Wednesday, 23 October 2013

MANUEL ALEGRE APRESENTA LIVRO SOBRE D. DUARTE PIO


Perguntaram um dia a D. Duarte se tinha sido educado para ser rei. Ele respondeu: “Fui educado para ser português.” Essa é uma das razões por que estou aqui hoje. Porque ser português é o sentido essencial da personalidade de D. Duarte e do nobre despojamento com que tem procurado cumprir o que entende ser a sua missão. António Sérgio nunca deixou de criticar a mentalidade dogmática e aquilo a que chamava “o espírito de seita, de bairro e de capelinha.” Considerava o sectarismo uma doença nacional. Infelizmente são vícios que ainda permanecem. Por isso alguns terão ficado surpreendidos com o facto de um republicano e homem de esquerda como eu vir apresentar esta biografia de D. Duarte. Devo dizer que o faço com gosto. Em primeiro lugar pela consideração e respeito que me merece D. Duarte, não só como chefe da instituição real, mas, para utilizar uma feliz expressão de Mendo Castro Henriques, como “intérprete activo de Portugal.” E ainda porque se trata de uma boa ocasião para ultrapassar preconceitos e reflectir sobre alguns temas nacionais. A Pátria está acima da República e da Monarquia. E este é um momento em que são precisos patriotas que saibam renovar e afirmar os valores permanentes de Portugal e dar ao conceito de Pátria um sentido de modernidade e de futuro. Ou como queria Fernando Pessoa, “cumprir Portugal”, sabendo que o que Portugal tem de mais moderno e permanente é ser “o futuro do passado”. É também uma hora em que é necessário alargar e reinventar o espaço da cidadania. A tecnocracia tem vindo a sobrepor-se à política, o pragmatismo e a lógica dos interesses ao civismo e às convicções. A nossa Constituição consagra, a par dos direitos políticos, os direitos sociais. Mas se estes ficam por cumprir aqueles outros perdem substância e sentido. Numa democracia moderna, os direitos políticos são inseparáveis dos direitos sociais, culturais e ambientais. A burocratização da democracia faz com que se responda uniformemente a problemas diferenciados. Mas não há soluções únicas para sistemas que têm uma grande diversidade de saberes e conhecimento. Daí a necessidade de, no quadro da democracia representativa, alargar o espaço da cidadania e da democracia participativa. Que tem isto a ver com este livro? Como adiante se verá, tem até bastante. Permitam-me uma breve nota pessoal. Meu avô paterno, Mário Duarte, costumava caçar ou atirar aos pombos com o Rei D. Carlos, a quem, nem por ser monárquico, algumas vezes deixou de vencer, o que não era fácil; meu avô materno, Manuel Alegre, foi um dos chefes da Carbonária e um dos fundadores da República. Meu pai era monárquico, minha mãe republicana. Meu pai dizia-se monárquico sem rei e minha mãe republicana sem república. Um e outro transmitiram-me valores por que tenho pautado a minha vida. Talvez por ter nascido numa família assim, eu compreenda muito bem que nem sempre, como neste livro se afirma e como durante decénios aconteceu, se pode associar democracia com república nem monarquia com ditadura. Há repúblicas que não são democráticas – e tivemos um triste e sombrio exemplo com os 48 anos da ditadura do Estado Novo; e há monarquias que são democracias exemplares, como acontece com alguns dos mais avançados e civilizados países europeus. Mas não é a questão do regime o que neste livro mais me interessa. Claro que o livro não é isento e o autor, como é natural, toma partido pela monarquia, o que não é o meu caso, nem mesmo depois de o ter lido. Mas há aspectos interessantes que cumpre destacar. A forma como o Estado Novo apagou a memória da monarquia constitucional, deformando a sua história, como, aliás, haveria de fazer com a I República, no intuito de justificar a ditadura, atribuindo ao parlamentarismo e às liberdades públicas a origem dos males do país. O talento com que o autor nos revela a história quase desconhecida das divergências e convergências entre tradicionalistas e liberais, a clivagem entre a facção constitucional e a facção miguelista que, segundo o autor, determinou muitos dos desentendimentos no período posterior à proclamação da República. E a relação ambígua que Salazar manteve com os monárquicos, o que levou Amaro Monteiro a escrever: “Não havia um lugar-tenente do Rei junto dos monárquicos e do poder constituído. Havia, sim, um lugar-tenente de Salazar junto do Rei e dos monárquicos.” Muitos destes deixaram-se atrair pelo autoritarismo e, como realça Castro Henriques, desse modo confundiram a ideia monárquica com o próprio Estado Novo. Outros houve, como o próprio Paiva Couceiro, Almeida Braga, Alberto Monsaraz, Rolão Preto, Vieira de Almeida e Pequito Rebelo, que viriam a distanciar-se do salazarismo e, mais tarde, com Gonçalo Ribeiro Teles, Francisco Sousa Tavares, Barrilaro Ruas e outros mais jovens, como Joaquim Ferreira do Amaral e Luís Filipe Coimbra, a participar activamente na oposição democrática, quer na campanha presidencial de Humberto Delgado, quer nas eleições de 1969, já com Marcelo Caetano no poder. Deve-se a Barrilaro Ruas o facto de o último Congresso de Aveiro ter mudado a designação de Republicano para Democrático como condição para nele participarem os monárquicos. Sublinhe-se ainda a demarcação que D. Duarte fez relativamente à tendência autoritária: “Penso que o conceito de monarquia tem de se separar hoje radicalmente do integralismo com tudo o que respeita ao Estado autoritário. A monarquia ou é democrática ou não é.” D. Duarte lembra que nos anos sessenta assistiu a algumas reuniões de seu pai, o qual sabia que a Pide vigiava S. Marcos, em casa de sua tia Filipa, com opositores do regime, como António Sérgio e Raul Rego. Diga-se de passagem que não conheci ninguém mais republicano que Raul Rego. Há também o episódio trágico-cómico da chamada revolta da Sé em 1959, na qual participaram monárquicos e católicos progressistas, como por exemplo Manuel Serra. D. Duarte Nuno deu a Rolão Preto, Sousa Tavares e Amaro Monteiro instruções para redigirem uma Proclamação, mas teve a ingenuidade de confiar na lealdade do seu lugar-tenente, General Bénard Guedes, que foi informar Salazar. E assim se gorou mais uma tentativa de derrubar o regime. Castro Henriques traça o percurso de D. Duarte, desde a infância até à sua passagem pelo Colégio das Caldinhas e, mais tarde, o Colégio Militar. Da sua educação dirá D. Duarte: “ Os principais factores foram o profundo portuguesismo e o bom senso de meus pais.” E algo que por experiência própria também sei: “Note que os portugueses da emigração são geralmente os mais patriotas.” Visita África, uma das suas paixões. E com 22 anos, inicia o serviço nas Forças Armadas, sendo mobilizado para Angola, onde chega em 1968, seis anos depois de mim. A sua visão dos problemas ultramarinos nem sempre coincide com a posição oficial do regime. Compreende que o centralismo da metrópole está na origem dos movimentos de independência. Propõe uma maior participação dos africanos na vida pública e uma evolução para uma federação lusófona. É mais ou menos a tese que mais tarde será defendida por Spínola em “Portugal e o futuro.” As suas posições, ainda que longe de serem radicais, tornam-se incómodas e D. Duarte, por razões não de todo esclarecidas, é obrigado a regressara Lisboa por ordem expressa de Marcelo Caetano. Não vou substituir-me ao autor e contar a história toda. Trata-se de uma biografia feita com rigor e bom gosto, que nos revela um D. Duarte talvez por vezes inesperado e desconhecido, com um inegável sentido de missão e um espírito de dedicação ao seu país, gostando de viajar e conhecer as diversas partes do mundo por onde os portugueses passaram. Sobre o problema da restauração ou não da monarquia durante o Estado Novo, o autor faz uma síntese curiosa sobre as ilusões de muitos monárquicos e até de alguns republicanos: “Os republicanos ficavam com uma república … mas sem a democracia; os integralistas ficavam com um Estado autoritário … mas sem a monarquia.” Eu não sabia, mas fiquei agora a saber, que, encontrando-se de passagem em Saigão, nas vésperas do 25 de Abril, ao tomar conhecimento da revolução, D. Duarte escreveu um documento em que manifestou o seu inteiro apoio ao Movimento das Forças Armadas e à Junta de Salvação Nacional, assim como a sua adesão ao programa para a instauração da democracia. Segundo Mendo Castro Henriques, este documento marca o programa da geração que trouxe a monarquia para a democracia. Voltemos, no entanto, aos grandes temas da cidadania, que são os mais actuais e porventura os mais surpreendentes deste livro. Ora vejamos: “A degradação da soberania do Estado «na ordem internacional» resulta da falta de controle sobre os mercados financeiros. À sombra das ideias de «paz pelo comércio» surgem os predadores que não pertencem a qualquer escola de pensamento, não têm uma aventura colectiva, nem possuem um horizonte histórico, não são de direita nem de esquerda, nem do norte nem do sul. A sua única motivação é o dinheiro.” Esta prosa não é minha, nem de nenhuma conhecida figura da extrema-esquerda. É de Mendo Castro Henriques, que acrescenta: “D. Duarte não é um plutocrata.” E mais adiante: “Os representantes dos Estados exercem cada vez menos poder. Entre os governos do G-8 e o resto há um abismo. Os primeiros impõem decisões. Os outros acatam-nas. E dentro do G-8 há um abismo entre o EUA e os «sete anões», porque os EUA dispõem de indiscutível supremacia militar.” Esta prosa continua a ser a de Castro Henriques e por aqui se vê como, nesta hora de globalização desregulada, as pessoas podem convergir nas mesmas preocupações, independentemente da forma de regime que defendem. E o que diz D. Duarte? Ouçamos: “Numa sociedade onde se enfrentam os interesses de grupos sociais distintos, creio que o Estado democrático deve tentar tornar a convivência mais justa, mais solidária e mais livre, através da fiscalidade, da segurança social, dos serviços públicos. E as pessoas têm lealdade para com o seu Estado na medida em que dele extraem os benefícios que lhes foram prometidos pelo contrato social.” Outros temas, caros a D. Duarte, são os que também me preocupam e devem preocupar qualquer cidadão interessado em renovar a democracia e contribuir para uma sociedade mais justa e solidária. As liberdades nacionais, o ordenamento do território, o ambiente, o património e o ensino da História, as energias alternativas, a justiça social, a desertificação, a promoção da língua portuguesa e o interesse pela lusofonia, o apoio às comunidades portuguesas, a imigração, a necessidade de programas para grupos culturais específicos como os ciganos, a urgência de ajudar os mais pobres e melhorar as suas condições de vida – eis temas recorrentes nas mensagens, na acção e nas intervenções de D. Duarte. O ordenamento é um instrumento da identidade cultural dos povos e da independência política dos Estados. Por isso concordo com D. Duarte quando critica “o desequilíbrio ecológico, a degradação social, a decadência estética, a saturação demográfica das metrópoles e dormitórios, o despovoamento dos campos e das serras.” E também quando afirma: “A destruição da memória e das culturas e a desertificação não podem ser travadas por visões sectoriais e economicistas do desenvolvimento regional, porque desconhecem a essência dos diferentes elementos vivos constituintes do território, a complexidade do seu relacionamento, a evolução das suas formas e o funcionamento dos sistemas ecológicos em que se integram.” Concordo ainda quando diz que é “indispensável encontrar novos modelos de desenvolvimento que diminuam as assimetrias, porque não é sustentável tantos milhões de pessoas viverem em escandalosas pobreza ou sob desesperante opressão.” Estes temas e estas reflexões fazem parte da cidadania moderna, dum renovado conceito de patriotismo e de uma comum preocupação cívica de todos os que não se resignam à injustiça, à desertificação, à destruição do território, à decadência das cidades e à dissolução nacional. Há neste livro uma frase muito bonita e que tenho pena de não ter escrito: “Numa antiga Nação como Portugal, mesmo o mais pobre de entre nós nasce rico – de uma língua, de uma História, de uma cultura. ”Não escrevi a frase, que é de D. Duarte, mas durante a campanha para as eleições presidenciais não me cansei de repetir que, entre os países do mesmo peso demográfico, Portugal é o único que pode ser no mundo um actor global. Precisamente pela História, pela cultura e pelo nosso bem mais precioso – a grande língua portuguesa. E por isso também salientei que devemos estar na Europa com um olhar português, que é um olhar de abertura ao mundo e de valorização da comunidade dos povos de língua portuguesa, a qual, em meu entender, deverá vir a ter também uma componente militar para que possa adquirir no mundo um outro peso e um outro significado. Sei que D. Duarte se inquieta com alguns riscos decorrentes da nossa integração na União Europeia. Gostaria de deixar claro que, em meu entender, não temos outro caminho senão o de nos mantermos no centro das decisões. E aí, sem arrogância nem subserviência, lutarmos contra o défice democrático e social, por uma maior responsabilização dos parlamentos nacionais e por uma maior coordenação das políticas económicas, tendo em vista a coesão e solidariedade, objectivos essenciais do projecto europeu. Devíamos também pugnar por uma revisão dos critérios de Maastricht, que nos retiram a possibilidade de, através do investimento público, o Estado intervir para diminuir assimetrias e desigualdades e nos obrigam, para reduzir o défice orçamental, a tomar medidas que não permitem resolver o outro défice, o défice social. Finalmente, a questão da globalização. Com as navegações, Portugal aproximou povos e continentes e esteve na origem da primeira mundialização. Através do “ver claramente visto” e de uma nova consciência experimental, os navegadores portugueses fizeram então uma revolução cultural e científica que abriu as portas ao renascimento europeu. De certo modo, quando as naus portuguesas sulcavam os mares desconhecidos, nós fomos Europa antes de a Europa o ser. “Não há que discutir as navegações, dizia António Sérgio, elas foram inevitáveis”. Tal como é hoje a globalização. O problema é que esta foi apropriada, em benefício próprio, pelos sectores financeiros mais poderosos. E estes, sim, é que fazem que um fenómeno que devia ser uma fonte de enriquecimento e conhecimento, esteja desregulado e a provocar novas exclusões, desigualdades e desequilíbrios. O nosso caminho deve ser o de nos defendermos dos riscos de dissolução nacional perante os interesses financeiros e, por outro lado, o de tornarmos Portugal um país mais competitivo, o que passa pela qualificação das pessoas, pela educação, pela cidadania e, como queria António Sérgio, pela reforma das mentalidades. E passa também pela afirmação dos nossos valores. Como se diz neste livro – “Se nós desprezamos o nosso passado e a nossa identidade cultural, estamos a desprezar-nos a nós próprios.” Afirmar os nossos valores é afirmar a abertura aos outros, a tradição universalista, o anti-racismo, a língua e aquela “lusitana antiga liberdade” de que falava Camões. Os que fizeram Portugal através dos séculos não andaram a realizar inquéritos para saber quem queria ou não queria ser português. É esse o espírito de que de novo precisamos para erguer Portugal acima dos interesses financeiros e obscuros, contra a abdicação e o novoriquismo, contra o conformismo, contra a corrupção, contra o egoísmo e o poder do dinheiro. Para fazer de Portugal, como se diz no Preâmbulo da Constituição, “um país mais livre, mais justo e mais fraterno”, é preciso preservar o nosso património comum, renovar a cidadania e afirmar sem complexos o orgulho de ser português. É por isso que eu, que sou republicano, partilho muitas das preocupações expressas por um autor monárquico e também de valores defendidos por D. Duarte. É que essas preocupações e esses valores estão para alem do ser monárquico ou republicano. São de todos os portugueses que não precisam de encomendar sondagens para saber que querem continuar a ser portugueses e a fazer de Portugal hoje, tal como no passado, uma Nação de vanguarda, uma Nação Piloto. Porque, como escreveu Fernando Pessoa – “A Europa jaz, posta nos cotovelos.(…) Mas o rosto com que fita é Portugal.”

Manuel Alegre
 
 
 

Tuesday, 17 September 2013

DA OPUS DEI À MAÇONARIA

 
 
Da Opus Dei à maçonaria: a incrível história do BCP

Miguel Sousa Tavares

Em países onde o capitalismo, as leis da concorrência e a seriedade do negócio bancário são levados a sério, a inacreditável história do BCP já teria levado a prisões e a um escândalo público de todo o tamanho. Em Portugal, como tudo vai acabar sem responsáveis e sem responsabilidades, convém recordar os principais momentos deste "case study", para que ao menos a falta de vergonha não passe impune.
 
1 Até ao 25 de Abril, o negócio bancário em Portugal obedecia a regras simples: cada grande família, intimamente ligada ao regime, tinha o seu banco. Os bancos tinham um só dono ou uma só família como dono e sustentavam os demais negócios do respectivo grupo. Com o 25 de Abril e a nacionalização sumária de toda a banca, entrámos num período 'revolucionário' em que "a banca ao serviço do povo" se traduzia, aos olhos do povo, por uns camaradas mal vestidos e mal encarados que nos atendiam aos balcões como se nos estivessem a fazer um grande favor. Jardim Gonçalves veio revolucionar isso, com a criação do BCP e, mais tarde, da Nova Rede, onde as pessoas passaram a ser tratadas como clientes e recebidas por profissionais do ofício. Mas, mais: ele conseguiu criar um banco através de um MBO informal que, na prática, assentava na ideia de valorizar a competência sobre o capital. O BCP reuniu uma série de accionistas fundadores, mas quem de facto mandava eram os administradores - que não tinham capital, mas tinham "know-how". Todos os fundadores aceitaram o contrato proposto pelo "engenheiro" - à excepção de Américo Amorim, que tratou de sair, com grandes lucros, assim que achou que os gestores não respeitavam o estatuto a que se achava com direito (e dinheiro).
 
2 Com essa imagem, aliás merecida, de profissionalismo e competência, o BCP foi crescendo, crescendo, até se tornar o maior banco privado português, apenas atrás do único banco público, a Caixa Geral de Depósitos. E, de cada vez que crescia, era necessário um aumento de capital. E, em cada aumento de capital, era necessário evitar que algum accionista individual ganhasse tanta dimensão que pudesse passar a interferir na gestão do banco. Para tal, o BCP começou a fazer coisas pouco recomendáveis: aos pequenos depositantes, que lhe tinham confiado as suas poupanças para gestão, o BCP tratava de lhes comprar, sem os consultar, acções do próprio banco nos aumentos de capital, deixando-os depois desamparados perante as perdas em bolsa; aos grandes depositantes e amigos dos gestores, abria-lhes créditos de milhões em "off-shores" para comprarem acções do banco, cobrindo-lhes, em caso de necessidade, os prejuízos do investimento. Desta forma exemplar, o banco financiou o seu crescimento com o pêlo do próprio cão - aliás, com o dinheiro dos depositantes - e subtraiu ao Estado uma fortuna em lucros não declarados para impostos. Ano após ano, também o próprio BCP declarava lucros astronómicos, pelos quais pagava menos de impostos do que os porteiros do banco pagavam de IRS em percentagem. E, enquanto isso, aqueles que lhe tinham confiado as suas pequenas ou médias poupanças viam-nas sistematicamente estagnadas ou até diminuídas e, de seis em seis meses, recebiam uma carta-circular do engenheiro a explicar que os mercados estavam muito mal.
 
3 Depois, e seguindo a velha profecia marxista, o BCP quis crescer ainda mais e engolir o BPI. Não conseguiu, mas, no processo, o engenheiro trucidou o sucessor que ele próprio havia escolhido, mostrando que a tímida "renovação" anunciada não passava de uma farsa. E descobriu-se ainda uma outra coisa extraordinária e que se diria impossível: que o BCP e o BPI tinham participações cruzadas, ao ponto de hoje o BPI deter 8% do capital do BCP e, como maior accionista individual, ter-se tornado determinante no processo de escolha da nova administração... do concorrente! Como se fosse a coisa mais natural do mundo, o presidente do BPI dá uma conferência de imprensa a explicar quem deve integrar a nova administração do banco que o quis opar e com o qual é suposto concorrer no mercado, todos os dias...
 
4 Instalada entretanto a guerra interna, entra em cena o notável comendador Berardo - o homem que mais riqueza acumula e menos produz no país - protegido de Sócrates, que lhe deu um museu do Estado para ele armazenar a sua colecção de arte privada. Mas, verdade se diga, as brasas espalhadas por Berardo tiveram o mérito de revelar segredos ocultos e inconfessáveis daquela casa. E assim ficámos a saber que o filho do engenheiro fora financiado em milhões para um negócio de vão de escada, e perdoado em milhões quando o negócio inevitavelmente foi por água abaixo. E que havia também amigos do engenheiro e da administração, gente que se prestara ao esquema das "off-shores", que igualmente viam os seus créditos malparados serem perdoados e esquecidos por acto de favor pessoal.
 
5 E foi quando, lá do fundo do sono dos justos onde dormia tranquilo, acorda inesperadamente o governador do Banco de Portugal e resolve dizer que já bastava: aquela gente não podia continuar a dirigir o banco, sob pena de acontecer alguma coisa de mais grave - como, por exemplo, a própria falência, a prazo.
 
6 Reúnem-se, então, as seguintes personalidades de eleição: o comendador Berardo, o presidente de uma empresa pública com participação no BCP e ele próprio ex-ministro de um governo PSD e da confiança pessoal de Sócrates, mais, ao que consta, alguém em representação do doutor "honoris causa" Stanley Ho - a quem tantos socialistas tanto devem e vice-versa. E, entre todos, congeminam um "take over" sobre a administração do BCP, com o "agréement" do dr. Fernando Ulrich, do BPI. E olhando para o panorama perturbante a que se tinha chegado, a juntar ao súbito despertar do dr. Vítor Constâncio, acharam todos avisado entregar o BCP ao PS. Para que não restassem dúvidas das suas boas intenções, até concordaram em que a vice-presidência fosse entregue ao sr. Armando Vara (que também usa 'dr.') - esse expoente político e bancário que o país inteiro conhece e respeita.
 
7 E eis como um banco, que era tão independente que fazia tremer os governos, desagua nos braços cândidos de um partido político - e logo o do Governo. E eis como um banco, que era tão cristão, tão "opus dei", tão boas famílias, acaba na esfera dessa curiosa seita do avental, a que chamam maçonaria.
 
8 E, revelada a trama em todo o seu esplendor, que faz o líder da oposição? Pede em troca, para o seu partido, a Caixa Geral de Depósitos, o banco público. Pede e vai receber, porque há 'matérias de regime' que mesmo um governo com maioria absoluta no parlamento não se atreve a pôr em causa. Um governo inteligente, em Portugal, sabe que nunca pode abocanhar o bolo todo. Sob pena de os escândalos começarem a rolar na praça pública, não pode haver durante muito tempo um pequeno exército de desempregados da Grande Família do Bloco Central.
 
Se alguém me tivesse contado esta história, eu não teria acreditado. Mas vemos, ouvimos e lemos. E foi tal e qual.

ANTÓNIO SARAIVA LIDERA LOJA MAÇÓNICA


António Saraiva, da CIP, lidera nova loja, criada com i'rmãos' que saíram da Mozart. Silva Carvalho já regressou às sessões maçónicas.

Chama-se Loja George Washington e surge, no seio da maçonaria, como a substituta e sucessora da polémica Loja Mozart 49 – que chegou a ser das mais influentes lojas maçónicas do pais e que integrava, entre outros, elementos dos serviços secretos, do grupo Ongoing e da política.
Esta nova loja foi criada na terça-feira e tem como venerável (líder) António Saraiva, presidente da CIP - Confederação Empresarial de Portugal, que integrava a Mozart.
 
«Fez-se finalmente a consagração da nova loja», explicou ao SOL fonte da Grande Loja Legal de Portugal (GLLP), obediência dos maçons regulares e que integra estas duas lojas. A consagração realizou-se na nova sede da GLLP, em Telheiras.
 
Desde que veio a público o escândalo sobre uma teia de ligações perigosas na Mozart – entre os serviços secretos, a Ongoing, e políticos, nomeadamente do PSD – que a direcção da GLLP planeava criar uma nova loja para esvaziar a outra. Aliás, numa carta enviada no ano passado a todos os maçons, o grão-mestre, José Moreno, convidou alguns «irmãos» da Loja Mozart a sair, apelando ao seu «bom senso» para que tomassem a melhor decisão que protegesse o bom nome da maçonaria.
 
«Entretanto, muitos afastaram-se ou saíram da Mozart para outras lojas, nomeadamente para a Brasília e a Abade Correia. Só alguns ficaram», nota a mesma fonte, sublinhando que agora, com a criação da George Washington e o esvaziamento da Mozart, podem estar criadas as condições para que a «GLLP possa abater colunas» a esta última (termo maçónico que significa encerrar a loja).
 
Para a Loja George Washington, refere a mesma fonte, não transitaram elementos da Ongoing nem dos serviços secretos, mas sim diplomatas, empresários e pessoas com ligações à política: «Será poderosa, uma vez que o venerável é um homem com poder». Além disso, serão deslocados irmãos de outras lojas e recrutados novos membros. Entre os ‘irmãos’ que mudaram da Mozart, estará Nuno Manalvo, ex-chefe de gabinete de Isaltino Morais.
 
Silva Carvalho de regresso
 
No entanto, um maçon que pertence à Mozart garantiu ao SOL que esta loja ainda «está bem activa», tendo 17 dos 42 membros que existiam quando há um ano rebentou a polémica. Mas outra fonte garante que há o risco da «Mozart ficar sem quorum» para reunir.
 
Um dos elementos activos na Mozart será Jorge Silva Carvalho. Segundo um ‘irmão’, o antigo director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) – que se afastou depois de ser acusado de usar a Mozart para um projecto de ambição pessoal – já terá regressado à maçonaria, tendo participado em cinco sessões maçónicas. Neste momento, o venerável da Mozart é Rogério Tavares, um advogado, e Silva Carvalho ocupará a função de guarda interno.
 
Na Mozart, permanecem o coronel Francisco Rodrigues, que foi director de um departamento das ‘secretas’, e Neto da Silva, ex-deputado do PSD. E em Novembro passado entrou Alcides Guimarães, ex-candidato a grão-mestre. Já o líder da Ongoing, Nuno Vasconcelos, não tem aparecido nas sessões maçónica, vivendo actualmente a maior parte do tempo no Brasil.
 
Longe das sessões maçónicas da Mozart estão os políticos que viram os seus nomes envolvidos na polémica – como o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, e Paulo Miguel Santos, deputado do mesmo partido.
 

Sunday, 15 September 2013

AS GRANDES FAMÍLIAS QUE DOMINAM O MUNDO

Algumas pessoas começaram a perceber que existem grandes grupos financeiros que dominam o mundo. Esqueçam as intrigas políticas, conflitos, revoluções e guerras. Nada é ao acaso. Tudo foi planeado há muito tempo.
 
 Alguns apelidam-no de “teorias da conspiração” ou Nova Ordem Mundial. De qualquer forma, a chave para compreender os actuais eventos políticos e económicos é um núcleo restrito de famílias que acumularam uma incrível riqueza e poder.

Estamos a falar de 6, 8 ou talvez 12 famílias que realmente dominam o mundo. Sei que é um mistério difícil de desvendar. Nós não estaremos longe da verdade citando Goldman Sachs, Rockefellers, Loebs Kuh e Lehman em Nova York, os Rothschilds de Paris e Londres, o Warburgs de Hamburgo, Paris e Lazards Brothers de Paris e Israel Moses Seifs de Roma.
 
 Muitas pessoas já ouviram falar do Grupo Bilderberg, os Illuminati ou a Comissão Trilateral. Mas quais são os nomes das famílias que dirigem o mundo e têm controlo de estados e organizações internacionais como a ONU, a NATO ou o FMI?
 
Para tentar responder a esta pergunta, podemos começar com o mais fácil: o inventário do maiores bancos do mundo e ver quem são os accionistas que tomam as decisões. As maiores empresas do mundo actualmente são: Bank of America, JP Morgan, Citigroup, Wells Fargo, Goldman Sachs e Morgan Stanley.
Vamos agora analisar quem são seus accionistas:
 
 
Bank of America:
State Street Corporation, Vanguard Group, BlackRock, FMR (Fidelity), Paulson, JP Morgan, T. Rowe, Capital World Investors, AXA, Bank of NY e Mellon.
 
 
JP Morgan:
State Street Corp, Vanguard Group, FMR, BlackRock, T. Rowe, AXA, Capital Investor Mundial, Capital Research Global Investor, Northern Trust Corp e Bank of Mellon.
 
 
Citigroup:
State Street Corporation, Vanguard Group, BlackRock, Paulson, FMR, Capital World Investor, JP Morgan, Northern Trust Corporation, Fairhome Capital Mgmt e Bank of NY Mellon.
 
 
Wells Fargo:
Berkshire Hathaway, FMR, State Street, Vanguard Group, Capital World Investors, BlackRock, Wellington Mgmt, AXA, T. Rowe e Davis Selected Advisers.
Podemos agora constatar o que parece ser um núcleo presente em todos os bancos: State Street Corporation, Vanguard Group, BlackRock e FMR (Fidelity). Para evitar repeti-los, vamos chamá-los de “Os Quatro Grandes”.
 
 
Goldman Sachs:
Os Quatro Grandes“, Wellington, Capital Mundial Investors, AXA, Massachusetts Financial Service e T. Rowe.
 
 
Morgan Stanley:
Os Quatro Grandes“, Mitsubishi UFJ, Franklin Resources, AXA, T. Rowe, Bank of NY, Mellon e Jennison Associates.
Podemos verificar os nomes dos principais accionistas. Para ir mais longe, podemos agora tentar descobrir accionistas dessas empresas e accionistas de grandes bancos no mundo inteiro.
 
 
Bank of NY Mellon:
Davis Selected, Massachusetts Serviços Financeiros, Capital Research Global Investor, Dodge, Cox, Southeatern Activos Mgmt. e … “Os Quatro Grandes“.
 
 
State Street Corporation (um dos “Quatro Grandes“):
Massachusetts Serviços Financeiros, Capital Research Global Investor, Barrow Hanley, GE, Putnam Investimentos e … os “Quatro Grandes” (os próprios accionistas!)
 
 
BlackRock (outro dos “Quatro Grandes“):
PNC, Barclays e CIC.
Quem está por trás do PNC? FMR (Fidelity), BlackRock, State Street, etc.
E por trás da Barclays ? BlackRock.
E poderíamos continuar durante horas, passando pelos paraísos fiscais nas Ilhas Cayman, o Mónaco ou o domicílio legal das empresas Shell em Liechtenstein. Uma rede onde as empresas são sempre as mesmas, mas nunca um nome de uma família.
 
 
Em suma: as oito maiores empresas financeiras dos EUA (JP Morgan, Wells Fargo, Bank of America, Citigroup, Goldman Sachs, EUA Bancorp, Bank of New York Mellon e Morgan Stanley) são 100% controladas por dez accionistas e nós temos quatro empresas sempre presentes em todas as decisões: BlackRock, State Street, Vanguard e Fidelity.
 
 
Além disso, a Reserva Federal é composta por 12 bancos, representada por um concelho de sete pessoas, que é composto por representantes dos “Quatro Grandes“, que por sua vez, estão presentes em todas as outras entidades.
 
 
Sucintamente, a Reserva Federal é controlada por quatro grandes empresas privadas: BlackRock, State Street, Vanguard e Fidelity. Essas empresas controlam a política monetária dos EUA (e no mundo) sem qualquer regulamentação ou escolha “democrática”. Essas empresas lançaram e participaram na crise mundial económica actual e conseguiram assim tornar-se ainda mais ricas e poderosas.
 
 
Para terminar, uma olhada nalgumas das empresas controladas por este grupo dos “Quatro Grandes” :
Alcoa Inc.
Altria Group Inc.
American International Group Inc.
AT&T Inc.
Boeing Co.
Caterpillar Inc.
Coca-Cola Co.
DuPont & Co.
Exxon Mobil Corp.
General Electric Co.
General Motors Corporation
Hewlett-Packard Co.
Home Depot Inc.
Honeywell International Inc.
Intel Corp.
International Business Machines Corp
Johnson & Johnson
JP Morgan Chase & Co.
McDonald’s Corp.
Merck & Co. Inc.
Microsoft Corp.
3M Co.
Pfizer Inc.
Procter & Gamble Co.
United Technologies Corp.
Verizon Communications Inc.
Wal-Mart Stores Inc.
Time Warner
Walt Disney
Viacom
Rupert Murdoch’s News Corporation.,
CBS Corporation
NBC Universal
Os mesmos “Quatro Grandes” controlam a grande maioria das empresas europeias contidas na bolsa de valores.
Além disso, todas essas pessoas dirigem as grandes instituições financeiras, como o FMI, o Banco Central Europeu ou o Banco Mundial, e foram “treinados” e permanecem “empregados” dos “Quatro Grandes” para os quais foram formados.
Os nomes das famílias que controlam os “Quatro Grandes” nunca aparecem.
 
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Thursday, 12 September 2013

Wednesday, 4 September 2013

NOVO ARRANHA-CÉUS LONDRINO DERRETE CARROS


Os responsáveis por um arranha-céus que está a ser construído em Londres estão a braços com um imprevisto insólito: Várias viaturas estacionadas perto do edifício estão a derreter devido ao intenso reflexo da luz do sol. Três parques de estacionamento nas imediações já foram encerrados enquanto decorre a investigação.
 
O director de uma empresa, Martin Lindsay, contou que uma parte do seu Jaguar XJ ficou danificada enquanto esteve estacionado na quinta-feira junto ao arranha-céus, situado no número 20 da Fenchurch Street.
 
«Eles vão ter que pensar nalguma solução. Estou parvo. Como podem deixar isto continuar?», comentou.
 
Também na semana passada, uma carrinha que ficou estacionada no local sofreu danos no exterior. Vários objectos derreteram dentro da viatura. Os responsáveis pelo edifício, a Land Securities e a Canary Wharf, confirmaram que estão a investigar as acusações. «Estamos a par das preocupações sobre o 20 Fenchurch Street e estamos a investigar a matéria», referiram.
 
«Como medida de precaução, a cidade [o poder local] já decidiu encerrar três parques de estacionamento na área que podem ser afectados enquanto realizamos a investigação».
 
O arranha-céus de 37 andares é composto por zonas de escritórios e áreas de retalho, com um jardim no topo que será aberto ao público. A construção arrancou oficialmente em 2011 e deverá ser concluída em Maio de 2014.
 

Monday, 2 September 2013

ENTREVISTA A JOÃO RIBEIRO DA FONSECA

 
 
 
João Ribeiro da Fonseca: "Só fomos grandes quando houve alguém a mandar"
 
O ex-presidente da Portugália diz que Sérgio Monteiro é um self apointed expert em transportes e falha no sector aéreo.
 
Saiu de Portugal em 1975, dois dias depois das nacionalizações, era então director do Banco Pinto & Sotto Mayor. Esteve quinze anos fora, primeiro nos Estados Unidos, depois na Europa, onze anos dos quais em Londres. Foi aí, com um grupo de mais cinco pessoas, que fundou a empresa que inventou e desenvolveu o sistema Visa internacional, um conceito revolucionário para a altura. Ex-aluno do Colégio Militar, esteve 16 anos à frente da Portugália e mantém-se ligado ao sector através da Associação Portuguesa de Transporte e Trabalho Aéreo (APTTA) e do aeródromo de Cascais, concelho onde é membro da Assembleia Municipal pelo CDS. Falámos sobre a terra e sobre o mar e sobre a sociedade "que nos deixámos ser".
 
A última vez que falámos era presidente da Portugália...
 
Tive muita sorte na vida e tive a preocupação de me preparar sempre para os degraus do futuro, fossem eles a subir ou a descer. As pessoas, especialmente hoje, acham que os degraus são só a subir e não são. Tive vários capítulos em que cheguei ao topo, sempre mais ou menos preparado para começar a descida. Hoje estou aqui com serenidade, mas vejo amigos meus, até mais novos, zangados porque deixaram de ter palco, de estar na ribalta.
 
Imaginava, há quinze ou vinte anos, que Portugal ia estar onde está hoje?
 
A situação do país tem a ver com muita coisa, mas também com o que acabei de dizer. As sociedades formam-se sustentadas em instituições ou corporações, chame-lhes o que quiser, pilares sobre os quais se vão estruturando. A globalização, no sentido da massificação do acesso ao progresso, rebentou com as instituições. A administração pública, as Forças Armadas, a justiça foram deixando de ter capacidade de resposta.
 
Como olha para as Forças Armadas?
 
As Forças Armadas não souberam evoluir e chegaram onde estão: disparatadas, derrotadas e desrespeitadas pelo poder político. Quando acabou o Império, os militares deviam ter sido os primeiros a reequacionar o papel das Forças Armadas, mas não, continuou tudo a discutir capelinhas, a Marinha, a Força Aérea, o Exército? A história típica é a dos três hospitais, andaram 30 anos a discutir quem é que fica com o quê, quando é evidente que se de 150 mil militares passámos a ter 30 mil ou nem isso, um hospital é suficiente. Foi preciso vir um político para dizer "alto e pára o baile". Os militares ficaram zangados porque ninguém os consultou. Mas sobre o quê, se nunca antes resolveram o assunto?! É só um exemplo...
 
O país habituou-se a ser mandado, não sabe fazer mudanças na serenidade?
 
Isso leva-nos a outra sala, que é a de saber história, hoje muito desprezada. A começar pelos políticos, que não sabem história e não querem saber, porque a história deles dura quatro anos, só lhes interessa saber como se chega lá a cima e, uma vez lá, o que fazer para se manter. Se olharmos para a história chegamos a uma conclusão assustadora.
 
Qual?
 
É muito arriscado dizê-lo em público, mas só fomos grandes quando houve alguém a mandar. Afonso Henriques, depois D. João, o primeiro e o segundo, a Independência e os Descobrimentos, Marquês de Pombal e, depois, Salazar. Não interessa agora se Salazar era um malandro ou se o Marquês de Pombal matou à paulada, o que conta é o que ficou.
 
Esta geração foi educada pela sua geração. O que falhou?
 
Não gostaria de entrar muito neste campo... Considero que a minha geração, a que fez o 25 de Abril, é que perdeu. Deixou fazer uma descolonização feíssima porque não houve líderes à altura. Fui capitão miliciano em Angola entre 77 e 79 e sei muito bem que a maioria de nós esteve lá e lutou para que os territórios fossem independentes dentro de um processo civilizado e não de uma forma que considero criminosa. Eu quis fazer o 25 de Abril, era um esquerdista perigoso da minha geração... Depois percebi que não era isto que queria.
 
A história uniu Portugal a muitos povos, mas também nos isolou. Hoje sabemos gerir a nossa geografia?
 
Pessimamente. Mas acredito que no futuro vão ser esses povos que nos vão reconstruir. A língua e a cultura são conhecimento e, embora a descolonização tenha sido injusta até para esses povos, ficaram raízes. Em países como Cabo Verde não há raivas como em Angola e Moçambique. Mas esses recalcamentos vão morrer na segunda geração e o que fica é a língua, a cultura, o Sporting, o Benfica, as escolas.
 
Não estamos a tirar partido da história?
 
Os nossos políticos têm sido péssimos e tontos neste aspecto. Hoje, em Macau, ensina-se mais português do que no meu tempo. Os chineses agarraram naquilo e perceberam que a lusofonia é uma porta para uma quantidade de coisas. Nós nunca percebemos isso. Na Índia, em Goa, querem estudar português. Fui educado no Colégio Militar e sou, como todos somos, anárquico - tenho de fazer esta declaração de interesses. A associação de ex-alunos, de que faço parte, fez um documento onde redefinia a missão do colégio, que seria a lusofonia, ir buscar miúdos a Angola, a Moçambique, a Cabo Verde, etc. Educar aqui para criar uma diáspora.
 
Qual foi o resultado?
 
O senhor ministro da Defesa fez um despacho e vai pôr as meninas de Odivelas no Colégio Militar. Ou seja, o Colégio Militar vai acabar daqui a um ou dois anos. Limitaram-se a juntar dois em um e a esperar alguma economia, uma coisa absolutamente primária. Este ministro da Defesa portou-se pessimamente. Há dois anos, quando foi nomeado, fez um discurso extraordinário exaltando todos os valores e currículo do colégio, a sua importância para o país. Depois, ignorou o documento estratégico que elaborámos, nunca nos recebeu ou respondeu às nossas cartas.
 
O Colégio Militar está longe de ser o que era, desceu muito no ranking nacional, os valores desapareceram...
 
Talvez essa seja uma razão por que o Colégio Militar foi mal amado desde o pós 25 de Abril e a esquerda, a começar pelo PS, tentou acabar com ele. No ano em que eu entrei, entre filhos de civis e militares, eram 350 candidatos para 80 vagas. Tínhamos dez anos e os exames demoravam dois dias inteiros, havia um escrutínio apertado, o currículo do colégio, intelectual e físico, era exigente. Mas ninguém quis saber deste assunto.
 
Porquê?
 
Porque o Colégio Militar formava elites e a esquerda nunca percebeu a diferença entre ser uma escola de elite ou de formação de elites, que foi o que o colégio fez ao longo de 210 anos, é ver a lista em todos os campos, político, económico e até desportivo.
 
É a ideia de que temos de ser todos iguais?
 
É o alinhar por baixo. Para mim, este é o pecado original de esquerda: sermos todos iguais significa alinhar por baixo. A esquerda ignora o mérito, o que é estúpido, não se valoriza. Qual foi o modelo socialista que teve sucesso no mundo? Nenhum. Na minha opinião, é este o motivo. Os outros pecados, mais ou menos gordinhos, existem por todo o lado. Hoje, para ser elite é preciso trabalhar muito.
 
O que fez a associação ao longo destes anos em que o Colégio Militar foi decaindo?
 
Isso é a nossa identidade cultural, desde que não haja fogo, uma inundação ou um tremor de terra, a coisa está ali, não está? Não fazemos nada, deixamos andar. Discute-se, chamam-se nomes ao árbitro, culpa-se o treinador e vai andando.
 
Concorda com o serviço militar obrigatório?
 
Sim. Foi uma estupidez acabar com ele, tanto pela parte da formação e da disciplina, como de veículo promotor do de-senvolvimento tecnológico. Vamos precisar imenso, o nosso futuro é o mar, aliás, como o nosso passado, foi aí que nos encontrámos. Porque a Europa é bater no muro, depois da Espanha são os Pirenéus... Uma coisa que Paulo Portas fez muito bem e que foi muito atacada na altura, foi cartografar o nosso espaço marítimo. Mas à custa desse esforço somos o maior país da Europa e a riqueza que está no fundo e à superfície da água é do que vamos viver. O nosso petróleo é o mar. Isto significa que há muito a fazer e, num primeiro tempo, não vai ser tudo feito pela iniciativa privada, porque ainda estamos numa fase muito genérica. Ora aqui está uma missão para as Forças Armadas, do mar e do ar. Mas temos os binóculos ao contrário...
 
Acredita que as corporações devem ser tratadas de forma diferente?
 
Este é um conceito do Estado Novo que ficou muito mal visto. Mas funcionava.
 
Houve excessos?
 
Houve e há. Olhe para os médicos? Os pilotos, os camionistas, os maquinistas, os estivadores, toda a gente que tem capacidade para boicotar a economia constituiu-se em corporação, mas não se faz legislação que evite as consequências disso em nome da liberdade. Em minha casa havia uma cultura muito à esquerda - a grande inspiração era viver em liberdade -, mas há uma coisa de que nos esquecemos todos, é que a liberdade sem responsabilidade mata, é a vitória dos bandidos. E em nome da liberdade, temos uma Constituição que só fala em direitos, liberdades e garantias, tudo aquilo que, à solta, mata uma sociedade, ganham os mais fortes. Cada núcleo organiza-se em defesa dos seus interesses.
 
Como é que isso se altera?
 
É preciso fazer uma ruptura. Foi preciso fazer rupturas para acabar com o Estado Novo, é preciso fazer rupturas agora. Hoje, na Europa, já não se fazem golpes de Estado e se isso acontecesse seria considerado banditismo. Portanto, a ruptura tem de ser intelectual, cultural. Se a ruptura vai para a rua pode ser perigosa porque não é responsabilizada. O que é que interessa partir montras, bater nas pessoas e destruir? Não interessa a ninguém. Estou de acordo que as pessoas devem manifestar-se mas, se não são responsabilizadas por essa afirmação e a forma como a fazem, estão a derrotar- -se a elas próprias. São precisas leis, mas depois, quando se propõe isso é-se logo fascista, gente sem sensibilidade.
 
É membro da Assembleia Municipal de Cascais, como vê a lei de limitação de mandatos?
 
Isto é uma feira da ladra, só em Portugal. É surrealismo político. Quer dizer, os políticos fazem uma lei e depois dizem que não sabem interpretá-la, ela sobe ao tribunal e ninguém diz "o rei vai nu"? Eu quero crer que só acontece em Portugal... Mas pronto, é a nossa característica, a nossa graça.
 
O choque cultural de que fala resume-se a Portugal?
 
Estamos a viver um choque cultural na Europa, o mundo ocidental sempre foi colonizador, sobranceiro, e a outra rapaziada progredia ao som da nossa partitura. Acontece que não há nada pior na guerra que o excesso de confiança, quando pensamos que o inimigo é uma cambada de patetas é quando levamos uma fogachada. Quando se negociou a livre circulação de bens, esqueceram-se que as regras tinham de ser iguais para todos. Já dizia Lenine, não tenham medo da burguesia porque eles é que nos vão abrir a porta. Estas negociações são totalmente desfavoráveis ao Estado Social, porque o terceiro mundo não sabe o que isso é e não gasta um tostão com isso. Nós gastamos perto de 50%.
 
E agora, nivelamos por baixo?
 
Estamos exactamente a nivelar por baixo. E fizemo-lo com o conhecimento dos sindicatos europeus. A deslocação industrial fez-se porque a mão-de-obra era barata, para depois produzirem para cá e rebentarem com a industria instalada. O Estado Social, viemos agora a saber, é um luxo que tem um custo e, como todos os luxos, cada um de nós tem acesso a ele de acordo com a sua capacidade económica. Não estou a dizer que temos de criar estatutos de classe de cidadania, mas é preciso encontrar uma geometria entre o que pagamos de imposto e o que podemos lá ir buscar.
 
Já batemos no fundo?
 
Reconheço que este governo, sem ter tido a formação para isso, foi obrigado a desempenhar a função de bombeiro, em condições muito desfavoráveis e com um Memorando leonino contra nós. Mas este governo teve também uma péssima política de comunicação, com a ausência total de pedagogia, e foi forçado e aceitou prioridades erradas. Ao mesmo tempo, falta resolver o problema da dimensão do Estado. É preciso reduzir o Estado, que tem de ser eficiente e mínimo. Isto vai dar a última onda de desemprego, que ninguém quer assumir mas tem de ser feita.
 
Paulo Portas quis chamar a si o corte de 4,7 mil milhões na despesa do Estado...
 
Tenho grande admiração pelo Paulo e ele tem péssima imprensa. Sempre que está a subir aparece um submarino.
 
Passamos do mar para o ar...
 
Portugal não tem uma estratégia para o transporte aéreo. Mas não é este governo ou o anterior, nunca teve. Entrei para a Portugália em 1991, conheci uns sete ou oito ministros dos Transportes, nenhum resolveu o problema, mas todos disseram exactamente a mesma coisa na primeira conversa que tive com eles: a privatização da TAP é imediata. Desde Joaquim Ferreira do Amaral. A minha pergunta era sempre a mesma: já há comprador? "Não, mas depois tem de se ver com eles." E eu pensava, pois, se calhar é melhor ter de me ver com privados do que com públicos (risos). E a ANA era uma empresa majestática, que nunca prestou contas a ninguém. O Instituto Nacional de Aviação Civil tinha a responsabilidade de verificar as suas contas e a ANA tinha de justificar o custo das taxas aplicadas, mais 30% do que Espanha, o que nunca foi feito. Esta era uma guerra que todos os anos eu tinha com o INAC, que me mandava pentear macacos. A empresa cobrava taxas de acordo com os lucros que o Estado lhe pedia.
 
Onde esbarra a privatização da TAP?
 
A TAP sempre teve uma gestão politizada e/ou enfeudada a interesses políticos. Quando se negociou a venda da Portugália à Swiss Air, o Estado estava também para vender a TAP. Fernando Pinto foi a pessoa escolhida pela Swiss Air para de-senvolver a sua estratégia, mas a companhia acabou por ficar nas mãos do accionista Estado, que manteve Fernando Pinto. No entanto, sempre que este resolvia como medida de gestão fazer frente às atitudes corporativas e sindicais, na vigésima quinta hora o governo puxava-lhe o tapete. Este é o problema da TAP, a força das corporações que lá vivem.
 
Mas um accionista privado acaba com isso num instante, ou não?
 
Mas há outra questão, que é a do seu valor estratégico. A TAP só pode e só deve ser vendida a uma companhia chinesa. Quem comprar a TAP não vai aceitar um caderno de encargos que defende o hub de Lisboa, compra para fazer da companhia o que quiser.
 
E só os chineses têm essa necessidade?
 
Sim. Quem comprar a TAP tem de ter três coisas: estratégia, dinheiro e mercado. Se as companhias globais não tiverem mercado morrem, foi assim que morreu a Swiss Air, a Sabena, a KLM, a SAS e por aí fora.
 
E porque não uma norte-americana ou latino-americana?
 
A prioridade da América do Norte é a América do Sul e a Ásia. A prioridade da América do Sul é a América do Norte. Em África não há ninguém, na Europa as três grandes companhias já têm os seus hubs globais: a Lufthansa tem Frankfurt e Munique, a British Airways tem Londres e Madrid, com a Ibéria, e a Air France tem Amesterdão e Paris, com a KLM.
 
Resta a China?
 
Resta a China ou a Índia. A Índia neste momento não tem dinheiro, nem uma economia evoluída. A China tem mercado, dinheiro e estratégia. Precisa de um hub europeu, precisa de África e da América Latina. A abertura do Canal do Panamá vai permitir aos gigantes que levam 18 mil contentores atravessar o canal, ou seja, encurtar gigantescamente a distância e os custos. Portanto, eles precisam de Sines e já cá andam à volta, nós é que não avançamos. E precisam de um hub pesado no transporte aéreo.
 
Porque é que diz que o governo não tem estratégia para o sector?
 
O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, está lá há mais de dois anos, a APTTA já lhe escreveu para apresentar e discutir diversos problemas, nem sequer respondeu. É um self apointed expert de rodovias que, aparentemente, esteve envolvido no desenvolvimento rodoviário e nas PPP. Posso dizer que, para ele, aviação civil e aviação comercial em Portugal chama-se TAP, o resto não existe ou, se existe, ele não quer saber. A indústria aeronáutica em Portugal é bastante significativa, pelo número de pessoas que emprega, as actividades que desenvolve, de helicópteros, aviões, fotografia, turismo, lazer... O país precisa de pilotos, de técnicos, de mecânicos, controladores aéreos, pessoal de pista, etc., mas não há sequer uma academia de formação. Na APTTA começámos a fazer uns cursos para membros da associação, mas nem sequer conseguimos que sejam oficializados, as companhias querem expandir-se e não têm um interlocutor. Entre os nossos sócios estão a TAP, a Portugália, a EMA, agora desfeita...
 
Concorda com a dissolução da EMA?
 
Pontualmente, acontecem coisas que nos levam a perguntar em que tabuleiro se jogam. Por exemplo, porque foram comprados os helicópteros Kamov? Esta compra é muito mais difícil de explicar do que a dos submarinos. Os Kamov estão proibidos de voar na Europa e têm um enorme problema de manutenção, porque não há sobressalentes, a tecnologia é russa, não há técnicos. Temos seis, dois no chão, um a ser canibalizado para dar peças para outro. Voltando atrás, devemos ser o único país do mundo em que o Estado é dono de três companhias aéreas concorrentes entre si: a TAP, a Sata e a Sata Internacional. Isto é normal?
 
Não sei. É normal?
 
Eu se viesse negociar a compra da TAP, era a segunda pergunta que fazia: o que é que vão fazer com a Sata, vão pô-la a concorrer comigo, com os mesmo direitos de tráfego, etc.? O transporte aéreo é uma actividade do futuro. Até há dez anos éramos um país da periferia, agora, com a globalização, somos o centro do Atlântico. Depois vem o argumento sobre as companhias, a maior parte delas falida, sem dinheiro para mandar cantar um cego, da nacionalização. Não, o que é preciso é racionalizar.
 
Temos dificuldade em debater temas sem preconceitos?
 
Sabe porquê, porque há mais incompetência que corrupção em Portugal, aliás, sem incompetência era muito mais difícil a corrupção.
 
Acredita que Seguro será o próximo primeiro-ministro?
 
Espero que não. Mas estou muito descrente no nosso regime político.
 
Porquê?
 
Porque estamos a chegar ao ponto em que a massificação, enquanto não envolver a componente mérito, puxa para baixo. Ao dar a todos os cidadãos o mesmo direito de voto, introduzimos na política o marketing. Não é politicamente correcto dizer isto, mas isso não torna as coisas menos verdade. Há um ditado que diz "não vá o sapateiro além da sua chinela" e nós, na modernidade, levámos este regime às últimas consequências. A política, hoje, é marketing, não são ideias. É tudo uma fantochada. Ao fazer isto, estamos a dizer que este regime não serve e assistimos à degradação da política e dos políticos. Veio isto tudo a propósito do Seguro, e de Passos Coelho, uma pessoa de quem eu instintivamente gosto, parece-me um homem de bem, mas não está preparado, ou demonstra não ter preparação. Chegámos ao fim da linha, temos de inventar outra geometria.
 
Qual?
 
Tem de ser democracia representativa, eu acredito nos valores democráticos, não acredito é neste regime que, para mim, já lá não vai. Não produz qualidade, nega a qualidade, não permite a qualidade. Eu espero ainda estar cá para ver, gostava de participar no após...