadores de tensões no mercado interbancário, à medida que mais e mais bancos – reflectindo a fraca confiança de que a estabilidade do sistema tenha sido restabelecida – preferem depositar o seu dinheiro no BCE a emprestá-lo a outros bancos.

A explicação é simples: os problemas que são a base da crise (o estado precário das finanças públicas gregas e do sector imobiliário espanhol) não foram resolvidos, apesar de poderem ser facilmente geridos num contexto pan-europeu. A Grécia representa cerca de 2% da economia da Zona Euro; mesmo que o país entrasse em incumprimento e o valor da recuperação fosse apenas 50%, os prejuízos seria de cerca de 150 mil milhões de euros, apenas 1,5% do produto interno bruto (PIB) da Zona Euro.

Os problemas em Espanha são, provavelmente, um pouco maiores, apesar das estimativas oficiais dos prejuízos do sistema bancário espanhol serem apenas 100 mil milhões de euros. Mas o verdadeiro problema de Espanha pode estar em outro local: a exposição dos bancos franceses, alemães e outros ao sector imobiliário espanhol.

Muitos empréstimos realizados a construtoras espanholas terão que ser considerados incobráveis. Mas, mesmo no pior dos cenários, os prejuízos dos bancos espanhóis e dos outros no sector imobiliário de Espanha não deve exceder 300 mil milhões de dólares, ou seja, cerca de 3% do PIB da União Europeia.

Assim, a verdadeira questão é porque é que problemas de proporções controláveis na periferia da Europa estão a paralisar todo o sistema bancário da Zona Euro. Apesar de tudo, ninguém esperaria que o sistema bancário dos Estados Unidos entrasse em colapso devido a uma bolha imobiliária na Califórnia ou se o Michigan (que tem a mesma dimensão da Grécia) entrasse em incumprimento.

A principal razão para os mercados financeiros da Europa continuarem nervosos é que, oficialmente, não existe nenhum problema. A Grécia não tem um problema de solvência e a reestruturação da sua dívida pública não é uma opção. Da mesma forma, em Espanha, a linha oficial é que o sistema bancário nacional está bem capitalizado.

A primeira regra para lidar com uma turbulência no mercado financeiro deve ser reconhecer a verdade e a dimensão dos problemas. A experiência grega mostrou-nos que ignorar a existência dos problemas pode provocar uma espiral de subida dos prémios de risco e de queda da confiança.

A este respeito, a publicação dos resultados dos testes de “stress” realizados aos 100 maiores bancos da União Europeia, prometida para o final de Julho, é, claramente, um passo em frente.
Mas existe uma segunda e mais perturbadora razão para os mercados financeiros continuarem instáveis: grandes franjas do sistema bancário europeu continuam, amplamente, descapitalizados. De acordo com as estatísticas do BCE, os bancos da Zona Euro têm cerca de 20 euros de passivo (incluindo dívida interbancária) por cada euro de capital e reservas. Isto significa que por cada prejuízo de capital de um euro, vai existir 20 euros de dívida duvidosa.

Mesmo o pior cenário para a Grécia e para a Espanha implicaria, no máximo, prejuízos 450 mil milhões de euros. Os fundos mobilizados até agora pelo EFSF (750 mil milhões de euros) seriam largamente suficientes para lidar com esta questão – desde que os potenciais prejuízos sejam claramente identificados e se reservem os fundos necessários para lidar com eles. Ainda assim esta não tem sido a estratégia seguida.

Em vez disso, o financiamento europeu vai ser usado apenas para resgatar governos, que por sua vez precisam de dinheiro para resgatar os seus bancos. Mas dado o rácio dívida-capital de 20:1 no sector bancário, esta opção implica que as exigências de capital vão ser astronómicas: em comparação com uma factura de 450 mil milhões de euros se os potenciais prejuízos continuarem ocultos e dispersos, podem ser precisos nove biliões de garantias de dívida para garantir a estabilidade do sistema bancário da Zona Euro.

Em resumo, aplicar teste de “stress” rigorosos aos bancos da Zona Euro (seguidos por uma recapitalização obrigatória) exigiria muito menos financiamento público do que a continuação de garantias globais para todos.

A Europa não pode escapar à crise nos seus mercados financeiros até que recomponha os seus bancos. Infelizmente, os decisores políticos europeus deixaram enganar-se por duas vezes pelas opiniões politicamente convenientes da crise – primeiro em 2007/2008, ao assumirem que o contágio financeiro vinha dos Estados Unidos, e, actualmente, ao culparem a política orçamental imprudente no sul da Zona Euro.

Mas o verdadeiro problema é que o sistema bancário da União Europeia tem uma capitalização tão fraca que não pode assumir nenhum prejuízo. Ao mesmo tempo, está tão interligado que os problemas de um país, rapidamente, colocam todo o sistema em risco. Até que os problemas dos balanços dos bancos sejam resolvidos de forma decisiva, os mercados financeiros vão continuar nervosos.

Daniel Gros é director do Centro de Estudos Políticos Europeus.

CREDIT DEFAULT SWAPS EM TRIBUNAL

Luigi Zingales

A acção judicial apresentada pela Securities and Exchange Commission (SEC) contra o Goldman Sachs por fraude de obrigações, acusando o banco de interpretar de forma errada a forma como uma obrigação de dívida colaterizada (CDO, sigla em inglês) tinha sido criada, reavivou o mal-estar público com os credit default swaps (CDS), o instrumento utilizado para apostar contra estes CDO.

Antes da crise financeira de 2008, os CDS eram um produto esotérico, conhecido apenas por um número restrito de investidores sofisticados e académicos especializados. Actualmente, são um nome muito familiar, sinónimo de especulação descontrolada, ganância ilimitada e instabilidade sistémica. Na verdade, os CDS são acusados de serem uma das principais causas da crise financeira. A legalidade do comportamento do Goldman Sachs vai ser determinada pelo tribunal de justiça mas a péssima reputação dos CDS está a colocar em perigo a sobrevivência deste instrumento no tribunal da opinião pública.

Aproveitando a onda populista, alguns políticos propuseram a proibição dos CDS. A recente crise grega galvanizou ainda mais o sector anti-CDS. Afinal não é culpa dos avarentos especuladores do mercado de CDS que colocou a Grécia à beira do incumprimento e os funcionários públicos gregos a sofrerem profundos cortes salariais? Numa palavra, não. Longe de serem a semente do diabo, os CDS são um instrumento financeiro útil que pode melhorar não apenas a estabilidade financeira mas também a forma como as empresas e os países são geridos. Proibi-los será mais prejudicial do que benéfico. Qualquer tentativa nesse sentido seria nociva, porque desviaria a atenção do objectivo útil de disciplinar o mercado de CDS e torná-lo mais transparente, estável e eficiente.

Uma das principais vantagens (se não a principal vantagem) do capitalismo face ao planeamento central é a informação proporcionada pelos preços do mercado. Quando a procura por batatas ao preço actual excede a oferta, o preço das batatas sobe, assinalando escassez. Os agricultores individuais não precisam de nenhuma directiva burocrática para decidir se plantam mais baratas: um aumento nos preços cria um incentivo para plantar mais batatas; uma queda nos preços é um sinal para plantar menos.

O mesmo é verdade para os preços das acções. Um aumento no preço das acções dos produtores de aço sugere um aumento da procura de aço, que leva os empresários a abrir mais fábricas e os investidores a concederem-lhes mais dinheiro. Pelo contrário, uma queda no preço das acções dos produtores de aço leva os empresários a liquidar as fábricas existentes e dissuade os investidores de darem mais recursos para o sector.

Infelizmente, por vezes os preços não cumprem correctamente esta função de indicadores, como aconteceu com as recentes bolhas tecnológicas e imobiliárias. Durante a bolha tecnológica, os preços assinalaram uma elevada procura no sector da Internet. Por esta razão, milhões de dólares foram usados para publicitar empresas improváveis na televisão e construir uma capacidade de rede muito além das necessidades. Durante a bolha imobiliária, os preços assinalaram uma severa escassez de casas. Milhões de dólares foram gastos em novas casas situadas em locais remotos onde ninguém queria viver.

Dada a elevada afectação errada de recursos nos dois casos, é vital perceber o porque é que os preços não conseguiram enviar um sinal preciso aos investidores. Porque é que os Estados Unidos, com o mercado financeiro mais desenvolvido do mundo, viveu duas grandes bolhas em menos de uma década? Parte da culpa pode ser atribuída a uma política monetária expansionista, mas o verdadeiro problema é um ambiente institucional que favorece um sentimento "bullish".

Os fundos de pensões, os fundos mútuos e os bancos de investimento estão todos eles no mercado accionista. Ter uma posição curta numa acção é difícil e arriscado: é difícil por pedir acções emprestadas é difícil e é arriscado porque ter uma posição curta tem um potencial de subida limitado e de descida ilimitado. Por outras palavras, os títulos tradicionais disponíveis para os investidores tornam mais fácil apostar a favor de uma empresa do que contra ela, levando a que os preços sejam mais afectados por exuberância irracional do que pelo pânico.

A este respeito, os CDS são únicos. Dado que funcionam como um seguro sobre a capacidade de quem pede emprestado cumprir as suas obrigações, tornam mais fácil expressar uma opinião negativa sobre uma empresa ou título. Para expressar uma opinião negativa através dos mercados de CDS, os investidores não precisam de localizar os títulos para pedir emprestado (um pré-requisito do "short-selling") e apenas arriscam um prémio limitado, enquanto têm a oportunidade de ganhar muitas vezes esse valor. Foi o mercado de CDS que permitiu que a opinião negativa - e correcta - de John Paulson e outros se incorporasse, finalmente, nos preços de mercado. Elas fizeram a bolha estalar. Apesar de ser doloroso para o resto da sociedade, isto é saudável. Quanto mais tempo durar uma bolha mas danos causa.

O mesmo raciocínio aplica-se à crise grega. Os CDS sobre a Grécia ofereceram um sinal útil da situação financeira do país. Foi graças ao aumento repentino no mercado de CDS que o governo grego ajustou o seu orçamento e melhorou a sua situação orçamental. Os testes médicos também têm muitas vezes más notícias mas aboli-los não resolve os problemas, apenas os esconde, agravando-os.

A razão porque os políticos e os empresários odeiam os CDS é precisamente porque as taxas de CDS são muito úteis e imediatas a expor os seus erros. Ninguém gosta que descubram que estão errados. Por esta razão, os políticos e os empresários poderosos seduzem a imprensa, as agências de "rating" e mesmo os analistas para que mostrem o lado positivo das suas acções. Como é a fonte principal de informação negativa que não é sensível ao poder, o mercado de CDS é temido e os políticos querem eliminá-lo. Claro que o mercado de CDS não é perfeito. De facto, nem sequer é um mercado organizado mas apenas um mercado virtual informal. As regras existentes não estão a destinadas a torná-lo transparente ou resiliente mas sim mais rentável para grandes instituições como o Goldman Sachs e JP Morgan.

É necessária intervenção para formalizar o mercado de CDS e forçar uma colaterização apropriada, para que nenhum governo tenha que intervir para realizar um resgate. Mas regular o mercado de CDS não significa bani-lo. Fazê-lo não faria mais do que semear a sementes da próxima bolha.

JORNAL DE NEGÓCIOS 14-07-2010

LUIGI ZINGALES

Transportes

Governo admite que TAP não resistirá a uma nova crise


A TAP fechou 2009 com um prejuízo de 3,5 milhões de euros

Seja por causa do preço dos combustíveis, ou por uma quebra na procura, o executivo diz que nova crise "arrasta TAP para a ruptura". É "urgente" a privatização

É o governo que o diz. Numa carta datada de 20 de Julho, o ministério das Obras Públicas explica a urgência em privatizar a transportadora aérea TAP não com o défice, até porque não faz ideia de quanto irá encaixar com a venda, mas com a "necessidade urgente" de recapitalizar a empresa antes que surja uma nova crise - seja na procura, como em 2009, ou no preço do petróleo, como em 2008. Se a TAP voltar a passar por qualquer uma dessas situações não sobreviverá, considera o governo. E, segundo as Obras Públicas, nem o doloroso caminho de "melhoria dos resultados operacionais" que tem sido seguido a salva: "Este é o caminho que tem sido seguido pela TAP. Mostrando--se, contudo, ainda insuficiente, deverão ser consideradas todas as alternativas", revela o gabinete do ministro.

"A recapitalização do grupo TAP é uma necessidade urgente e sem ela a empresa encontra-se numa situação fragilizada, correndo riscos de, em face de uma nova crise de mercado ou de aumento dos preços dos combustíveis, a empresa ser arrastada para uma situação de ruptura financeira e de impossibilidade de, por si só, solver compromissos", lê-se na carta enviada pelo gabinete do ministro António Mendonça em resposta a questões colocadas pelo Bloco de Esquerda a propósito da privatização da transportadora aérea.

O governo constituiu em 2009 uma comissão para a reestruturação financeira da TAP, logo após terem sido conhecidos os 285 milhões de euros de prejuízos da empresa e a sua situação de falência técnica: no final do ano passado, os capitais próprios negativos chegavam a 200 milhões. Porém, e apesar de a comissão já ter entregado ao governo o seu plano para a TAP - como o i noticiou em Março -, nas respostas dadas ao deputado do Bloco de Esquerda, as Obras Públicas salientam que nos trabalhos "desta comissão têm vindo a ser desenvolvidos estudos sobre a matéria em apreço [privatização]" e que as recomendações do Comité de Reestruturação ainda não serviram para tomar qualquer decisão.

Encaixe e empregos Sobre o impacto de venda da TAP no abate do défice, o governo salienta que, sem decisão sobre o que será vendido a privados, ainda não consegue prever um encaixe. "Uma vez que, como se refere, não há ainda uma decisão final sobre o modelo a adoptar sobre a questão da privatização da TAP, não é ainda conhecido o impacto esperado do ponto de vista da evolução do défice", lê-se na carta do ministério das Obras Públicas.

Contudo, sobre se o Estado vai garantir "os postos de trabalho associados às empresas a alienar", acabam-se as incertezas. Mesmo com a própria TAP a admitir que precisa de reduzir a mão-de-obra, o governo assegura que "garantirá os direitos dos trabalhadores" e que, "independentemente de quem seja o dono das acções" da TAP, "há condições para a empresa continuar a oferecer excelentes oportunidades de trabalho".

I ONLINE 26-07-2010

por Filipe Paiva Cardoso