Wednesday, 2 February 2011

RICARDO SÁ FERNANDES ENVOLVIDO EM CINCO PROCESSOS

Denunciou oferta de 200 mil euros pela Bragaparques

O advogado Ricardo Sá Fernandes é arguido em cinco processos por ter denunciado às autoridades judiciais uma oferta de 200 mil euros feita por Domingos Névoa, gestor e accionista da Bragaparques, para o seu irmão, o vereador José Sá Fernandes, desistir de uma acção popular visando anular o negócio da Câmara de Lisboa com aquela empresa.

Sá Fernandes (na foto) é arguido por ter denunciado uma oferta de 200 mil euros feita por Domingos Névoa (Foto: Bruno Castanheira/arquivo)

Anteontem, o advogado foi intimado pelo DIAP de Lisboa de ter praticado o crime de gravação ilegal, por ter gravado o primeiro contacto que teve com Névoa, conversa que serviu para apresentar queixa ao Ministério Público, que promoveu a autorização judicial para o advogado voltar a registar as palavras de Névoa em dois encontros.

Em declarações ao PÚBLICO, Ricardo Sá Fernandes afirmou que o registo áudio do diálogo com Domingos Névoa teve uma causa de justificação. “Desconfiei da prática de um crime e registei a conversa de Domingos Névoa no meu telemóvel. A conversa não foi tornada pública e só foi ouvida pelas autoridades judiciais, que me pediram para gravar os diálogos que tivesse com o empresário, caso este solicitasse novos encontros”.

“Sinto-me vilipendiado, alvo de um ajuste de contas e de uma traição moral do Ministério Público, que se serviu de mim para acusar Domingos Névoa e, agora, acusa-me de gravação ilícita”
, afirmou Ricardo Sá Fernandes. Além de contestar a acusação do DIAP de Lisboa junto do Tribunal de Instrução Criminal, o advogado vai contactar o conselheiro Fernando Pinto Monteiro: “Quero que o senhor procurador-geral da República me diga se teve conhecimento desta duplicidade de comportamento do Ministério Público. Não vou baixar os braços”.

Julgamento em Braga em 24 de Março

Um dos cinco processos de que Ricardo Sá Fernandes foi alvo tem marcação da repetição do julgamento para o próximo dia 24 de Março, na sequência do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães ter anulado a decisão do juiz da cidade dos Arcebispos, que o condenou a indemnizar Domingos Névoa em dez mil euros. Em causa está uma entrevista de Ricardo Sá Fernandes ao semanário Sol, na qual o advogado abordava a alegada tentativa de Névoa para convencer o vereador da Câmara Municipal de Lisboa, José Sá Fernandes, a desistir de uma acção contestando a permuta de terrenos da Bragaparques com a Câmara de Lisboa. Na referida entrevista, o advogado qualificava Domingos Névoa de "corruptor" e de "vigarista".

Os desembargadores alertam que não se pode acantonar "a liberdade de expressão nos estreitos limites das normas penais e, em última análise, reservá-la para os técnicos do Direito". "Neste processo, não se julga um crime de corrupção," realçam os juízes do TRG. "O seu objecto é a tutela da honra e da consideração e as relações destas com a liberdade de expressão". "A provarem-se os factos contados pelo arguido na entrevista, não é relevante determinar se eles integram todos os elementos típicos da previsão do Código Penal (...) mas apenas ajuizar qual dos direitos em confronto (liberdade de expressão e defesa do bom nome) deve prevalecer."

Uma outra decisão da primeira instância, desta feita condenando Domingos Névoa por corrupção activa para acto lícito em três anos de prisão, pena suspensa por igual período, e no pagamento de 5000 euros, foi anulada pelo Tribunal da Relação de Lisboa. Os desembargadores contrariaram o enquadramento jurídico da primeira instância e absolveram o empresário de Braga, decisão confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, estando pendente recurso no Tribunal Constitucional.

Domingos Névoa intentou outro processo contra Ricardo Sá Fernandes, reclamando uma indemnização de 250 mil euros, pretensão que foi recusada na jurisdição cível, tendo Névoa recorrido da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa. O empresário anunciou idêntica atitude após Sá Fernandes ter sido absolvido de uma queixa que apresentou junto da Ordem dos Advogados.

02.02.2011 - 16:00 Por António Arnaldo Mesquita

http://www.publico.pt/Sociedade/ricardo-sa-fernandes-envolvido-em-cinco-processos_1478311

PROBLEMAS NO CANAL DE SUEZ PODEM BENEFICIAR SINES


Egipto: problemas no canal do Suez podem beneficiar porto de Sines

Presidente da CIP alerta para importância geoestratégica do porto de Sines

O porto de Sines pode ganhar importância geoestratégica se os conflitos no Egipto prejudicarem o canal do Suez, um dos principais pontos de passagem do petróleo proveniente do Médio Oriente, disse esta quarta-feira o presidente da CIP, António Saraiva.

«Se este conflito no Egipto tiver reflexos no canal do Suez, se calhar, Portugal, pela sua exposição atlântica, acaba por ter estrategicamente um posicionamento mais favorável do que tinha até agora», disse o responsável aos jornalistas após participar num almoço promovido pelo American Club, cita a Lusa.

António Saraiva adiantou que o porto de Sines é um porto de águas profundas e salientou que eventuais alterações no Canal de Suez podem trazer a Portugal «vantagens acrescidas».

«O mal de uns é o bem de outros», observou.

O dirigente da confederação patronal sublinhou que Portugal deve «potenciar políticas públicas que aproveitem este recurso enorme que é o mar», aproveitando Sines e as auto-estradas marítimas.

http://www.agenciafinanceira.iol.pt/economia/egipto-porto-de-sines-canal-do-suez-cip-agencia-financeira/1230374-1730.html

MP ACUSA RICARDO FERNANDES DE TER FEITO UMA "GRAVAÇÃO ILÍCITA"

Caso Bragaparques

O Ministério Público (MP) acusa Ricardo Sá Fernandes de ter gravado de forma "ilícita" uma conversa com o empresário da Bragaparques Domingos Névoa, para provar uma tentativa de corrupção, avança a SIC Notícias.

De acordo com a SIC Notícias, Ricardo Sá Fernandes recebeu a acusação na terça-feira, que considera uma "traição moral". O advogado disse à estação que gravou uma primeira conversa sem autorização judicial e que, ao mostrá-la ao MP, lhe foi pedido que repetisse a mesma conversa com autorização e utilizando os meios de gravação da Polícia Judiciária.

Nessa conversa, Domingos Névoa terá tentado facilitar a permuta de terrenos do Parque Mayer, da Bragaparques, com os da Feira Popular, da Câmara Municipal de Lisboa, onde o irmão de Ricardo Sá Fernandes, José Sá Fernandes, é vereador. Domingos Névoa terá dito que pagaria 200 mil euros ao irmão do advogado para que este desistisse das acções que tinha interposto contra a permuta.

Domingos Névoa foi condenado em primeira instância pelo crime de corrupção activa e a gravação constituiu prova; no entanto, o empresário acabaria por ser absolvido pelo Tribunal da Relação, que considerou que o crime não se verificou, pois o negócio da permuta de terrenos iniciou-se num momento anterior à tomada de posse do vereador.

Apesar de o Ministério Público ter utilizado a gravação como prova para iniciar o processo contra Domingos Névoa, o advogado Ricardo Sá Fernandes é agora acusado de ter feito uma "gravação ilícita".

http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1773324

Tuesday, 1 February 2011

MARINHO PINTO CONTRA CRIMINALIZAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO


Marinho e Pinto contra novo crime de enriquecimento ilícito
Num artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias (JN), o representante dos advogados explica porque entende que essa iniciativa poderá conduzir a um "fundamentalismo justiceiro".
Fundamentalismo justiceiro
O Correio da Manhã lançou uma petição visando a criação de um novo crime de enriquecimento ilícito. A iniciativa visa punir com prisão de um a cinco anos os titulares de cargos políticos que, «durante o período de exercício das suas funções ou nos três anos seguintes à respectiva cessação», adquiram «quaisquer bens cujo valor esteja em manifesta desproporção com o seu rendimento declarado» (no IRS) e com a declaração do património apresentada no Tribunal Constitucional. Segundo a proposta desse jornal, os políticos não seriam punidos se provassem a proveniência lícita dos bens.


Em bom rigor, não se trata de um novo crime mas apenas de um expediente processual em que se presume como ilícita a proveniência daqueles bens e se obrigam os visados a provar a sua origem lícita. Os factos integradores da pretensa ilicitude (corrupção, tráficos, furtos, etc.) já não precisariam de ser provados pela acusação, devendo, ao contrário, os factos integradores da licitude ser provados pelos suspeitos. A justiça já não teria de provar a desonestidade dos acusados, estes é que teriam de demonstrar a sua honestidade.

Embora previsto apenas para os políticos, é de admitir, porém, que o expediente rapidamente seria alargado a outras pessoas putativamente capazes de «enriquecer ilicitamente» tais como gestores públicos, militares, magistrados (por que não?!) e, em geral, funcionários públicos e equiparados, acarretando, inevitavelmente, a institucionalização da devassa na vida pública e a generalização da delação na sociedade.

Não é de espantar que essa insólita iniciativa do CM tenha sido subscrita por vários juízes e procuradores, dado o sentimento de amor/ódio que certos sectores da magistratura sempre tiveram para com os titulares de cargos políticos, embora com uma especificidade bem portuguesa: o ódio é dirigido aos políticos do regime democrático e o amor era (sempre foi) reservado aos políticos das ditaduras (atente-se na dedicação com que as magistraturas em geral serviram o Estado Novo).


Não é de estranhar ainda o facto de ela ser também subscrita por alguns polícias e alguns jornalistas, pois é notória a promiscuidade existente entre eles. Basta ver as sistemáticas violações do segredo de justiça destinadas a obter na comunicação social aquilo que certos investigadores não conseguem nos processos: a condenação dos suspeitos. Os maus polícias sempre parasitaram os jornalistas sem ética e estes sempre privilegiaram aqueles, pois é mais fácil transformar em notícia as opiniões de polícias ou magistrados frustrados do que procurar a verdade através de investigações jornalísticas autónomas.

Não é de admirar, até, que alguns advogados mediáticos subscrevam a petição (para inverter o ónus da prova em direito penal), pois, se atentarmos bem, não passam de pessoas complexadas por terem falhado as carreiras políticas que tentaram.


O que causa estupefacção é a circunstância de políticos, alguns deles sérios, assinarem uma petição que visa proceder a uma subversão dos princípios da administração da justiça num estado de direito e que, no limite, ameaça os alicerces do próprio estado democrático. Obrigar todos os titulares de cargos políticos a justificar os seus bens perante polícias e magistrados (que nem sequer declaram os seus patrimónios ao TC) só pode provir de pessoas que não compreendem bem a essência da democracia com as suas virtudes e os seus defeitos. Ver esses políticos e alguns magistrados atrelados aos espasmos irracionais e antidemocráticos de um tablóide sensacionalista não pode deixar de constituir um sério motivo de preocupação.


Em vez de defenderem com firmeza os princípios de um processo penal democrático, tributário dos valores da ilustração, da modernidade e do racionalismo, acabam por ceder a impulsos irracionais, obscurantistas e antidemocráticos, aparentemente, em favor de uma eficácia da justiça que nunca lograria realização.

Salvaguardando as devidas proporções é bom lembrar que algumas das grandes tragédias da humanidade começaram em nome de elevados desígnios colectivos; que algumas das piores formas de servidão e de alienação começaram sob o entusiasmo inebriante de ideologias da libertação; que as maiores ofensas à dignidade humana foram perpetradas por religiões que proclamavam o amor ao próximo; e que as piores injustiças foram sempre feitas em nome da perfeição da justiça.

Ignorar ou subvalorizar esses ensinamentos é o primeiro passo para alimentar novos fundamentalismos, o mais perigoso dos quais é, hoje, o fundamentalismo justiceiro.

Fonte: JN

31-Jan-2011

http://www.advocatus.pt/content/view/3745/11/

Monday, 31 January 2011

D. MANUEL II ESCREVE SOBRE O REGICÍDIO


Caros confrades,

Caso não consigam aceder ao site, aqui vos deixo o excerto em que o rei D. Manuel II descreve de forma pungente o regicídio.

Os meus cumprimentos,

José Pedro Castro

O Regicídio visto por D. Manuel II

A 1 de Fevereiro de 1908, no regresso de mais uma estadia em Vila Viçosa, o rei D. Carlos e o princípe herdeiro D. Luís Filipe, são assassinados em pleno Terreiro do Paço. De um só golpe, Costa e Buiça, decapitavam a monarquia portuguesa, deixando o trono nas mãos de um inexperiente D. Manuel, sem capacidade nem margem de manobra para gerir uma situação política explosiva que culminaria com a queda da monarquia e a implantação da República a 5 de Outubro de 1910.

A 21 de Maio de 1908, quase 4 meses após o regicídio, o já então rei D. Manuel II, descreveu a forma como viveu este trágico acontecimento, sob o título de "Notas absolutamente íntimas", de que apresentamos o excerto que se segue.

«Há já uns poucos de dias que tinha a ideia de escrever para mim estas notas intimas, desde o dia 1 de Fevereiro de 1908, dia do horroroso atentado no qual perdi barbaramente assassinados o meu querido Pae e o meu querido Irmão. Isto que aqui escrevo é ao correr da pena mas vou dizer franca e claramente e também sem estilo tudo o que se passou. Talvez isto seja curioso para mim mesmo um dia se Deus me der vida e saúde. Isto é uma declaração que faço a mim mesmo. Como isto é uma historia intima do meu reinado vou inicia-la pelo horroroso e cruel atentado.

No dia 1 de Fevereiro regressavam Suas Magestades El-Rei D. Carlos I a Rainha a senhora D. Amélia e Sua Alteza o Principe Real de Villa Viçosa onde ainda tinha ficado. Eu tinha vindo mais cedo (uns dias antes) por causa dos meus estudos de preparação para a Escola Naval. Tinha ido passar dois a Villa Viçosa tinha regressado novamente a Lisboa.

Na capital estava tudo num estado excitação extraordinária: bem se viu aqui no dia 28 de Janeiro em que houve uma tentativa de revolução a qual não venceu. Nessa tentativa estava implicada muita gente: foi depois dessa noite de 28, que o Ministro da Justiça Teixeira d'Abreu levou a Villa Viçosa o famoso decreto que foi publicado em 31 de Janeiro. Foi uma triste coincidência ter rubricado nesse dia de aniversário da revolta do Porto. Meu Pae não tinha nenhuma vontade de voltar para Lisboa. Bem lembro que se estava para voltar para Lisboa 15 dias antes e que meu Pae quis ficar em Villa Viçosa: Minha Mãe pelo contrário queria forçosamente vir. Recordo-me perfeitamente desta frase que me disse na vespera ou no próprio dia que regressei a Lisboa depois de eu ter estado dois dias em Villa Viçosa. "Só se eu quebrar uma perna é que não volto para Lisboa no dia 1 de Fevereiro. Melhor teria sido que não tivessem voltado porque não tinha eu perdido dois entes tão queridos e não me achava hoje Rei! Enfim, seja feita a Vossa vontade Meu Deus!

Mas voltando ao tal decreto de 31 de Janeiro. Já estavam presas diferentes pessoas politicas importantes. António José d'Almeida, republicano e antigo deputado, João Chagas, republicano, João Pinto dos Santos, dissidente e antigo deputado, Visconde de Ribeira Brava e outros. Este António José d'Almeida é um dos mais sérios republicanos e é um convicto, segundo dizem. João Pinto dos Santos, é também um dos mais sérios do seu partido. O Visconde de Ribeira Brava, não presta para muito e tinha sido preso com as armas na mão no dia 28 de Janeiro. Mas o António José d'Almeida e João Pinto dos Santos não podiam ser julgados senão pela Câmara como deputados da última Câmara. Ora creio que a tensão do Governo era mandar alguns para Timor tirando assim por um decreto dictatorial um dos mais importantes direitos dos deputados. O Conselheiro José Maria de Alpoim par do Reino e chefe do partido dissidente tinha tido a sua casa cercada pela policia mas depois tinha fugido para Espanha. Um outro dissidente também tinha fugido para Espanha e lá andou disfarçado. Outro que tinha sido preso foi o Afonso Costa: este é do pior do que existe não só em Portugal mas em todo mundo; é medroso e covarde, mas inteligente e para chegar aos seus fins qualquer pouca vergonha lhe é indiferente. Mas isto tudo é apenas para entrar depois mais detalhadamente na história íntima do meu reinado.

Como disse mais atrás eu estava em Lisboa quando foi 28 de Janeiro; houve uma pessoa minha amiga (que se não me engano foi o meu professor Abel Fontoura da Costa) que disse a um dos Ministros que eu gostava de saber um pouco o que se passava, porque isto estava num tal estado de excitação. O João Franco escreveu-me então uma carta que eu tenho a maior pena de ter rasgado, porque nessa carta dizia-me que tudo estava sossegado e que não havia nada a recear! Que cegueira!

Mas passemos agora ao fatal dia 1 de Fevereiro de 1908 sábado. De manhã tinha eu tido o Marquês Leitão e o King. Almocei tranquilamente com o Visconde d'Asseca e o Kerausch. Depois do almoço estive a tocar piano, muito contente porque naquele dia dava-se pela primeira vez "Tristão e Ysolda" de Wagner em S. Carlos. Na vespera tinha estado tocando a 4 mãos com o meu querido mestre Alexandre Rey Colaço o Septuor de Beethoven, que era, e é uma das obras que mais aprecio deste génio musical. Depois do almoço à hora habitual quer dizer às 13:15h comecei a minha lição com o Fontoura da Costa, porque ele tinha trocado as horas da lição com o Padre Fiadeiro. A hora do Fontoura era às 17:30h. acabei com o Fontoura às 15 horas e pouco depois recebi um telegrama da minha adorada Mãe dizendo-me que tinha havido um descarrilamento na Casa-Branca, mas não tinha acontecido nada, mas que vinham com três quartos de hora de atraso. Vendo que nada tinha acontecido dei graças a Deus, mas nem me passou pela mente, como se pode calcular o que havia de acontecer. Agora pergunto-me eu aquele descarrilamento foi um simples acaso? Ou foi premeditado para que houvesse um atraso e se chegasse mais tarde? Não sei. Hoje fiquei em dúvida. Depois do horror que se passou fica-se duvidando de muita coisa. Um pouco depois das 4 horas saí do Paço das Necessidades num "landau" com o Visconde d'Asseca em direcção ao Terreiro do Paço para esperarmos Suas Magestades e Alteza. Fomos pela Pampulha, Janelas Verdes, Aterro e Rua do Arsenal. Chegámos ao Terreiro do Paço. Na estação estava muita gente da corte e mesmo sem ser. Conversei primeiro com o Ministro da Guerra Vasconcellos Porto, talvez o Ministro de quem eu mais gostava no Ministério do João Franco. Disse-me que tudo estava bem.

Esperamos muito tempo; finalmente chegou o barco em que vinham os meus Paes e o meu Irmão. Abracei-os e viemos seguindo até a porta onde entramos para a carruagem os quatro. No fundo a minha adorada Mãe dando a esquerda ao meu pobre Pae. O meu chorado Irmão deante do meu Pae e eu deante da minha mãe. Sobretudo o que agora vou escrever é que me custa mais: ao pensar no momento horroroso que passei confundem-se-me as ideias. Que tarde e que noite mais atroz! Ninguem n'este mundo pode calcular, não, sonhar o que foi.creio que só a minha pobre e adorada Mãe e Eu podemos saber bem o que isto é! vou agora contar o que se passou n'aquella historica Praça.

Sahimos da estação bastante devagar. Minha mãe vinha-me a contar como se tinha passado o descarrilamento na Casa-Branca quando se ouvio o primeiro tiro no Terreiro do Paço, mas que eu não ouvi: era sem duvida um signal: signal para começar aquella monstrosidade infame, porque pode-se dizer e digo que foi o signal para começar a batida. Foi a mesma coisa do que se faz n'uma batida às feras: sabe-se que tem de passar por caminho certo: quando entra n'esse caminho dá-se o signal e começa o fogo! Infames! Eu estava olhando para o lado da estatua de D. José e vi um homem de barba preta , com um grande "gabão". Vi esse homem abrir a capa e tirar uma carabina. Eu estava tão longe de pensar n'um horror d'estes que me disse para mim mesmo, sabendo o estado exaltação em que isto tudo estava "que má brincadeira". O homem sahiu do passeio e veio se pôr atraz da carruagem e começou a fazer fogo.

Quando vi o tal homem das barbas que tinha uma cara de meter medo, apontar sobre a carruagem percebi bem, infelizmente o que era. Meu Deus que horror. O que então se passou só Deus minha mãe e eu sabemos; porque mesmo o meu querido e chorado Irmão presenceou poucos segundos porque instantes depois também era varado pelas balas. Que saudades meu Deus! Dai-me a força Senhor para levar esta Cruz, bem pesada, ao Calvário! Só vós, Meu Deus sabeis o que tenho sofrido!

Logo depois do Buíça ter feito fogo (que eu não sei se acertou) começou uma perfeita fuzilada, como numa batida às feras! Aquele Terreiro do Paço estava deserto nenhuma providência! Isso é que me custa mais a perdoar ao João Franco. Se durante o seu ministério sobretudo na parte da ditadura cometeu erros isso para mim é menos. Tenho a certeza que a sua intenção era muito boa; os meios é que foram maus, péssimos, pois acabou da maneira mais atroz que jamais se poderia imaginar. Quando se lhe dizia que isto ia mal que havia anarquistas no nosso País ele não acreditou. O primeiro sintoma que eu me lembro de ter havido foi a explosão daquelas bombas na Rua de Santo António à Estrela. Recordo-me perfeitamente a impressão que me fez quando soube! Foi no Verão estávamos então na Pena. Quem me diria o que havia de acontecer 6 ou 8 meses depois! Mas voltando novamente ao pavoroso atentado.

Sei de um dos comandantes da polícia o Coronel Correia estava muito inquieto e o João Franco não acreditava que pudesse ter lugar qualquer coisa desagradável, quanto menos um horror destes, e infelizmente não estavam tomadas providências nenhumas.

Imediatamente depois do Buíça começar a fazer fogo saiu de debaixo da Arcada do Ministério um outro homem que desfechou uns poucos de tiros à queima-roupa sobre o meu Pai; uma das balas entrou pelas costas e outra pela nuca, que O matou instantaneamente. Que infames! para completarem a sua atroz malvadez e sua medonha covardia fizeram fogo pelas costas. Depois disto não me lembro quase do resto: foi tão rápido! Lembra-me perfeitamente de ver a minha adorada e heróica Mãe de pé na carruagem com um ramo de flores na mão gritando àqueles malvados animais, porque aqueles não são gente «infames, infames».

A confusão era enorme. Lembra-me também e isso nunca poderei esquecer, quando na esquina do Terreiro do Paço para a Rua do Arsenal, vi o meu Irmão em pé dentro da carruagem com uma pistola na mão. Só digo d'Ele o que o Cónego Aires Pacheco disse nas exéquias nos Jerónimos: «Morreu como um herói ao lado do seu Rei»! Não há para mim frase mais bela e que exprima melhor todo o sentimento que possa ter.

Meu Deus que horror! Quando penso nesta tremenda desgraça, ainda me parece um pesadelo!

Quando de repente já na Rua do Arsenal olhei para o meu queridíssimo Irmão vi-O caído para o lado direito com uma ferida enorme na face esquerda de onde o sangue jorrava como de uma fonte! Tirei um lenço da algibeira para ver se lhe estancava o sangue: mas que podia eu fazer? O lenço ficou logo como uma esponja.

No meio daquela enorme confusão estava-se em dúvida para onde devia ir a carruagem: pensou-se no hospital da Estrela, mas achou-se melhor o Arsenal. Eu também, já na Rua do Arsenal fui ferido num braço por uma bala. Faz o efeito de uma pancada e um pouco uma chicotada: foi na parte superior do braço direito.

Agora que penso ainda neste pavoroso dia e no medonho atentado parece-me e tenho quase a certeza (não quero afirmar porque nestes momentos angustiosos perde-se a noção das coisas) que eu escapei por ter feito um movimento instintivo para o lado esquerdo.

Na segunda carruagem vinham os Condes de Figueiró e o Marquês de Alvito e na terceira o Visconde de Asseca, o Vice-Almirante Guilherme A. de Brito Capelo e o Major António Waddington. Quando vínhamos a entrar o portão do Arsenal a Condessa de Figueiró entrou também na nossa carruagem e lembra-me que o Visconde de Asseca e o Conde de Figueiró vinham ao lado da carruagem. Dentro do Arsenal saí da carruagem primeiro e depois a minha adorada Mãe. Foi verdadeiramente um milagre termos escapado: Deus quis poupar-nos! Dou Graças a Deus de me ter deixado a minha Mãe que eu tanto adoro. Sempre foi a pessoa que eu mais gostei neste mundo e no meio destes horrores todos dou e darei sempre graças a Deus de me A ter conservado!

Quando a Minha adorada Mãe saiu da carruagem foi direita ao João Franco que ali estava e disse-lhe ou antes gritou-lhe com uma voz que fazia medo «Mataram El-Rei: Mataram o meu Filho». A minha pobre Mãe parecia doida. E na verdade não era para menos: Eu também não sei como não endoideci. O que então se passou naquelas horas no Arsenal ninguém pode sonhar! A primeira coisa foi que perdi completamente a noção do tempo. Agarrei a minha pobre e tão querida Mãe por um braço e não larguei e disse à Condessa de Figueiró para não a deixar.

Contudo ia entrando muita gente da Casa, diplomatas, os ministros e mesmo ministros de Estado honorários.

Estava-se ainda na dúvida (infelizmente de pouca duração se ainda viviam os dois entes tão queridos! Estavam lá muitos médicos entre outros o Dr. Bossa (que me parece foi o primeiro que chegou) o Dr. Moreira Júnior e o Dr. D. António Lencastre. Contou-me depois (já alguns dias depois) o Dr. Bossa que logo que chegou acendeu um fósforo e ainda as pupilas se retraíram. Quando porém repetiu a experiência nem mesmo esse pequeno sinal de vida lhe restava.

Descansa em paz no sono Eterno e que Deus tenha a Tua Alma na sua Santa Guarda!

De meu Pai e mesmo meu Irmão não tinha grandes esperanças que pudessem escapar. As feridas eram tão horrorosas que me parecia impossível que se salvassem. Como disse já lá estava o Ministério todo menos o Ministro da Fazenda Martins de Carvalho.

Isso é que nunca poderei esquecer é que fazendo parte do Ministério do meu querido Pai quando foi assassinado não foi ao Arsenal! Diz-se (não o quero afirmar) que fugiu para as águas-furtadas do Ministério da Fazenda e ali fechou a porta à chave! seja como for há agora seis meses que Meu Pai e Meu Irmão de chorada memória foram assassinados e nunca mais aqui pôs os pés! Acho isso absolutamente extraordinário!... para não dizer mais.

Preveniu-se para o Paço da Ajuda a minha pobre Avó para vir para o Arsenal. Eu não estava quando Ela chegou. Estavam-me a tratar o braço na sala do Inspector do Arsenal.

Quando a Avó chegou foi direita à minha Mãe e disse-lhe «On a tué mon fils!» e a minha Mãe respondeu-lhe: «Et le mien aussi!» Meu Deus dai-me força. Mas antes disto houve diferentes coisas que quero contar.

A minha pobre e adorada Mãe andava comigo pelo Arsenal de um lado para o outro com diferentes pessoas: Conde de Sabugosa, Condes de Figueiró, Condes de Galveias e outros falando de sempre num estado de excitação indescritível mas fácil de compreender. De repente caiu no chão! Só Deus e eu sabemos o susto que eu tive! Depois do que tinha acontecido veio aquela reacção e eu nem quero dizer o que primeiro me passou pela cabeça.

Depois vi bem o que era: o choque pavoroso fazia o seu efeito! Minha Mãe levantou-se quase envergonhada de ter caído. É um verdadeiro herói. Quem dera a muitos homens terem a décima parte da coragem que a minha Mãe tem.

Tem sido uma verdadeira mártir! O que eu rogo a Deus sempre e a cada instante é para m'A conservar!

Pouco tempo depois de termos chegado ao Arsenal veio ainda o major Waddington dizendo que os Queridos Entes ainda estavam vivos; mas infelizmente pouco tempo depois voltou chorando muito. Perguntei-lhe «Então?» Não me respondeu. Disse-lhe que tinha força para ouvir tudo. respondeu-me então que já ambos tinham falecido! Dai-lhes Senhor o Eterno descanso e brilhe sobre Eles a Vossa Luz Eterna Ámen!

Pouco depois vi passar João Franco com o Aires de Ornelas (Ministro da Marinha) e talvez (disso não me lembro ao certo) com o Vasconcelos Porto, Ministro da Guerra, dirigindo-se para a Sala da Balança para telefonarem que se tomassem todas as previdências necessárias. São isto cenas, que viva eu cem anos, ficarão gravadas no meu coração. Agora já era noite o que ainda tornava tudo mais horroroso e sinistro: estava já então muita gente no Arsenal, e principiou-se a pensar no regresso para o Paço das Necessidades. No presente momento em que estou escrevendo estas linhas estou repassando com horror, tudo no meu pensamento! Entrámos então para o landau fechado, a minha Avó, minha Mãe e o Conde de Sabugosa e eu. Saímos do Arsenal pelo portão que deita para o Cais do Sodré onde estava um esquadrão da Guarda Municipal comandado pelo Tenente Paul: Na almofada ia o Coronel Alfredo de Albuquerque: à saída entregaram ao Conde de Sabugosa um revólver; minha Avó também queria um.

Viemos então a toda brida para o Paço das Necessidades. À entrada esperavam-nos a Duquesa de Palmela, Marquesa do Faial, Condessa de Sabugosa, Dr. Th. de Mello Breyner, Conde de Tattenbach, Ministro da Alemanha e a Condessa, e muitos criados da casa. Foi uma cena horrorosa! Todos choravam aflitivamente. Subimos muito vagarosamente a escada no meio dos prantos e choros de todos os presentes. Acompanhei a minha pobre e adorada Mãe até ao seu quarto e deixei a minha pobre Avó na sala.»

http://www.geneall.net/P/forum_msg.php?id=175661

D. DUARTE FALA SOBRE D. CARLOS


S.A.R., DOM DUARTE: SE OS REGICIDAS CONHECESSEM O REI NÃO O TERIAM MORTO

O que sente no dia 1 de Fevereiro?
- Sempre vi esta data como uma data trágica para Portugal e para os portugueses. O Rei Dom Carlos era um homem que estava a prestar um grande serviço a Portugal, um excelente Chefe do Estado. Além disso, um bom homem. O Príncipe Luís Filipe era um miúdo de 18 anos que já tinha dado a volta aos territórios ultramarinos portugueses. Ainda hoje em Angola, em Moçambique e em Goa fala-se na visita dele e há chefes tribais e de reinos que têm as medalhas de prata de Dom Luís Filipe como símbolo de soberania.

O regicídio acaba por ser trágico para a causa monárquica, porque o reinado de Dom Manuel II é curto.

O regicídio não era o projecto dos republicanos. Foi um acidente porque muitos líderes revolucionários estavam presos e de repente a carbonária ficou à solta. Esses terroristas radicais decidiram que o melhor era acabar logo com a família real toda.

Um plano pacífico? Havia aquela propaganda toda... A propaganda contra o Rei e a Família Real era muito violenta, com muita calúnia e difamação. Estou convencido que se os regicidas tivessem conhecido o Rei não o tinham morto. Só o conheciam pela propaganda. Em 1910, quando tinham sido marcadas eleições e o Partido Republicano percebeu que não teria mais de 7% ou 8% dos votos, então aí precipitou a revolução, com a cena do navio a bombardear Lisboa e os galegos a serem contratados para fazer uma manifestação na Rotunda, como diz o Raul Rego.

Que é insuspeito... - O Raul Rego até agradeceu à Galiza porque os galegos é que fizeram a manifestação e a revolução da República. E havia dinheiro espanhol metido na revolução do 5 de Outubro.

Dos republicanos espanhóis. - Sim, queriam fazer a Federação das Repúblicas Ibéricas. Um livro do Jorge Morais conta isso. De resto, a coisa pior é a bandeira. A bandeira da República é o símbolo da União Ibérica: o vermelho representa Espanha e o verde representa Portugal, por isso o vermelho é maior que o verde. Mas a primeira bandeira que a carbonária exigiu era um rectângulo vermelho com um losango verde lá dentro Portugal integrado na Espanha. A comissão oficial que propôs a bandeira - e foi a bandeira que ficou em 1910 - ainda era a bandeira azul e branca sem coroa. A nossa Constituição diz que a bandeira da República é a bandeira escolhida em 1910. Portanto, é a bandeira azul e branca. A verde e vermelha só foi adoptada em 1911. Quase todos os países europeus preservaram as cores das bandeiras quando passaram a ser repúblicas. Por outro lado, e isso é simpático para mim, somos a única república que mantém as armas da casa real na bandeira...(...)

Há a vontade de contar outra história? É por isso que fala num acto de Justiça perante Dom Carlos? - O nosso País tem que reconciliar-se com a sua História. Não é possível continuar hoje a ensinar-se coisas completamente erradas sobre o Rei Dom Carlos, quase que a justificar que o assassinato dele foi político. Vai haver uma homenagem ao Buíça e ao Costa, o que acho muito perigoso porque está-se a dizer à geração actual e aos mais jovens que matar um Chefe do Estado, porque não se gosta dele, é legítimo e até merece uma homenagem. Já foi o Aquilo Ribeiro para o Panteão, não tanto por ser um escritor (porque há outros melhores que não estão no Panteão).

No outro dia ouvi-o dizer que acha as revoluções nocivas para o desenvolvimento do País e até fez comparações. Portugal estaria mais desenvolvido sem o 5 de Outubro? - Na Europa, os países que mais se desenvolveram foram os que não tiveram revoluções e, de entre eles, todas as Monarquias e a Suíça, uma república "medieval". Há a excepção, a Alemanha, que não serve de comparação.

Para si, o dia 1 de Fevereiro quebrou um ciclo que podia levar o País a um nível de desenvolvimento superior? - Comparando com os outros países europeus na época, éramos um país de desenvolvimento médio. Comparando hoje, somos um país dos últimos lugares da Europa. Hoje estaríamos a meio da tabela europeia ou acima. Porque, com a Monarquia, a descolonização não teria sido feita como foi, teria havido a formação de uma Commonwealth portuguesa, de uma União Lusófona, um Reino Unido, não teria havido a revolução de 1926, que levou à segunda república, e não teria sido preciso o 25 de Abril que atrasou a economia portuguesa de uma maneira gravíssima. As três revoluções que a República nos trouxe foram altamente negativas para o País. A primeira e a última são celebradas com um feriado nacional, não faz sentido. Ao celebrarmos as revoluções, estamos a dizer que na próxima crise venha um militar que tome conta disto. É o caminho errado. Devíamos era insistir que no respeito pelas instituições democráticas. A nossa Constituição devia dizer que é inalterável a forma democrática de governo. Não diz isso, diz que é inalterável a forma republicana de governo.

Já se solidarizou com a petição que defende que 1 de Fevereiro seja considerado dia de luto nacional?
Neste momento o que deve ter ênfase são os aspectos positivos do reinado de Dom Carlos. Mas justificava-se que este ano o dia fosse de luto, mas sem feriado nem nada, com bandeiras a meia haste. Prestava-se homenagem ao único Chefe do Estado que foi assassinado por portugueses. Também houve o Sidónio Pais, com um mandato curto que não se pode comparar...

Diário de Notícias, 31 de Janeiro de 2008

http://realfamiliaportuguesa.blogspot.com/2011/01/sar-dom-duarte-se-os-regicidas.html

D. CARLOS DE PORTUGAL

PRÍNCIPE REAL DE PORTUGAL