Sunday, 22 August 2010

CALÇADO: PORTUGAL VOLTA A SER PROCURADO

Empresas

Grandes marcas de calçado trocam China por Portugal

Gigante asiático tem revelado problemas na qualidade e cumprimento de prazos

As grandes marcas internacionais estão a reforçar a produção de calçado em Portugal, em detrimento da China. Problemas de qualidade e de incumprimento dos prazos de entrega estão na base desta mudança, avança o «Jornal de Notícias».

«O que se sente é que as empresas que foram para a China estão a voltar. Há cerca de um ano começámos a sentir isso e este ano foi mais forte», adianta André Fernandes, da Fábrica de Calçado Evereste. Nesta empresa, as marcas próprias Cohibas, Evereste, Fugato e Chibs são o principal motor das vendas, mas, explica André Fernandes, «estamos a ser muito solicitados tanto em linhas desportivas como de estilo por marcas europeias para a produção de pequenas séries».

O optimismo é sentido também na Netos Fábrica de Calçado que produz sobretudo para outras marcas. «Os grandes grossistas holandeses que importavam muito da China estão a regressar, porque querem mais qualidade», refere Domingos Neto, acrescentando que o investimento em equipamentos de ponta foi essencial para dar resposta «aos grossistas que querem grandes quantidades e a outros clientes de pequenas séries».

Adidas, Nike, ARmani ou Prada são alguns exemplos

São insígnias como a Nike, Adiddas, Le Coq Sportif, Armani, Prada ou Versace que olham de novo para a indústria portuguesa de calçado porque na Ásia nem tudo corre bem.

«Decisões de colecções a longo prazo com os riscos consequentes de erro em produtos moda, maior dificuldade de acesso ao crédito, despesas financeiras com a manutenção de stocks, problemas de qualidade e fiabilidade nas entregas nos prazos correctos», são para Américo Pinto, da Jefar Indústria de Calçado, as razões que estão a trazer as grandes marcas de novo para o nosso país. Na Jefar, que tem a marca Pratik, 90% da produção é para private label (subcontratação) e, adianta Américo Pinto, este ano, «têm sido muito sondados para produções orientadas para o preço».

É que também neste caso há mudanças. Cerca de 85% do que a indústria de calçado portuguesa exporta é calçado em couro e é neste segmento que a China faz mais concorrência às nossas empresas. No entanto, o preço praticado nos dois países tem vindo a aproximar-se cada vez mais.


AGÊNCIA FINANCEIRA 22-08-2010

Saturday, 21 August 2010

AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS DOS BANCOS

Deco acredita que Banco de Portugal vai anular cláusulas abusivas nos créditos

A Deco Proteste manifestou hoje a convicção de que o Banco de Portugal irá anular, “em breve”, as cláusulas abusivas que algumas instituições bancárias estão a introduzir nos contratos relativos ao crédito à habitação.

“Creio que o Banco de Portugal, quando fizer alguma coisa, será no sentido de informar os bancos de que esse tipo de cláusulas são inadmissíveis e sem validade”, afirmou o economista da Deco Proteste, João Fernandes.

Desde há cerca de um ano que a Deco Proteste tem recebido reclamações de vários clientes de três instituições bancárias portuguesas, relativas à introdução de uma cláusula no contrato do crédito à habitação, a qual permite que os bancos possam alterar os juros acordados com os clientes, em caso de alterações ocorridas nos mercados financeiros.

“Isto permitiria aos bancos, de forma discricionária, alterar as taxas de juro que estão subjacentes ao crédito à habitação, o que é uma situação inaceitável”, explicou João Fernandes, confirmando que a situação foi já reportada ao Banco de Portugal.

“Não se pode deixar à arbitrariedade de uma instituição bancária algo que é definido quando se acorda o crédito. Se assim acontecer, acaba por ser mais seguro aceitar uma taxa fixa do que optar por um spread mais baixo [mas em taxa variável]”, acrescentou.

O economista revelou ainda que as queixas dos consumidores que chegaram à Deco Proteste reportam a três bancos diferentes - BES, Montepio e Millenium BCP –, cujos contratos “apresentam cláusulas muito semelhantes”.

“Várias pessoas enviaram-nos os documentos, o que nos permitiu comprovar as queixas”, disse o responsável, frisando que o maior volume de reclamações ocorreu recentemente, sobretudo durante o passado mês de julho.

A Lusa contactou o Banco de Portugal, mas até ao momento ainda não recebeu esclarecimentos sobre o caso.

in ADVOCATUS 20-08-2010

PROENÇA DE CARVALHO AO SERVIÇO DA CAMARGO CORRÊA

A Camargo Corrêa, que tem 32,6% da Cimpor, contratou o sócio da Uría Menéndez-Proença de Carvalho (UM-PC), Daniel Proença de Carvalho, para lhe prestar assistência jurídica em Portugal, reforçando assim os laços com a economia nacional, depois dos encontros com a AICEP e os contactos com Armando Vara.

De acordo com o avançado pelo Jornal de Negócios, a Camargo Corrêa, que é hoje a maior accionista da Cimpor, contratou em Portugal o advogado Daniel Proença de Carvalho. O grupo brasileiro reforça assim a assistência jurídica à sua actividade no País, já que continuará a trabalhar com a Vieira de Almeida & Associados (VdA), firma que o tem assessorado desde a aquisição de participações da Cimpor.

Proença de Carvalho, que representa várias personalidades da vida política e empresarial do País (José Sócrates, Champalimaud ou Paulo Teixeira Pinto), irá prestar ao grupo brasileiro assistência jurídica geral, para já, apenas em Portugal. No entanto, tendo em conta a intenção da Camargo Corrêa de investir nos mercados africanos de Angola e Moçambique, é possível que o advogado português venha a prestar serviços ao grupo além-fronteiras, designadamente, na elaboração de pareceres jurídicos.

Fonte: Jornal de Negócios 20-08-2010

in ADVOCATUS

ESCUTAS DE PINTO DA COSTA NO YOU TUBE

Escutas de Pinto da Costa no Apito Dourado continuam no YouTube

PGR pediu aos EUA para retirar escutas envolvendo Pinto da Costa. Deveria tê-lo feito junto da Google, segundo especialistas.

Mais de meio ano depois, nem uma carta rogatória enviada pela Procuradoria Geral da República (PGR) à Justiça norte-americana, nem uma queixa-crime interposta pelo presidente do FC Porto, Pinto da Costa, foram capazes de remover do You Tube os vídeos que contém o audio e as transcrições das escutas extraídas dos processos Apito Dourado e Apito Final, que envolvem o presidente dos "dragões". Esta situação constitui crime segundo a lei portuguesa, uma vez que as escutas foram publicadas sem autorização dos envolvidos. A advogada especialista em Direito Criminal, Andrea Baptista, esclarece que a divulgação das conversas nestes termos "determina a prática de crime de desobediência" previsto no Código Penal. Contactado pelo Jornal de Negócios, o especialista em Porpriedade Intelectual da PLMJ, Manuel Lopes Rocha, salienta que a PGR poderia ter ido um pouco mais longe, do que limitar-se à carta rogatória. "Este é um caminho demasiado longo, todas as experiências seguindo esse caminho demoram demasiado tempo", lembra, realçando que um contacto directo entre as partes teria sido mais produtivo. "A PGR deveria intimar a Google a retirar os vídeos", sugere.

Fonte: Jornal de Negócios 20-08-2010

in ADVOCATUS

CARTÓRIOS PRIVADOS VÃO TRATAR DE PARTILHAS JUDICIAIS

O bastonário dos notários apontou hoje a celeridade como a «grande vantagem» de as partilhas judiciais poderem ser tratadas nos cartórios notariais privados a partir de 18 de Julho, evitando a morosidade dos tribunais

Em matéria de inventários (para efeitos de partilhas), o bastonário Alex Himmel referiu à agência Lusa que a lei que foi publicada em Julho de 2009 vai entrar em vigor a 18 de Julho próximo, permitindo que todos os intervenientes - particulares e advogados - «possam rapidamente resolver questões de partilhas judiciais» que estavam «encravadas» e se «arrastavam durante anos» nos tribunais.

«A partir de 18 de Julho esses processos vão poder ser tratados nos cartórios notariais. Através do notário - jurista altamente especializado na matéria - vai ser possível resolver uma questão que é simples, mas para a qual os tribunais não têm tido capacidade de resposta», referiu.

Questionado pela Lusa sobre o controlo jurisdicional das partilhas feitas pelos notários, Alex Himmel garantiu que, no final do processo, haverá sempre uma homologação pelo juiz, o que não invalida que a tramitação do processo, negociação entre as partes e mediação seja feita pelo notário.

Lembrou, a propósito, que os notários já tratam das partilhas extrajudiciais e assegurou que há toda a vantagem de as partilhas «mais complicadas» serem resolvidas pelos notários, porque são os profissionais mais experimentados no tratamento deste tipo de problemas.

A presente lei, publicada em Julho de 2009, visou incentivar o recurso à mediação enquanto meio que possibilita a resolução de litígios por acordo entre as partes, transpondo uma directiva europeia de 2008.

Relativamente ao sistema 'Casa Pronta' - procedimento simplificado para venda e penhora de casas -, o bastonário da Ordem dos Notários, Alex Himmel, revelou que existe agora uma «ferramenta nova», fruto de «negociação» com o Ministério da Justiça, a qual introduz «uma melhoria» no serviço on-line de registos.

O bastonário disse que já é possível em todos os cartórios públicos de gestão privada do país o registo on-line da compra da casa, sendo esta «ferramenta muito útil», porque permite «abolir» os registos provisórios que ainda eram, em alguns casos, utilizados pelos bancos.

Neste sentido, a Ordem dos Notários irá continuar a trabalhar com o Governo com o propósito de melhorar as condições de exercício da função notarial, de forma a que cidadãos e empresas possam continuar a beneficiar de uma rede de balcões públicos, espalhados por todo o país, com recursos humanos especializados na prestação de serviços jurídicos de qualidade, referiu ainda.

Lusa / SOL 21-08-2010

ALTERAÇÕES AO REGIME DO INVENTÁRIO

Processos de inventário com lei virtual > SOL

Precisa de avançar com um inventário e partilha de bens? O Governo pede que se espere pelas alterações entretanto feitas à lei... que tem só um mês e é impossível aplicar

COMEÇOU por estar previsto que entrasse em vigor a 18 de Janeiro deste ano, mas depois o Governo adiou o novo Regime Jurídico do Processo de Inventário para 18 de Julho porque ainda não estava pronta a portaria, nem os meios necessários para a aplicar. É que a nova lei tira estes processos dos tribunais e atribui-os às conservatórias e notários.

A 18 de Julho a lei entrou em vigor, mas nesta data já o Parlamento discutia novas alterações ao diploma. Por isso, o Ministério da Justiça (MJ) colocou um comunicado no seu site pedindo que se faça de conta que a lei não existe. O MJ «solicita a cooperação de todos os profissionais forenses para a não instauração de processos de inventário nas conservatórias ou cartórios notariais». Tal seria «verdadeiramente um acto inútil», pois as alterações vão no sentido de repor a competência dos tribunais.

Segundo o SOL apurou, estas alterações constituem um dos diplomas que aguarda a promulgação do Presidente da República. Para o Ministério da Justiça, até lá, há duas opções. A primeira é «aguardar» a publicação da nova lei. A segunda é bem mais complexa e de difícil compreensão: «Instaurar o processo de inventário nos tribunais, apesar da entrada formal em vigor do novo regime do inventário após 18 de Julho, apesar do risco de rejeição do processo por incompetência, apesar de, assim que a nova lei entrar em vigor, todos os actos praticados fiquem 'ratificados'». Ou seja: ir os tribunais também não será um bom caminho.

Para os advogados, a conclusão é óbvia: «Isto é a descredibilização total do legislador e da lei. E o caos...» - comenta Guilherme Figueiredo, presidente do Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados.

E como se explica isto aos clientes? «Tenho em mãos quatro inventários e não sei o que fazer-lhes», responde Leonardo Azevedo, advogado em Ovar.

Mas a promulgação da nova lei promete aumentar a confusão. O diploma tem nada menos do que três datas diferentes: entra em vigor no dia seguinte ao da publicação, produz efeitos a 18 de Julho, mas que só produzem efeito 90 dias após a publicação de uma portaria. Confuso? Num parecer enviado ao Parlamento, a Ordem dos Notários chama-lhe um «processo legislativo kafkiano» e reclamou um «prazo único» - pretensão que não foi atendida.

O mesmo alerta para a confusão de datas foi feito pelo Conselho Superior da Magistratura.

Publicado no SOL a 20 de Agosto de 2010

Extraío da Revista de Imprensa do site da Ordem dos Advogados a 21-08-2010

TRIBUNAIS MAIS BRANDOS DO QUE A ADC E CMVM?

Tribunais mais brandos com infractores > SOL

Valor das coimas aplicado pela Autoridade da Concorrência foi reduzido pela Justiça em 65%, nos últimos três anos, e houve processos anulados

A AdC - AUTORIDADE da Concorrência, apesar de condenar pouco, tem tido a 'mão pesada' na hora de multar os infractores. Mas as suas decisões acabam por ser postas em causa quando as empresas recorrem para tribunal, com os valores das coimas a serem reduzidos ou mesmo com a anulação de processos.

Esta realidade contrasta com o panorama europeu, conseguindo a CE - Comissão Europeia fazer vingar mais as suas decisões na barra dos tribunais.

Nos últimos três anos, o valor das coimas aplicadas pela AdC foi reduzido em 65% por via judicial, segundo cálculos do SOL, a partir de dados do regulador. No caso da CE, a variação é de 3% . Fonte oficial da AdC considera, porém, que o número obtido não é «inteiramente rigoroso», pois não contempla todas as decisões sancionatórias desde a sua criação (2003), nem outras pendentes. Mas admite que o Tribunal de Lisboa «mostra uma tendência geral para a redução das coimas».

Falta de provas e erros processuais da AdC são as principais causas, apontadas pelos advogados de Direito da Concorrência ouvidos pelo SOL, para a taxa de 'insucesso' das coimas aplicadas pela entidade presidida por Manuel Sebastião. Lembrando que «em muitos dos recursos para tribunal subsistem as decisões da AdC, mas quase sempre há uma diminuição do valor das coimas», Miguel Mendes Pereira, da Abreu Advogados, diz que «o principal problema tem a ver com factos não provados ou provas que não respeitam as regras». Em três anos, a AdC viu 55 decisões serem alvo de recurso.

Para Frederico Pereira Coutinho, da Cuatrecasas, Gonçalves Pereira, é «normal» haver um «escrutínio administrativo diferente do tribunal». Ainda assim, considera que a AdC «tem tido, cada vez mais, preocupação em fazer decisões menos atacáveis», atendendo que a credibilidade das instituições também se constrói com a força de decisões que sobrevivem ao crivo dos tribunais.

Outro especialista em concorrência de uma das maiores sociedades de advogados a operar em Portugal, que prefere manter-se no anonimato, justifica a redução do valor das coimas com a «má preparação dos processos por parte da AdC», mas também com a «falta de conhecimento do Direito da Concorrência e de assuntos económicos, por parte dos juizes, assim como do seu preconceito em aplicar multas muito elevadas».

O SOL tentou saber o ponto de vista dos juizes sobre o assunto, mas o presidente da Associação Sindical dos Juizes Portugueses, António Martins, limitou-se a dizer que «num Estado de Direito os tribunais servem para acautelar os direitos e garantias dos cidadãos; e, se estes recorrem, é porque entendem que os seus direitos estão a ser lesados».

Processos custam caro

Em regra, as empresas vêem diminuídas as coimas aplicadas pela AdC - os tribunais em Portugal não podem aumentar o valor em causa, ao contrário do que se passa no Direito Europeu -, mas o recurso nem sempre será a melhor opção.

«Os processos são demorados [podem levar dois a seis anos em tribunal], o que gera insegurança jurídica para as empresas», diz Mendes Pereira, lembrando que as companhias enfrentam custos por fazerem provisões para enfrentar eventuais encargos.

Além dos custos económicos e financeiros, as empresas condenadas «sofrem ainda em termos de reputação, o que é particularmente grave em multinacionais, mesmo quando vencem os casos em tribunal e as decisões do regulador até são anuladas», acrescenta Pereira Coutinho.

A AdC - consciente de que no início da actividade abriu muitos processos que 'não tinham pernas para andar', devido à falta de sensibilidade e conhecimento para filtrar os factos que poderiam fundamentar os casos - tem estado a tentar acabar com muitas das pendências que se arrastam há anos e a procurar melhorar a eficácia e produtividade, segundo fontes ouvidas pelo SOL.

Reconhecendo que o amadurecimento do regulador é difícil de gerir, fontes de empresas condenadas aplaudem a iniciativa, mas lamentam que os critérios de arquivamento não sejam claros e públicos.

'Polícia' da bolsa é a mais activa

O REGULADOR dos mercados financeiros, CMVM - Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, é o mais activo em termos de investigações. No período entre 2007 e 2009, a entidade liderada por Carlos Tavares teve 224 processos 'na mira', contra 198 investigados pela AdC e 197 investigações levadas a cabo pelo BdP - Banco de Portugal.

No mesmo triénio, foi também a CMVM a concluir mais processos (154), destacando-se do regulador da Concorrência (61) e ainda mais do banco central (51). O BdP, agora presidido por Carlos Costa, foi porém o órgão de supervisão com menor número de recursos entre 2007 e 2009 (a instituição era governada por Vítor Constâncio). Apenas nove condenados decidiram litigar a sua decisão.

O regulador liderado por Manuel Sebastião deparou-se com 55 recursos às suas decisões sancionatórias - muitas delas decididas ainda no tempo de Abel Mateus. A CMVM viu 25 dos seus processos serem encaminhados para a via judicial. Entre 1991 e o primeiro trimestre de 2010 (últimos dados disponíveis), a CMVM instaurou um total de 1.574 processos e decidiu 1.492 casos, dos quais 121 foram impugnados. Apenas sete decisões do regulador do mercado de capitais foram revogadas.

Nestes 20 anos, a CMVM aplicou multas num total próximo dos 24 milhões de euros. Já a AdC, só nos últimos três anos aplicou coimas num total de 134 milhões (somando condenações por práticas restritivas e vendas com prejuízo), ainda que em termos efectivos só tenha cobrado perto de 4,15 milhões. Deste total, 60% são entregues ao Estado e o valor remanescente constituem receitas próprias do regulador.

O SOL tentou saber o valor das coimas aplicadas pelo BdP e os respectivos resultados dos recursos em tribunal, assim como outras informações sobre este tema. Mas até ao fecho da edição o supervisor não se mostrou disponível para fornecer os dados. Já a ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, ainda que não tenha regime sancionatório, «nunca verificou qualquer processo judicial promovido por uma empresa» relativamente a uma decisão sua, avançou fonte oficial do regulador ao SOL.

Publicado no SOL a 20 de Agosto de 2010, por Tânia Ferreira

Extraído da Revista de Imprensa site da Ordem dos Advogados 20-08-2010

ENTREVISTA A LA FERIA

"Os musicais em Londres são inferiores aos meus"

Tem novo espectáculo no Casino Estoril e outros três a correr as salas do país. A figura de Salazar daria "não um musical, mas uma tragédia."

O encenador, aqui em frente ao Casino Estoril, é o modelo que todos os fotógrafos desejam: não se importa de experimentar cenários ou repetir poses. "Quem é actor durante 14 anos tem de tratar a câmara por tu", justifica.

A entrevista decorria de forma tranquila até lhe perguntarmos sobre a costureira que terá apresentado uma queixa de agressão contra ele. O encenador Filipe La Féria, 65 anos, subiu o tom de voz e enrouqueceu ainda mais. 3 minutos e 19 segundos depois, acalmou-se e pediu desculpa: "Fervo em pouca água. Discuto todos os dias. Mas berro e no minuto a seguir estou aos beijinhos." Não houve beijinhos, mas quase. Numa salinha do Casino Estoril, onde estreou em Julho o espectáculo "Fado, Histórias de Um Povo", visto já por 28 mil espectadores, retomámos a conversa com o homem que mais portugueses leva ao teatro. Dos tempos em que era actor e comia arroz com arroz aos espectáculos, que garante, sem falsas modéstias, só poderem ter "equivalente na América".

Em pequeno interessou-se por teatro sem nunca ter visto teatro. Como é que isso aconteceu?

Recortava as caricaturas que saíam na página 3 do "Diário de Notícias", colava-as em cartão para que se aguentassem em pé e montava teatros com caixas de sapatos. Nasci na zona raiana do Alentejo. Fiz lá a primária, a viver em casa de uma tia. Os meus pais ficaram em Lisboa, porque uma irmã minha morreu muito cedo e houve um grande luto na família. Essa paixão começou pela palavra, pelos livros. Acho que o teatro é sempre poesia materializada.

Para essas experiências com caixas de sapatos já escrevia as peças ou só montava os cenários?

Fazia tudo, como agora. Nesta última peça até experimentei escrever músicas.

O que lia em miúdo?

Lia de tudo, até livros impróprios para uma criança. Eça de Queiroz, Stendhal, Balzac, Zola... Naquela biblioteca até havia a "Comédia Humana" [de Balzac].

Eram livros da família?

Eram da biblioteca da minha avó, uma mulher muito culta. Aliás, era ela que me levava à ópera - daí talvez a minha paixão pelo musical.

O público conhece-o sobretudo pelos musicais, mas não fez só isso.

Fiz muito mais teatro de outro género do que musical. Estive no Conservatório, comecei a trabalhar muito cedo e passei por companhias extraordinárias como a Amélia Rey Colaço, a Cornucópia, a Casa da Comédia - que estava para ser vendida às testemunhas de Jeová e que dirigi durante 14 anos. Antes de entrar no teatro musical dizia-se que o público português não gostava de musicais. Todas as tentativas tinham sido um fracasso.

Criou uma escola de teatro musical?

Talvez. Se pensarmos que há actores que estão no West End e passaram por mim... Para o "Fado - História de Um Povo" fiz uma audição que foi transmitida na RTP e teve mais de mil candidatos.

Está tão ligado à encenação que é fácil esquecer que começou como actor.

Estive 14 anos só a trabalhar como actor mas já nessa altura sonhava escrever, fazer os cenários e os figurinos. Sempre tive a paixão pelo teatro total.

Era bom actor?

Tive prémios e bons papéis, como o Romeu do "Romeu e Julieta".

Era capaz de voltar?

Hoje em dia tenho uma vida tão obsessiva e preenchida... já não faz sentido.

O musical "Amália" esteve seis anos em cena, ultrapassou os 6 milhões de espectadores. Como explica o fenómeno?

Representa a figura que representa... A Amália é que teve a ideia, quando foi ver um espectáculo sobre a Maria Callas. "Então está a fazer um espectáculo sobre a Callas? Porque não faz um sobre mim?" Já estava em ensaios quando ela morreu.

Conhecia-a bem?

Quando a conheço já é uma mulher retirada, morta por dentro, porque não podia cantar. Era uma mulher entristecida, mas luminosa e com uma grande sabedoria.

Há jovens a assistir aos seus espectáculos? Há a ideia de que só os mais velhos vão em excursões ao Politeama.

É exactamente o contrário. Os espectadores da "Menina do Mar" ou do "Feiticeiro de Oz" ficam fãs do teatro musical. Começam a vir com a escola e depois obrigam os pais a ir. E são todos esses jovens que alimentam o Politeama ou o Rivoli.

Já descobriu muitos talentos?

Todos os grandes actores são descobertos por mim: de uma Maria Rueff a um João Baião ou a um Joaquim Monchique.

Há pessoas com quem se recusa a voltar a trabalhar?

Esqueço-me de tudo. Posso berrar mas não guardo rancor a ninguém. Um actor é um condenado da sensibilidade: temos o coração ao pé da boca, mas tudo passa.

Então é verdade que berra muito enquanto está a conduzir um espectáculo?

Às vezes de mais. Até tenho de ter cuidado, porque tenho problemas de saúde por causa disso. Sou muito exigente comigo e com os outros. O espectáculo tem de ser muito bom para o espectador querer voltar. E acho que os faço muito bons. O "Fado - História de Um Povo" só pode ter equivalente na América.

Nunca pensou em fazer um filme musical?

Não temos nem cinema, quanto mais musical. Vou morrer com a frustração de nunca ter feito um filme.

Afinal, depois das polémicas todas, o Rivoli é ou não é a sua casa?

A minha casa é o Politeama. O Rivoli está a ser uma experiência difícil. Lisboa já é uma cidade difícil para o teatro - em Agosto não há uma única sala de espectáculos aberta e ninguém se importa com isso. A cultura é sempre o parente pobre. Salazar tinha uma frase horrível que dizia que "a cultura era a casaca que se punha para receber as visitas".

Admira a figura de Salazar?

Não o admiro nada. Aquela coisa de sacristão de província... Dizer fascismo até já acho um elogio, parece uma coisa grandiosa. Só acho que ele é uma figura teatral que nunca foi explorada. Os italianos já fizeram peças sobre Mussolini.

Já pegou em Jesus Cristo. Porque não um musical sobre Salazar?

Musical não, mas uma tragédia...

Hoje já ninguém se lembra que o Politeama era um cinema de pornografia quando pegou nele.

Era esse e o Olímpia. Tiveram êxito até os vídeos os remeterem à falência. Peguei nesse cinema decadente e fiz dele o teatro mais querido do público de Lisboa e que é hoje o motor daquela rua. Antes era só prostitutas e toxicodependentes, hoje tem vida e restaurantes.

Como reage quando dizem que o teatro musical é baixa cultura?

Esse teatro é hoje o que era a ópera italiana no século xix. Ouve-se uma composição de Lloyd Weber e está-se a ouvir Puccini. Porque há-de ser um teatro menor se os seus actores têm de ser completos? O Ruy de Carvalho, por exemplo, é completo. Faz musical como faz o "Rei Lear".

Ainda sente esse preconceito?

As pessoas quando vão a Londres vão logo aos grandes musicais. E esses são inferiores aos meus, segundo os próprios autores. O Lloyd Weber, por exemplo, considerou o meu "Jesus Cristo Superstar" a melhor encenação que viu até hoje.

Voltando atrás, como é que os seus pais reagiram quando disse que queria seguir teatro?

Portugal antes do 25 de Abril era irrespirável. As pessoas eram muito complexadas. Quem ia para o teatro eram os vadios. "Escondam as patas que vêm aí os cómicos."

Tentaram impedi-lo?

Foram aceitando, mas era sempre um desgosto. Sabiam que não ia ter uma vida fácil: houve fases em que tive de comer arroz com arroz. É um oposto desta sociedade, em que as mães até empurram os filhos para fazer as figuras mais tristes na televisão. Havia o recato, agora há a loucura da exibição, um circo disparatado.

Os problemas de saúde deram-lhe mais consciência dessas limitações?

Tenho problemas há algum tempo - tenho olhos fracos, por exemplo. Quer se queira quer não, esses problemas dão-nos consciência da nossa grande fragilidade.

Aborrece-se quando imitam a sua voz?

Como actor, foi sempre a minha grande marca. Uma vez em Londres fui dizer que queria mudar a voz. Uma professora de canto ia-me batendo: "Está louco? Nunca mude, senão vai ficar igual aos outros."

Sempre teve a voz assim?

Nasci rouco. Era "o Rocco e os seus irmãos", como dizia Visconti.

Como recorda a aventura de Londres? Esteve lá três anos, com uma bolsa.

No final do mês a bolsa eram uns trocos. Trabalhava ao mesmo tempo, a servir à mesa num restaurante da King''s Road. Vivi os anos 70 nessa rua, mas ainda no outro dia dizia a uns amigos que, estando num mundo mais excêntrico, onde havia droga e toda a vida mais marginal, nunca me deu para isso. O mundo real nunca me atraiu.

Não vive num mundo real?

Invento outros mundos para não viver no real. Já em pequeno era assim: tinha dificuldade em aceitar que as personagens da "Madame Bovary" não eram reais.

Hipotecou bens por causa da Casa da Comédia?

Ai, hipotequei bens por causa de tudo! Pela Casa da Comédia, pelo Politeama. Na Casa da Comédia, eu e o António Cruz tínhamos um faqueiro que ia sempre para o prego para fazer os espectáculos.

Agora já não precisa de hipotecar bens?

Preciso pois.

Com salas lotadas não se ganha dinheiro?

Não se ganha dinheiro no teatro, porque há uma enorme despesa. Garanto que é um negócio que para enriquecer não serve. Nem Brecht enriqueceu.

Das coisas que hipotecou, há alguma que lhe tenha custado mais?

Hipotequei a vida pelo teatro. Ainda hoje tenho bens hipotecados. E talvez me possa arrepender. Se tivesse tido uma vida mais calma poderia ser mais feliz.

Já lhe aconteceu não pagar aos artistas?

Sempre paguei, mas atraso-me muito, às vezes meses. O que é dramático até para mim. Fico angustiado.

O que se passou com a costureira de um dos seus espectáculos [os jornais e as revistas noticiaram o mês passado que a costureira Helena Brandão, que trabalhava com o produtor desde 1999, terá apresentado na GNR uma queixa de agressão]?

Só uma discussão amigável. Todos os dias discuto! Com a D. Irene, com a Maria Ruivo, com a Alexandra. As pessoas estão desmotivadas. Só entro nessas discussões quando há incompetência. Uma pessoa que dá tudo também quer receber tudo.

Tem medo de envelhecer?

Acha que estou velho? Olho-me ao espelho e não acho nada. Tenho medo é da doença. E devia aprender que já não tenho idade para ferver em pouca água.


I ONLINE

por Sílvia Caneco, Publicado em 21 de Agosto de 2010