Uma estufa no telhado do Clube VII, em Lisboa, para produzir girassol, ervilha e erva-trigo é o projecto de João Afonso Henriques para 2014, Ano Internacional da Agricultura Familiar. É, espera o fundador da Urban Grow, só o princípio de uma revolução que vai trazer a agricultura para dentro das cidades.
“Não quero produzir microlegumes”, diz. “O que eu quero é fazer microfábricas de proteína vegetal com baixas calorias, aminoácidos, vitaminas, antioxidantes e ácido fólico. Não quero produzir plantas, quero criar microfábricas de força vital. Quero criar a melhor solução de produção de nutrientes localmente e de forma sustentada.” Fala em “força vital” porque é este o conceito que surge associado à ideia de plantas muito jovens, que têm toda a sua energia concentrada, mas frisa que se trata de algo que não é mensurável cientificamente, por isso prefere focar-se nas vitaminas e outros componentes que podem de facto ser medidos.
Dos microlegumes aos biovivos
Anteriormente, João tinha uma horta na qual produzia microlegumes gourmet — rabanetes, tomates e alfaces, por exemplo — para fornecer a restaurantes e chefs. Mas agora a sua perspectiva é outra. Não quer vender alimentos, quer vender saúde. Aponta para um dos tabuleiros. “Apesar de aquilo serem microlegumes de ervilha, podemos vê-los como a melhor fonte de vitamina C e proteína com baixas calorias, antioxidantes e ácido fólico.”
O girassol, por exemplo, “tem mais antioxidantes que os frutos vermelhos”, garante. “As amoras, framboesas, mirtilos ajudam na luta contra o envelhecimento, mas demoram seis meses a crescer e têm um custo extremamente elevado para a quantidade de antioxidantes que oferecem. Com o girassol, temos uma dose de antioxidantes superior por cada 100 gramas, e que cresce em 20 dias.”
Em casa, diz, tem um tabuleiro em cima da mesa de trabalho e vai comendo os rebentos de ervilha, que usa também em sanduíches, em omoletes ou, juntamente com duas laranjas, para fazer um sumo que representa 100% da dose diária recomendada de vitamina.
Quando apresenta o seu produto num restaurante, tem vários argumentos: “Comecei com os microlegumes, mas estes, como já foram colhidos, estão mortos, enquanto os biovivos só morrem na altura em que o chef os corta e vão para a salada ou outro prato. Só são utilizados quando é preciso e por isso não há desperdício. E depois, quando digo que um tabuleiro destes equivale a um quilo de alface, meio quilo de espinafres e duas laranjas, as pessoas ficam impressionadas.”
A primeira apresentação destes produtos acontecerá a 5 de Abril durante o Sangue na Guelra, um evento-satélite do festival Peixe em Lisboa, em que as estrelas são os subchefs dos grandes restaurantes do mundo. E em Maio o produto deverá estar à venda nos supermercados biológicos Brio (com um preço de lançamento de 1,55 euros por tabuleiro, que subirá depois para os 2 euros; um tabuleiro deverá ser consumido no prazo de uma semana para manter as características ideais).
Qual é, então, a diferença entre os biovivos e os germinados, que começaram também nos últimos anos a aparecer no mercado? João abre uma caixa de plástico colorida onde tem as sementes de ervilha dentro de água. “Isto que tenho aqui são os germinados, cresceram num sítio escuro e quentinho, que é o autêntico spa das bactérias. Na minha perspectiva, é preciso termos muito cuidado com os germinados crus, porque lavamos a semente por fora, mas é quando ela rebenta que aparecem as bactérias.” Os biovivos são uma fase mais avançada dos germinados que, segundo João, mantêm muitas das características boas destes mas já deixaram o tal “spa de batérias”.
Fiel à sua ideia de aproveitar os espaços urbanos (até porque a sua formação original é de design, depois aplicado à agricultura), prepara-se para criar a “primeira estufa de telhado biocertificada da Europa”, no cimo do ginásio Clube VII, no Parque Eduardo VII, em Lisboa. É aí que vão crescer os biovivos, que serão depois utilizados na cafetaria do clube. “Vamos espalhar várias estufas na cidade e fornecer os biovivos o mais localmente possível.”
O modelo que João Afonso quer implementar passa muito por sítios como clubes e ginásios (a ideia é aliar a nutrição e a saúde), mas também por hotéis. “Vamos imaginar um hotel. Pego na lista de produtos que usam na zona de restauração, vou analisar o telhado e outras zonas de cultivo que possam ter no edifício e vou tentar produzir os inputs da cozinha deles no próprio edifício.”
Se o hotel usar produtos gourmet, tem ainda mais vantagem, afirma. “Se eu fizer um sistema para produzir alfaces, vou conseguir pagá-lo em três anos, se fizer um sistema para produzir morangos azuis, rabanete preto ou rabanete melancia, paga-se em seis meses. Porque é um produto raríssimo, com um valor de mercado muito mais elevado. O desafio que lanço a todos os hotéis é que tenham coragem para começar a desenhar os seus modelos de autocultivo. Não precisam de mandar vir o produto de distância e têm-no a crescer no próprio hotel.”
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